
Eugênio Telles
Eugênio Telles é catequista em constante formação, publicitário, empreendedor, podcaster e foi coordenador da Pastoral da Comunicação no Santuário da Divina Misericórdia e no Vicariato Suburbano da ArqRio.
FC!#269 - Vitória sobre os vícios: LUXÚRIA - Venerável Fulton Sheen
Do livro "Vitória sobre os vícios", do Venerável Fulton Sheen.
Sete pecados capitais; sete palavras de Cristo na Cruz. Por vezes pensamos que certos acontecimentos não passam de coincidências ou de conveniências humanas; porém, ao analisar e meditar mais atentamente, enxergamos que as coisas são como são porquetudo possui um propósito. D. Fulton Sheen pega-nos pela mão e nos leva por um tour pelas sujas e escuras veredas do pecado, mostrando-nos o mal e a deformidade que cada vício capital provoca em nossa vida e em nossas almas, e que cada um de nós provoca em nossos semelhantes ao agir conforme as más inclinações que possuímos. Mas, não somente isso; assim como um verdadeiro mestre nunca ensina a lição pela metade, também Sheen nos mostra como podemos sair desse vale de sombras inteiramente limpos: lavando nossas vestes no sangue do Cordeiro ao seguir as lições que Ele nos ensinou no alto da Cruz.
FC!#268 - Meditações para a Quaresma - Comemoração das cinco Chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo - Santo Afonso Maria de Ligório
Haurietis aquas in gaudio de fontibus Salvatoris – “Tirareis com alegria águas das fontes do Salvador” (Is 12, 3)
As Chagas de Jesus são aquelas benditas fontes preditas por Isaías, das quais podemos tirar todas as graças, se as pedimos com fé. São fontes de misericórdia, fontes de esperança, e sobretudo fontes de amor; porquanto as suas águas, ao passo que purificam a alma das manchas da culpa, abrasam-na no santo amor. Avizinhemo-nos muitas vezes daquelas fontes do Salvador, para apagar a nossa sede das graças.
I. As Chagas de Jesus Cristo são aquelas benditas fontes preditas por Isaías, das quais podemos tirar todas as graças, se as pedimos com fé: Haurietis aquas in gaudio de fontibus Salvatoris — “Tirareis com alegria água das fontes do Salvador”.
São em primeiro lugar fontes de misericórdia. Jesus Cristo quis que lhe fossem traspassados as mãos, os pés e o lado sacrossanto, a fim de aplacar por nós a divina justiça e ao mesmo tempo abrir-nos um asilo seguro, no qual nos pudéssemos subtrair às setas da ira de Deus.
Por isso, o Senhor mesmo nos anima, dizendo no Cântico dos cânticos: Vem, pomba minha, nas aberturas da pedra; isto é, na interpretação de São Pedro Damião: vem dentro destas minhas chagas, onde acharás todo o bem para tua alma. — Mais expressivas ainda são as palavras de que se serve na profecia de Isaías: Ecce in manibus meis descripsi te — “Eis aí que te gravei em minhas mãos”. Como se dissesse: Minha pobre ovelha, tem ânimo; não vês quanto me custaste? Eu te gravei em minhas mãos, nestas chagas que recebi por teu amor. Elas me solicitam sempre a ajudar-te e defender-te de teus inimigos; tem, pois, amor e confiança em mim.
As Chagas de Jesus são também fontes de esperança; porquanto, como escreve São Paulo, o Senhor quis morrer consumido pelas dores, a fim de merecer o paraíso para todos os pecadores arrependidos e resolvidos a emendar-se: Et consummatus, factus est omnibus obtemperantibus causa salutis — “E pela sua consumação foi feito autor da salvação para todos os que Lhe obedecem”. — Durante uma enfermidade, São Bernardo se viu certa vez transportado perante o tribunal de Deus, onde o demônio o acusava de seus pecados e lhe dizia que não merecia o céu. Respondeu- lhe então o Santo: “É verdade que eu não mereço o paraíso; mas Jesus tem dois direitos para este reino: um por ser Filho verdadeiro de Deus, outro por tê-lo merecido com a sua morte. Contentando-se com o primeiro, cedeu-me o segundo, em virtude do qual peço e espero a glória celeste”. É isto, meu irmão, o que nós também podemos dizer: As Chagas de Jesus Cristo são os nossos merecimentos, a nossa esperança: Vulnera tua merita mea.
II. As Chagas de Jesus Cristo são, em terceiro lugar, fontes de amor; porque as águas que ali brotam, purificam as almas e ao mesmo tempo abrasam-nas daquele santo fogo que o Senhor veio acender sobre a terra nos corações dos homens. Pelo que São Boaventura exclama:
“Ó Chagas que feris os corações mais duros e abrasais as almas mais frias de amor divino.”
São Paulo protestou solenemente de si: Non enim indicavi scire me aliquid inter vos, nisi Iesum Chistum, et hunc crucifixum — “Não entendi saber entre vós coisa alguma senão a Jesus Cristo, e este crucificado”. Não ignorava, de certo, o apóstolo, que Jesus Cristo nascera numa gruta, que passara trinta anos de sua vida numa oficina, que ressuscitara e subira ao céu. Não obstante isso diz que não queria saber senão de Jesus crucificado, porque este mistério o excitava mais a amá-Lo, visto que as sagradas Chagas lhe diziam o amor imenso que Jesus nos teve. — Recorramos, pois, frequentes vezes por meio de uma meditação atenta a estas fontes divinas do Salvador: Omnes sitientes venite ad aquas — “Todos vós os que tendes sede, vinde às águas”.
Eterno Pai, lançai vossos olhos sobre as Chagas de vosso divino Filho: estas Chagas Vos pedem todas as misericórdias para mim; perdoai-me, pois, as ofensas que Vos fiz; apoderai-Vos de meu coração todo, para que não ame, busque, nem deseje coisa alguma fora de Vós. Ó Chagas de meu Redentor, formosas fornalhas de amor, recebei-me e inflamai-me, não com o fogo do inferno que mereço, mas com a santa chama de amor a este Deus que quis morrer por mim, à força de tormentos. — “E Vós, Eterno Pai, que pela paixão de vosso Filho unigênito e pelo sangue que Ele derramou por suas cinco chagas, renovastes a natureza humana, perdida pelo pecado: concedei-me propício que, venerando na terra estas chagas divinas, eu mereça conseguir no céu o fruto do sangue preciosíssimo de Jesus.” — Fazei-o pelo amor do próprio Jesus Cristo e de Maria Santíssima.
FC!#267 - Meditações para a Quaresma - Grandeza da dádiva que Jesus Cristo nos fez na Santíssima Eucaristia - Santo Afonso Maria de Ligório
In omnibus divites facti estis in illo – “Em todas as coisas fostes enriquecidos n’Ele” (1Cor 1, 5)
É tão grande a dádiva que Jesus Cristo nos fez na santíssima Eucaristia, que, apesar de ser poderosíssimo, sapientíssimo e riquíssimo, não pode, nem sabe, nem tem para dar-nos outra mais excelente. Como é, pois, possível que os homens, tão sensíveis a qualquer delicadeza, fiquem insensíveis a tão grande dom e paguem o seu benfeitor com ingratidão… se nós também fomos no passado tão ingratos, peçamos de todo o coração que Jesus nos perdoe.
I. Santo Agostinho, considerando a grandeza do dom que Jesus Cristo nos oferece na santíssima Eucaristia, ficou tão enlevado, que escreveu esta celebre sentença, que com tal dádiva Jesus esgotou, por assim dizer, os seus atributos infinitos. — Deus, assim diz o santo Doutor, é poderosíssimo, e se quisesse, poderia, a um só sinal seu, criar mil mundos cada qual mais bonito. Contudo, apesar de ser todo poderoso, não nos pode oferecer outro dom mais precioso do que este: Cum esset omnipotens, plus dare non potuit. — Deus é sapientíssimo, e a sua sabedoria, como diz o Real Profeta, não tem limites. Mas com toda a sua sabedoria, não sabe achar um dom mais excelente do que a santíssima Eucaristia: Cum esset sapientissimus, plus dare nescivit. —Deus afinal é riquíssimo e os seus tesouros são inesgotáveis. Todavia, com toda a sua riqueza não tem jóia mais preciosa ou mais estimável do que esta para nos presentear: Cum esset ditissimus, plus dare nescivit.— E a razão é óbvia: Na santíssima Eucaristia Jesus Cristo nos dá não somente a sua humanidade, senão também a sua divindade. Para nos oferecer, pois, outro dom mais excelente do que este, mister seria que nos desse um Deus maior do que Ele mesmo; o que é impossível.
Tinha razão Isaias em exclamar: Notas facite adinventiones eius — “Publicai, ó homens, as invenções amorosas de nosso bom Deus”. Se o Redentor nos não tivesse feito espontaneamente este donativo quem é que Lho ousaria pedir? Quem é que se atrevera a dizer-Lhe: Senhor, se quereis fazer-nos conhecer o vosso amor, escondei-Vos sob as espécies de pão e vinho e consenti que Vos tomemos como nosso alimento? Mas o que nunca poderiam imaginar os homens, concebeu-o e cumpriu-o grande amor de Jesus Cristo. Ó prodígio de amor!
II. Santa Maria Magdalena de Pazzi costumava dizer que depois da comunhão a alma pode repetir a palavra de Jesus: Consummatum est — “Está consumado”. Visto que o meu Deus se me deu a si mesmo nesta comunhão, ele fez um último esforço de seu amor para comigo, e não tem mais nada para me dar. — Mas como é, pois, possível que os homens, de ordinário tão sensíveis a qualquer cortesia que se lhes faz, ficam tão insensíveis ao dom inapreciável do Santíssimo Sacramento e pagam a Jesus Cristo com a mais negra ingratidão? — Ah! Meu irmão, se no passado tu também foste um daqueles ingratos, pede sinceramente perdão e resolve-te a sacrificar de hoje em diante tudo por Jesus Cristo, assim como ele se sacrificou todo por ti neste inefável mistério.
Ó meu Jesus, o que é que Vos levou a dar-Vos inteiramente para nosso sustento? E depois deste dom, que mais Vos resta para nos obrigar a amar-Vos? Iluminai-nos, Senhor, e fazei-nos conhecer qual foi esse excesso de amor que Vos levou a transformar-Vos em alimento para Vos unirdes a nós, pobres pecadores. Mas se Vos dais inteiramente a nós, justo é que inteiramente nos demos a Vós. — Ó meu Redentor, como é que pude ofender-Vos, a Vós que me haveis amado tanto, e que não pudestes fazer mais para ganhar o meu amor? Por mim Vos fizestes homem, por mim morrestes e Vos fizestes meu alimento. Dizei-me, que Vos restava fazer ainda?
Amo-Vos, Bondade infinita: amo-Vos, Amor infinito; † Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas. Senhor, entrai freqüentes vezes na minha alma, inflamai-me inteiramente no vosso santo amor e fazei com que tudo esqueça para só pensar em Vós e não amar senão a Vós.
— Maria Santíssima, rogai por mim. Com a vossa intercessão, tornai-me digno de receber muitas vezes o vosso Filho sacramentado.
FC!#266 - Meditações para a Quaresma - Da glória de São José, Esposo da Virgem Maria - Santo Afonso Maria de Ligório
Qui custos est Domini sui, glorificabitur – “O que é o guarda do seu Senhor, será glorificado” (Pv 27, 18)
Devemos ter por certo que a vida de São José, sob a vista e na companhia de Jesus e Maria, foi uma oração contínua, cheia de fé, de confiança, de amor, de resignação e de oferecimento. Visto que a recompensa é proporcionada aos merecimentos da vida, considera quão grande será no paraíso a glória do santo Patriarca. Com razão se admite que ele, depois da Bem-aventurada Virgem, leva vantagem a todos os demais Santos. Por isso, quando São José quer obter alguma graça para seus devotos, não tanto pede, como de certo modo manda a Jesus e Maria.
I. A glória que Deus confere no céu a seus Santos é proporcionada à santidade de vida que eles levaram em terra. Para termos uma idéia da santidade de São José, basta que consideremos unicamente o que diz o Evangelho: Ioseph autem vir eius, cum esset iustus — “José seu esposo, como era homem justo”. A expressão homem justo significa um homem que possui todas as virtudes; porquanto aquele a quem falta uma delas, não pode ser chamado justo.
Ora, se o Espírito Santo chamou a São José justo, na ocasião em que foi escolhido para Esposo de Maria, avalia, que tesouros de amor divino e de todas as virtudes o nosso Santo não devia auferir dos colóquios e da contínua convivência com a sua santa Esposa, que lhe dava exemplos perfeitos de todas as virtudes. Se uma só palavra de Maria foi bastante eficaz para santificar ao Batista e para encher Santa Isabel do Espírito Santo, a que alturas não pensamos que deve ter chegado a bela alma de José pela convivência familiar com Maria, da qual gozou pelo espaço de tantos anos?
Além disso, que aumento de virtudes e de méritos não deve ter adquirido São José convivendo continuamente por tantos anos com a própria santidade, Jesus Cristo, servindo-O, alimentando-O e assistindo-Lhe nesta terra?
Se Deus promete recompensar aquele que por seu amor dá um simples copo de água a um pobre, considera quão alta glória terá dado a José, que O salvou das mãos de Herodes, Lhe forneceu vestidos e alimentos, O trouxe tantas vezes nos braços e carregou com tamanho afeto. — Devemos ter por certo que a vida de São José, sob a vista e na companhia de Jesus e Maria, foi uma oração contínua, cheia de atos de fé, de confiança, de amor, de resignação e de oferecimento. Se, pois, a recompensa é proporcionada aos merecimentos ajuntados na vida, considera quão grande será a glória de São José no paraíso!
II. Santo Agostinho compara os demais Santos com estrelas, mas São José com o sol. O Padre Soares diz que é muito aceitável a opinião que depois de Maria, São José leva vantagem a todos os demais Santos em merecimento e em glória. Donde o Ven. Bernardino de Bustis conclui que São José, de certo modo, dá ordens a Jesus e Maria quando quer impetrar algum favor para os seus devotos.
Meu santo Patriarca, agora que gozais no céu sobre um trono elevado junto do vosso amadíssimo Jesus, que vos foi submetido na terra, tende compaixão de mim, que vivo no meio de tantos inimigos, maus espíritos e más paixões, que me dão combates contínuos para me fazerem perder a graça de Deus. Ah! Pela felicidade que tivestes, de gozar na terra, sem interrupção, da companhia de Jesus e Maria, alcançai-me a graça de passar o resto de minha vida sempre unido a Deus e de morrer depois no amor de Jesus e Maria, para que um dia possa ir gozar, convosco, da sua companhia, no reino dos bem-aventurados.
E Vós, ó meu amado Jesus, meu amantíssimo Redentor, quando poderei ir gozar-Vos e amar-Vos no paraíso face a face, seguro de não Vos poder mais perder? Enquanto viver, estarei exposto a tal perigo. Ah, meu Senhor e meu único Bem, pelos merecimentos de São José, que Vós amais e honrais tanto no céu; pelos merecimentos de vossa querida Mãe; e mais ainda, pelos merecimentos de vossa vida e morte, pelas quais merecestes para mim todo o bem e toda a esperança: não permitais que em tempo algum eu me separe nesta terra de vosso amor, a fim de que possa ir para a pátria do amor, a possuir-Vos e amar-Vos com todas as minhas forças e nunca mais em toda a eternidade afastar-me da vossa presença e do vosso amor.
FC!#265 - Meditações para a Quaresma - A separação dos escolhidos e dos réprobos no Juízo Final - Santo Afonso Maria de Ligório
Exibunt angeli, et separabunt malos de medio iustorum – “Sairão os anjos e separarão os maus do meio dos justos” (Mt 13, 49)
Quando todos os homens estiverem reunidos no vale de Josafá, virão os anjos separar os réprobos dos escolhidos. Estes ficarão à direita e aqueles serão, para sua confusão, impelidos para a esquerda. Oh, que triste separação! Meu irmão, de que lado nos acharemos nesse dia? À direita com os escolhidos, ou à esquerda com os condenados? Se quisermos estar à direita, deixemos o caminho que conduz à esquerda.
I. Assim que os homens tiverem ressuscitado, ser-lhes-á intimado que se dirijam todos ao vale de Josafá, para serem julgados. Quando todos estiverem ali reunidos, virão os anjos e separarão os réprobos dos escolhidos: Exibunt angeli, et separabunt malos de medio iustorum. Os justos ficarão à direita, e os condenados serão impelidos para a esquerda.
— Que mágoa não sentiria quem fosse banido da sociedade ou da Igreja! Mas que dor muito maior não sentirá, quando se vir expulso da companhia dos Santos! Unus assumetur, et alter relinquetur — “Um será tomado, e outro será desprezado”. Diz São Crisóstomo que, se os réprobos não tivessem outra pena a sofrer, esta confusão já seria para eles um suplício infernal.
Atualmente no mundo são julgados felizes os príncipes e os ricos; e são desprezados os santos que vivem na pobreza e humildade. Ó cristãos fiéis, vós que amais a Deus, não vos aflijais porque neste mundo viveis desprezados e em tribulações: Tristitia vestra vertetur in gaudium. “A vossa tristeza se há de converter em alegria”. Então se dirá que vós sois os verdadeiros felizes, e tereis a honra de ser proclamados os cortezãos da corte de Jesus Cristo.
Que brilhante figura não fará então um São Pedro de Alcântara, que foi vilipendiado como apóstata! Um São João de Deus, que foi tratado como insensato! Um São Pedro Celestino, que morreu numa prisão depois de ter abdicado o papado! Que honra receberão então tantos mártires, cruciados aqui pelos algozes! Tunc laus erit unicuique a Deo — “Então cada um terá de Deus o louvor”. Que horrível figura, pelo contrário, não fará um Herodes, um Pilatos, um Nero, e tantos outros grandes da terra, agora condenados! — Ó partidários do mundo, espero-vos no vale de Josafá. Aí mudareis sem dúvida de sentimentos; aí deplorareis a vossa loucura. Infelizes! Por uma curta aparição no teatro deste mundo, tendes de fazer depois o papel de condenados na tragédia do juízo final.
II. Os escolhidos serão colocados à direita, ou antes, segundo o que diz o Apóstolo, para sua maior glória, serão elevados aos ares sobre as nuvens, para irem com os anjos ao encontro de Jesus Cristo, que deve vir do céu: Rapiemur cum illis in nubibus, obviam Christo in aera — “Seremos arrebatados com eles nas nuvens ao encontro de Cristo”. E os condenados, como um rebanho de cabritos destinados ao matadouro, serão impelidos para a esquerda, esperando pelo Juiz, que virá pronunciar publicamente a condenação de todos os seus inimigos. — Meu irmão, de que lado nos acharemos nós nesse dia? À direita com os escolhidos, ou à esquerda com os réprobos?
Ó meu amado Redentor, ó Cordeiro de Deus, que viestes ao mundo, não para castigar, mas para perdoar os pecados: ah! Perdoai-me sem demora, antes que chegue o dia em que deveis ser meu Juiz. Se eu então viesse a perder-me, à vossa vista, ó doce Cordeiro, que me tendes aturado com tanta paciência, a vossa vista seria o inferno do meu inferno. Ah! Perdoai- me, repito, sem demora. Com o socorro da vossa mão misericordiosa, fazei-me sair do precipício onde me fizeram cair os meus pecados. Arrependo-me, ó soberano Bem, de Vos ter ofendido tantas vezes. Amo- Vos, ó meu Juiz, que tanto me haveis amado.
Suplico-Vos pelos méritos da vossa morte, que me deis uma graça tão eficaz, que me torne de pecador em santo. Prometestes atender a quem Vos roga: Clama ad me et exaudiam te (5) — “Clama por mim e Eu te atenderei”. Não Vos peço bens terrenos; peço-Vos a vossa graça, vosso amor e nada mais. Atendei-me, ó meu Jesus, pelo amor que me dedicastes morrendo por mim na cruz. Meu amado Juiz, sou um culpado, mas um culpado que Vos ama mais que a si próprio. Tende piedade de mim! — Maria, minha Mãe, vinde depressa em meu auxílio, agora que me podeis ainda socorrer. Não me abandonastes quando vivia esquecendo-me de vós e de Deus. Socorrei-me, já que estou resolvido a servir-vos sempre e a nunca mais ofender a meu Senhor. Ó Maria, vós sois a minha esperança.
FC!#263 - Vitória sobre os vícios: INVEJA - Venerável Fulton Sheen
Do livro "Vitória sobre os vícios", do Venerável Fulton Sheen.
Sete pecados capitais; sete palavras de Cristo na Cruz. Por vezes pensamos que certos acontecimentos não passam de coincidências ou de conveniências humanas; porém, ao analisar e meditar mais atentamente, enxergamos que as coisas são como são porquetudo possui um propósito. D. Fulton Sheen pega-nos pela mão e nos leva por um tour pelas sujas e escuras veredas do pecado, mostrando-nos o mal e a deformidade que cada vício capital provoca em nossa vida e em nossas almas, e que cada um de nós provoca em nossos semelhantes ao agir conforme as más inclinações que possuímos. Mas, não somente isso; assim como um verdadeiro mestre nunca ensina a lição pela metade, também Sheen nos mostra como podemos sair desse vale de sombras inteiramente limpos: lavando nossas vestes no sangue do Cordeiro ao seguir as lições que Ele nos ensinou no alto da Cruz.
FC!#264 - Meditações para a Quaresma - Da verdadeira sabedoria - Santo Afonso Maria de Ligório
Et dedit illi scientiam sanctorum – “E deu-lhe a ciência dos santos” (Sb 10, 10)
Oh, que bela ciência, a de saber amar a Deus e salvar a alma. É esta a ciência mais necessária de todas, porquanto, se soubéssemos tudo e não nos soubéssemos salvar, nada nos aproveitaria e seríamos eternamente infelizes; ao passo que seremos eternamente bem- aventurados se soubermos amar a Deus, ainda que no mais fôssemos completamente ignorantes. Quantos sábios estão no inferno! Quantos, que aqui foram ignorantes, gozam no paraíso! Que aproveitou àqueles a sua sabedoria?… Que prejuízo causou a estes a sua ignorância?
I. Compreendamos bem que os verdadeiros sábios são aqueles que sabem adquirir a graça de Deus e o paraíso. Que bela ciência a de amar a Deus e salvar a alma! O livro onde se ensina a salvar a alma é de todos mais necessário. Se soubéssemos tudo e não nos soubéssemos salvar, nada nos aproveitaria e seríamos para sempre desgraçados. Ao contrário, seremos eternamente felizes se soubermos amar a Deus, ainda que no mais fôssemos completamente ignorantes. Beatus qui te novit, etsi alia nescit
— “Bem-aventurado o que Vos conhece, ó Deus, embora ignore todas as outras coisas!” exclamava Santo Agostinho.
Certo dia Frei Gil disse a São Boaventura:
– Feliz de ti, padre Boaventura, que sabes tantas coisas, e eu pobre ignorante nada sei; tu podes ser muito mais santo do que eu.
– Escuta — respondeu-lhe o Santo, — se uma velhinha ignorante souber amar a Deus mais do que eu, ela será mais santa do que eu.
Surgunt indocti, et rapiunt coelum — “Os ignorantes levantam-se e conquistam o céu”, disse Santo Agostinho. Quantos rústicos que não sabem ler, mas sabem amar a Deus, se salvam, e quantos sábios segundo o mundo se condenam! Aqueles, e não estes, são os verdadeiros sábios. Que grandes sábios foram um São Pascal, um São Feliz, capuchinho, um São João de Deus, apesar de ignorarem as ciências humanas! Que grandes sábios tantos mártires, tantas virgens, que renunciaram a ilustres alianças, indo morrer por amor de Jesus Cristo! — Numa palavra, os que renunciam aos bens terrestres para se consagrarem a Deus, são chamados homens desenganados. Portanto, os que abandonam a Deus pelos bens do mundo, devem ser chamados homens enganados.
Irmão meu, em qual das duas falanges te queres achar? Para que faças boa escolha, aconselha-te São João Crisóstomo que visites os cemitérios, que são as mais excelentes escolas para aprender a vaidade dos bens terrestres e a ciência dos santos. Proficiscamur ad sepulchra — “Vamos aos túmulos”. Dizei-me: sabes ali distinguir quem foi rei, nobre ou literato?
Eu por mim — acrescenta o santo — não vejo senão um montão de ossos, de vermes e de podridão.
II. Irmão meu, se queres ser sábio, não basta conheceres a importância de teu fim: é preciso também empregares os meios para o alcançares. Todos se quereriam salvar e ser santos; mas como não procuram os meios, não se santificam e perdem-se. É preciso evitar as ocasiões, frequentar os sacramentos, fazer oração, e mais do que tudo, gravar no coração as máximas do Evangelho, como sejam: Quid prodest homini, si universummundum lucretur? “Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro? É preciso perder tudo, até a vida, para salvar a alma” (2). Para seguir Jesus Cristo, deve-se recusar ao amor próprio a satisfação que deseja. A nossa salvação consiste em fazer a vontade de Deus. São estas as máximas e outras semelhantes, que devem frequentes vezes ser objeto da nossa meditação, se nós também quisermos ser verdadeiros sábios e salvar-nos.
Ó Pai de misericórdia, lançai um olhar sobre a minha miséria e tende piedade de mim. Iluminai-me e fazei-me conhecer o meu desvairamento passado, para o deplorar, e a vossa infinita bondade, para a amar. Ó meu Jesus: Ne tradas bestiis animas confitentes tibi — “Não entregueis às feras as almas que Vos louvam”. Derramastes o vosso sangue para me salvar; não permitais que me torne ainda escravo do demônio, como já o fui no passado. Arrependo-me de Vos ter deixado, o supremo Bem. Amaldiçôo todos os instantes em que, por minha própria vontade, consenti no pecado, e uno-me estreitamente à vossa santa vontade, que só deseja a minha felicidade.
Ó Pai Eterno, pelos merecimentos de Jesus Cristo, dai-me a força para executar tudo o que é do vosso agrado. Deixai-me antes morrer do que opor-me à vossa santa vontade. Ajudai-me com a vossa graça a depositar unicamente em Vós todo o meu amor, e a desligar-me de todos os afetos que não se referem a Vós. Amo-Vos, ó Deus de minha alma, amo-Vos sobre todas as coisas e de Vós espero todos os bens, o perdão, a perseverança em vosso amor e o paraíso para Vos amar eternamente.
— Ó Maria, pedi estas graças para mim. Vosso Filho não vos recusa nada. Esperança minha, em vós confio.
FC!#262 - Meditações para a Quaresma - 3º Domingo da Quaresma - O demônio mudo e as confissões sacrílegas - Santo Afonso Maria de Ligório
Erat (Iesus) eiciens daemonium, et illud erat mutum – “Estava (Jesus) expelindo um demônio, e ele era mudo” (Lc 11, 14)
O demônio mudo de que fala o Evangelho, significa o falso pejo com que o espírito infernal, depois de seduzir o cristão a ofender seu Deus, procura fazê-lo ocultar o pecado na confissão. Ah, quantas almas caem todos os dias no inferno por este ardil diabólico! Meu irmão, se jamais o demônio te vier tentar assim, pensa que, se é vergonhoso ofender a Deus tão bom, não o é o confessar o pecado cometido e o livrar- se dele. Quantos santos são venerados sobre os altares, que até fizeram uma confissão pública!
I. O demônio mudo de que fala o Evangelho é o falso pejo com que o espírito infernal procura fazer-nos calar na confissão os pecados cometidos, depois de primeiro nos ter cegado para não vermos o mal que cometemos e a ruína que nos preparamos ofendendo a Deus. — Com efeito, exclama São João Crisóstomo, o demônio faz em todas as coisas o contrário do que Deus faz. O Senhor pôs vergonha no pecado, para que não o cometamos; mas depois de o havermos cometido, anima-nos a confessá-lo, prometendo o perdão a quem se acusa. O demônio, ao contrário, inspira confiança ao pecador com a esperança do perdão; mas cometido o pecado, cobre-o de vergonha, para que se não confesse.
Por este ardil diabólico, ó, quantas alma já foram precipitadas e ainda se precipitam cada dia no inferno! Sim, porque os miseráveis convertem em veneno o remédio que Jesus Cristo nos preparou com seu preciosíssimo sangue, e ficam presas com uma dupla cadeia, cometendo depois do primeiro pecado outro mais grave: o sacrilégio.
Irmão meu, se por desgraça a tua alma está manchada pelo pecado, escuta o que te diz o Espírito Santo: Pro anima tua ne confundaris dicere verum. Sabe, diz ele, que há duas qualidades de vergonha; deves fugir daquele que te faz inimigo de Deus, conduzindo-te ao pecado; mas não da que se sente ao confessá-lo e te faz receber a graça de Deus nesta vida e a glória do paraíso na outra.
Se, pois, te queres salvar, não te envergonhes de fazer uma boa confissão; aliás a tua alma se perderá. As feridas gangrenosas levam à morte, e tais são os pecados calados na confissão; são chagas da alma que se gangrenaram.
II. Meu filho, vergonhoso é o entrar nesta casa, mas não o sair dela. Assim falou Sócrates a um seu discípulo que não quis ser visto ao sair de uma casa suspeita. É o que digo também àqueles que, depois de cometerem um pecado grave, tem pejo de o confessar. Meu irmão, coisa vergonhosa é ofender a um Deus tão grande e tão bom; mas não o é confessarmos o pecado cometido e livrar-nos dele. Foi porventura coisa vergonhosa para Santa Maria Madalena o confessar em público aos pés de Jesus Cristo, que era uma mulher pecadora? Foi motivo de pejo confessar-se uma Santa Maria Egipcíaca, uma Santa Margarida de Cortona, um Santo Agostinho, e tantos outros penitentes, que algum tempo tinham sido grandes pecadores? Por meio de sua confissão fizeram-se santos.
Ânimo, pois, meu irmão, ânimo! (Falo a quem cometeu a falta de ocultar por vergonha um pecado.) Tem ânimo e dize tudo a um confessor. Dá glória a Deus e confunde o demônio que, como diz o Evangelho, quando saiu do homem, anda por lugares secos, buscando repouso, e não o acha.
— Porém, depois de teres confessado bem, prepara-te para novos e mais violentos assaltos da parte do inimigo infernal. Ai de quem o deixa entrar novamente, depois de o haver expulso! Et fiunt novíssima hominis illius peiora prioribus — “O último estado do homem virá a ser pior do que o primeiro”.
Ó meu amabilíssimo Jesus! Iluminai o meu espírito, a fim de que nunca mais me deixe obcecar pelo espírito maligno a cometer de novo o pecado. Pesa-me de Vos haver ofendido, e proponho com a vossa graça antes morrer que tornar a ofender-Vos. Mas, se por desgraça recair, dai-me força para sempre vencer o demônio mudo e confessar-me sinceramente ao vosso ministro. “Peço-Vos, Deus Todo-Poderoso, que atendais propício às minhas humildes súplicas, e que em minha defesa estendais o braço de vossa majestade”. † Doce Coração de Maria, sede minha salvação.
FC!#261 - Meditações para a Quaresma - Maria Santíssima, modelo de amor para com Deus - Santo Afonso Maria de Ligório
Ego Mater pulchrae dilectionis – “Eu sou a Mãe do belo amor” (Eclo 24, 24)
O fogo de amor em que ardia o Coração da Santíssima Virgem foi tão veemente, que ela não repetia os atos de amor, como fazem os outros santos, mas por um privilégio singular amou a Deus sempre atualmente com um contínuo ato de amor. Mas se Maria amou e ama tanto a seu Deus, certamente ela não exige outra coisa de seus devotos, senão que O amem também. Como é que tu O amas? Se por ventura te sentes frio, chega-te com confiança a tua amada Mãe e roga-lhe que te faça seu semelhante.
I. Deus, que é amor, veio ao mundo para acender em todos a chama do seu divino amor; mas nenhum coração ficou tão abrasado como o Coração de sua Mãe, o qual, sendo todo puro dos afetos terrenos, estava todo disposto para arder neste santo fogo. Por isso o Coração de Maria se tornou todo fogo e chamas, como se lê nos Cânticos sagrados: Lampades eius, lampades ignis atque flammarum? “As suas lâmpadas são umas lâmpadas de fogo e de chamas”. Fogo, ardendo interiormente, como explica Santo Anselmo, e chamas resplandecendo para fora com o exercício das virtudes.
Revelou a própria Maria a Santa Brígida, que neste mundo ela não teve outro pensamento, outro desejo, nem outro gosto senão Deus. Eis porque a sua alma bendita absorta sempre nesta terra na contemplação de Deus, fazia inúmeros atos de amor. Ou, para melhor dizer, como escreve Bernardino de Bustis, Maria não multiplicava os atos de amor, como fazem os outros santos; mas, por um privilégio singular, ela amou a Deus atualmente com um contínuo ato de amor. Qual águia real sempre tinha os olhos fixos no divino Sol, de maneira (diz São Pedro Damião) que nem as ações da vida lhe impediam o amor, nem o amor lhe impedia a ação.
Acrescentam Santo Ambrósio, São Bernardino e outros, que nem mesmo o sono interrompia o ato de amor da Santíssima Virgem; de modo que podia verdadeiramente dizer com a sagrada Esposa: Ego dormio, et cor meum vigilat? “Eu durmo e o meu coração vela”. Foi figura de Maria o altar propiciatório, no qual nunca se extinguia o fogo, nem de dia, nem de noite. Numa palavra, afirma o Bem-aventurado Alberto Magno que Maria foi cheia de tão grande amor, que quase não podia caber mais amor numa pura criatura terrestre. Os próprios serafins podiam descer do céu, para aprenderem no Coração de Maria como se deve amar a Deus. No reino celeste ela só, entre todos os santos, pode dizer a Deus: Senhor, se não Vos amei quanto mereceis, ao menos amei-Vos quanto me foi possível.
II. Já que Maria ama tanto a seu Deus, não há certamente coisa alguma que ela exija tanto de seus devotos como que O amem igualmente. É o que a divina Mãe disse à Bem-aventurada Ângela de Foligno, num dia em que esta tinha comungado; é o que ela disse também a Santa Brígida: “Filha, se queres cativar o meu amor, ama o meu Filho”. Pergunta Novarino, porque a Santa Virgem, à imitação da Esposa dos Cantares, rogava aos anjos que fizessem saber ao seu Senhor o grande amor que lhe consagrava, dizendo: Adiuro-vos… ut nuntietis ei, quia amore langueo? “Eu vos conjuro… que lhe façais saber que estou enferma de amor”. Por ventura não sabia Deus quanto ela O amava? Com certeza sabia-o, responde o autor sobredito, que a Virgem quis fazer patente a nós o seu amor; a fim de que, assim como ela estava ferida de amor, nos infligisse a mesma ferida: Ut vulnerata vulneret. Porque foi toda fogo em amar a Deus, por isso, como diz São Boaventura, abrasa e torna seus semelhantes todos os que a amam e a ela se avizinham. Pelo que Santa Catarina de Sena chamava a Maria Santíssima portatrix ignis: a portadora do fogo do amor divino. Se queremos também arder nesta beata chama, procuremos sempre avizinhar-nos à nossa Mãe santíssima com súplicas e afetos.
Ah, Rainha do amor, Maria! Sois vós, no dizer de São Francisco de Sales, a mais amável, a mais amada e a mais amante de todas as criaturas. Ah, minha Mãe! Vós que ardestes sempre e toda em amor a Deus, dignai-vos dar-me ao menos uma faísca desse amor. Rogastes a vosso Filho por aqueles esposos aos quais faltava o vinho: Vinum non habent? “Eles não têm vinho”: não rogareis por nós a quem falta o amor a Deus, ao qual temos tanta obrigação de amar? Dizei somente: Amorem non habent? “Eles não têm amor”, e alcançar-nos-eis o amor. Outra graça não vos pedimos senão esta. Ó minha Mãe! Porquanto amais a Jesus, atendei-nos, rogai por nós.
FC!#260 - Meditações para a Quaresma - Comemoração do Sagrado Sudário de Nosso Senhor Jesus Cristo - Santo Afonso Maria de Ligório
Et depositum (corpus) involvit sindone – “Tendo descido (o corpo), amortalhou-o num lençol” (Lc 23, 53)
Para que estivéssemos sempre lembrados de seu amor, quis Jesus Cristo deixar a sua sagrada efígie estampada no santo Sudário. Não faltam na vida de Jesus feitos gloriosos cuja imagem nos podia deixar. Sendo, porém, a cor rubra da Paixão a mais apropriada para representar o amor, deixou de parte todos os demais fatos da sua vida, e quis representar perante nós o Homem das dores, a fim de que nos fosse tanto mais amável, quanto mais desfigurado. Amemo-Lo, pois, de todo o coração e soframos de boa mente alguma coisa por seu amor.
I. “Duas coisas”, escreve Cícero, “fazem conhecer um amigo: fazer-lhe bem e sofrer por ele; e esta última coisa é a maior prova de um verdadeiro amor.” Deus já tinha feito brilhar o seu amor para com os homens, em grande número de benefícios; mas, diz São Pedro Crisólogo, logo, julgou muito pouco para seu amor, somente fazer-lhes bem, se não achasse outro modo de lhe mostrar quanto o amava, sofrendo e morrendo por ele, como fez tomando a natureza humana. Por isso escreve o Apóstolo São Paulo, que a morte de Jesus Cristo pela salvação dos homens demonstrou até onde chegava o amor de Deus para conosco, as suas miseráveis criaturas: Apparuit benignitas et humanitas Salvatoris nostri Dei — “Apareceu a benignidade e o amor de Deus, nosso Salvador”.
A fim de que sempre nos lembrássemos deste seu excesso de amor, depois de consumada a Redenção do gênero humano, quis deixar-nos a sua imagem estampada no Sudário em que o envolveram depois da morte. Não faltavam, de certo, na vida de Jesus mil feitos gloriosos, cuja representação nos podia deixar, tais como sejam a adoração dos Magos, a transfiguração no Tabor, a ressureição de Lázaro, a multiplicação dos pães e mais outros. Mas, no dizer de São Bernardo, porque “a cor rubra da Paixão é a mais apropriada para representar o grau supremo e incomparável de amor, Jesus deixou de parte todo o fato glorioso, para se nos representar no estado de miséria predito por Isaías: Como homem de dores, objeto de desprezo e o último dos homens, ferido por Deus e humilhado como um leproso, o mais miserável dos filhos dos homens, coberto de chagas desde a cabeça aos pés, maltratado e desfigurado, até não ter mais parecença de homem: unde nec reputavimus eum.
Ah, meu amantíssimo Senhor, em vista de tantos testemunhos do vosso amor, quem poderá deixar de Vos amar? Tinha razão Santa Teresa, ó meu amabilíssimo Jesus, de dizer que, quem não Vos ama, prova que não Vos conhece.
II. O Padre Segneri Júnior aconselhou a uma sua confessada, escrevesse ao pé do Crucifixo estas palavras: Eis aí como se ama! Parece que é isso também o que pelo sagrado Sudário Jesus Cristo quer dizer a cada um de nós, particularmente quando, para evitar algum incômodo, abandonamos o bem que mais Lhe agrada, e chegamos talvez a renunciar à sua graça: Eis aí como se ama! — Com razão dizia São Francisco de Sales: “Todas as chagas do Redentor são outras tantas bocas que nos dizem que devemos sofrer por amor d’Ele; e a ciência dos santos consiste em sofrer constantemente por Jesus”.
Amemos, pois, a Jesus (assim nos exorta o amante Santo Agostinho), amemos a Jesus ao menos por gratidão, amemos de todo o coração ao Esposo Celeste, que nos deve ser tanto mais querido e aceito, quanto mais desfigurado se nos mostra. Devemos patentear este nosso amor sofrendo de boa vontade alguma coisa por Jesus, aceitando com resignação o que Ele mesmo nos envia para nosso bem.
Ó meu amado Salvador Jesus! Vejo-Vos todo coberto de chagas; fito o vosso rosto, já não mais belo, mas todo horrendo de ver e manchado de escarros e sangue. Quanto mais desfigurado Vos vejo, tanto mais belo Vos acho e digno de amor. Que são estas chagas e contusões, senão sinais de vosso amor e de vossa ternura para comigo? Quisestes ser maltratado assim para tornar bela a minha alma e limpá-la das manchas do pecado. Agradeço-Vos, meu Senhor; pesa-me de ter-me ajuntado aos algozes para Vos maltratar. Aceito em espírito de penitência todas as cruzes que queirais enviar, e prometo amar-Vos sempre de todo o meu coração. Ajudai-me com a vossa graça a ser-Vos fiel. “Ó meu Deus, Vós, que deixastes os vestígios da vossa paixão no santo Sudário, no qual José de Arimatéia envolveu o vosso sacratíssimo Corpo: concedei-me, propício, que pelos merecimentos de vossa morte e sepultura chegue à glória da ressurreição.” Fazei-o pelo amor do Coração aflitíssimo de Maria.