(...) amam a todos e são perseguidos por todos;
são desconhecidos e, ainda assim, condenados;
são assassinados, e, deste modo, recebem a vida;
são pobres, mas enriquecem a muitos;
carecem de tudo, mas têm abundância de tudo;
são desprezados e, no desprezo, recebem a glória;
são amaldiçoados, mas, depois, proclamados justos;
são injuriados e, no entanto, bendizem;
são maltratados e, apesar disso, prestam tributo;
fazem o bem e são punidos como malfeitores;
são condenados, mas se alegram como se recebessem a vida.
Os judeus os combatem como estrangeiros;
os gregos os perseguem;
e quem os odeia não sabe dizer o motivo desse ódio.
- Carta a Diogneto, séc II d.C.
Naquela época, muitos cristãos se alegravam em ser perseguidos por considerar uma grande honra cumprir a promessa feita por Jesus no sermão da montanha (Mt 5): "Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus!" (Mt 5, 10). Portanto, a perseguição era um sinal de que estavam agindo conforme os mandamentos de Deus, conforme a vontade divina, conforme a justiça. Justiça significa estar em conformidade com a verdade, com o Bem, com o que é correto. Bem aventurados, ou "felizes", são aqueles que, por fazer o que é justo, por fazer o que é certo, são perseguidos, pois Deus, o sumo Bem, sendo justo, garante o seu lugar no Reino dos Céus.
Exemplos que ilustram essa disposição cristã ao martírio, pela honra de seguir os passos de Nosso Senhor até a morte dolorosa, não faltam. São Lourenço, morto em 258, não abandonou sua habitual alegria nem na hora de sua morte na fogueira; Santo Inácio de Antioquia, que também já teve cartas lidas em episódios do Fala, Chico!, suplicava aos seus irmãos que não o impedissem de ser morto em Roma jogado aos leões, depois de ser preso. Foi morto no início do Séc. II, entre 98 e 107. Os próprios apóstolos Pedro e Paulo, mortos também em Roma, entregaram-se livremente ao martírio por não negarem a fé em Cristo.
Séculos se passaram e parece que não vivemos tempos tão diferentes assim. As perseguições continuam ocorrendo de maneira explícita e física em países de regime autoritário, mas também em democracias, cujo sistema político parece trazer consigo os mais belos significados da justiça, mas que parecem ter os olhos vendados na defesa de pautas nada imparciais e que, pouco a pouco, destroem a identidade cristã. O mundo ocidental, que tornou-se grande e próspero sob as bases dos valores cristãos, hoje os ataca através da cultura, da judicialização da moral e de diversas ideologias utilitaristas e materialistas.
Tanto se fala hoje no mundo sobre o amor, sobre o direito à felicidade, sobre se respeitar as diferenças e acolher a todos, mas isso não parece valer para os cristãos. Se a humanidade acredita que evoluiu tanto, a perseguição aos cristãos bem como a qualquer outro grupo religioso ou social, já deveria estar fora de moda. Porém, como o próprio Jesus disse a Pilatos "se o meu reino fosse deste mundo" (Jo 18, 36)... mas não o é. E por isso mesmo, as perseguições serão sempre atuais e presentes, sejam elas explícitas ou veladas.
Se você, como cristão, não se sente perseguido, talvez já tenha caído na armadilha dessa perseguição velada que ocorre no ocidente, que ofusca as lentes da verdade e corrói a identidade cristã. Quem abraça verdadeiramente ao Evangelho, sente-se como a descrição daCarta a Diogneto como forasteiros em sua pátria, como moradores do mundo, mas cidadãos do céu. Se o sangue dos mártires foi a semente do cristianismo séculos atrás, como relatou Tertuliano (Séc. II), que essas tristes notícias possam semear no nosso coração o autentico compromisso com a verdade e com os valores de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Vivem na sua pátria,
mas como se fossem forasteiros;
participam de tudo como cristãos,
e suportam tudo como estrangeiros.
Toda pátria estrangeira é sua pátria,
e cada pátria é para eles estrangeira.
Casam-se como todos e geram filhos,
mas não abandonam os recém-nascidos.
Compartilham a mesa, mas não o leito;
vivem na carne, mas não vivem segundo a carne;
moram na terra, mas têm a sua cidadania no céu;
obedecem às leis estabelecidas, mas,
com a sua vida, superam todas as leis;
- Carta a Diogneto, séc II d.C.
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