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SEGUNDA PARTE
A CELEBRAÇÃO DO MISTÉRIO CRISTÃO

SEGUNDA SEÇÃO
OS SETE SACRAMENTOS DA IGREJA

CAPÍTULO PRIMEIRO
OS SACRAMENTOS DA INICIAÇÃO CRISTÃ

ARTIGO 3
O SACRAMENTO DA EUCARISTIA

1322. A sagrada Eucaristia completa a iniciação cristã. Aqueles que foram elevados à dignidade do sacerdócio real pelo Batismo e configurados mais profundamente com Cristo pela Confirmação, esses, por meio da Eucaristia, participam, com toda a comunidade, no próprio sacrifício do Senhor.

1323. «O nosso Salvador instituiu na última ceia, na noite em que foi entregue, o sacrifício eucarístico do seu corpo e sangue, para perpetuar pelo decorrer dos séculos, até voltar, o sacrifício da cruz, confiando à Igreja, sua esposa amada, o memorial da sua morte e ressurreição: sacramento de piedade, sinal de unidade, vínculo de caridade, banquete pascal em que se recebe Cristo, a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da glória futura» (145).

I. A Eucaristia – fonte e cume da vida eclesial

1324. A Eucaristia é «fonte e cume de toda a vida cristã» (146). «Os restantes sacramentos, assim como todos os ministérios eclesiásticos e obras de apostolado, estão vinculados com a sagrada Eucaristia e a ela se ordenam. Com efeito, na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, nossa Páscoa» (147).

1325. «A comunhão de vida com Deus e a unidade do povo de Deus, pelas quais a Igreja é o que é, são significados e realizados pela Eucaristia. Nela se encontra o cume, ao mesmo tempo, da acção pela qual Deus, em Cristo, santifica o mundo, e do culto que no Espírito Santo os homens prestam a Cristo e, por Ele, ao Pai» (148).

1326. Enfim, pela celebração eucarística, unimo-nos desde já à Liturgia do céu e antecipamos a vida eterna, quando «Deus for tudo em todos» (1 Cor 15, 18 ).

1327. Em síntese, a Eucaristia é o resumo e a súmula da nossa fé: «A nossa maneira de pensar está de acordo com a Eucaristia: e, por sua vez, a Eucaristia confirma a nossa maneira de pensar» (149).

II. Como se chama este sacramento?

1328. A riqueza inesgotável deste sacramento exprime-se nos diferentes nomes que lhe são dados. Cada um destes nomes evoca alguns dos seus aspectos. Chama-se:
Eucaristia, 
porque é acção de graças a Deus. As palavras« eucharistein» (Lc 22, 19; 1 Cor 11, 24) e «eulogein» (Mt 26, 26; Mc 14, 22) lembram as bênçãos judaicas que proclamam – sobretudo durante a refeição – as obras de Deus: a criação, a redenção e a santificação.

1329. Ceia do Senhor (150), porque se trata da ceia que o Senhor comeu com os discípulos na véspera da sua paixão e da antecipação do banquete nupcial do Cordeiro (151) na Jerusalém celeste.

Fracção do Pão, porque este rito, próprio da refeição dos judeus, foi utilizado por Jesus quando abençoava e distribuía o pão como chefe de família (152), sobretudo aquando da última ceia (153) . É por este gesto que os discípulos O reconhecerão depois da sua ressurreição (154) e é com esta expressão que os primeiros cristãos designarão as suas assembleias eucarísticas (155). Querem com isso significar que todos os que comem do único pão partido, Cristo, entram em comunhão com Ele e formam um só corpo n'Ele (156).

Assembleia eucarística («sýnaxis»), porque a Eucaristia é celebrada em assembleia de fiéis, expressão visível da Igreja (157).

1330. Memorial da paixão e ressurreição do Senhor.

Santo Sacrifício, porque actualiza o único sacrifício de Cristo Salvador e inclui a oferenda da Igreja; ou ainda santo Sacrifício da Missa, «Sacrifício de louvor» (Heb 13, 15) (158), Sacrifício espiritual (159) Sacrifício puro (160) e santo, pois completa e ultrapassa todos os sacrifícios da Antiga Aliança.

Santa e divina Liturgia, porque toda a liturgia da Igreja encontra o seu centro e a sua expressão mais densa na celebração deste sacramento; no mesmo sentido se lhe chama também celebração dos Santos Mistérios. Fala-se igualmente do Santíssimo Sacramento, porque é o sacramento dos sacramentos. E, com este nome, se designam as espécies eucarísticas guardadas no sacrário.

1331. Comunhão, pois é por este sacramento que nos unimos a Cristo, o qual nos torna participantes do seu corpo e do seu sangue, para formarmos um só corpo (161); chama-se ainda as coisas santas («tà hágia»; «sancta») (162) – é o sentido primário da «comunhão dos santos» de que fala o Símbolo dos Apóstolos – , pão dos anjos, pão do céu, remédio da imortalidade (163), viático...

1332. Santa Missa, porque a liturgia em que se realiza o mistério da salvação termina com o envio dos fiéis («missio»), para que vão cumprir a vontade de Deus na sua vida quotidiana.

III. A Eucaristia na economia da salvação

OS SINAIS DO PÃO E DO VINHO

1333. No centro da celebração da Eucaristia temos o pão e o vinho que, pelas palavras de Cristo e pela invocação do Espírito Santo, se tornam o corpo e o sangue do mesmo Cristo. Fiel à ordem do Senhor, a Igreja continua a fazer, em memória d'Ele e até à sua vinda gloriosa, o que Ele fez na véspera da sua paixão: «Tomou o pão...», «Tomou o cálice com vinho...». Tornando-se misteriosamente o corpo e o sangue de Cristo, os sinais do pão e do vinho continuam a significar também a bondade da criação. Por isso, no ofertório [apresentação das oferendas], nós damos graças ao Criador pelo pão e pelo vinho (164), fruto «do trabalho do homem», mas primeiramente «fruto da terra» e «da videira», dons do Criador. A Igreja vê no gesto de Melquisedec, rei e sacerdote, que «ofereceu pão e vinho» (Gn 14, 18), uma prefiguração da sua própria oferenda (165).

1334. Na Antiga Aliança, o pão e o vinho são oferecidos em sacrifício entre as primícias da terra, em sinal de reconhecimento ao Criador. Mas também recebem uma nova significação no contexto do Êxodo: os pães ázimos que Israel come todos os anos na Páscoa, comemoram a pressa da partida libertadora do Egipto; a lembrança do maná do deserto recordará sempre a Israel que é do pão da Palavra de Deus que ele vive (166). Finalmente, o pão de cada dia é o fruto da terra prometida, penhor da fidelidade de Deus às suas promessas. O «cálice de bênção» (1 Cor 10, 16), no fim da ceia pascal dos judeus, acrescenta à alegria festiva do vinho uma dimensão escatológica – a da expectativa messiânica do restabelecimento de Jerusalém. Jesus instituiu a sua Eucaristia dando um sentido novo e definitivo à bênção do pão e do cálice.

1335. Os milagres da multiplicação dos pães, quando o Senhor disse a bênção, partiu e distribuiu os pães pelos seus discípulos para alimentar a multidão, prefiguram a superabundância deste pão único da sua Eucaristia (167). O sinal da água transformada em vinho em Caná (168) já anuncia a «Hora» da glorificação de Jesus. E manifesta o cumprimento do banquete das núpcias no Reino do Pai, onde os fiéis beberão do vinho novo (169) tornado sangue de Cristo.

1336. O primeiro anúncio da Eucaristia dividiu os discípulos, tal como o anúncio da paixão os escandalizou: «Estas palavras são insuportáveis! Quem as pode escutar?» (Jo 6, 60). A Eucaristia e a cruz são pedras de tropeço. É o mesmo mistério e não cessa de ser ocasião de divisão. «Também vos quereis ir embora?» (Jo 6, 67): esta pergunta do Senhor ecoa através dos tempos, como convite do seu amor a descobrir que só Ele tem «palavras de vida eterna» (Jo 6, 68) e que acolher na fé o dom da sua Eucaristia é acolhê-1'O a Ele próprio.

A INSTITUIÇÃO DA EUCARISTIA

1337. Tendo amado os seus, o Senhor amou-os até ao fim. Sabendo que era chegada a hora de partir deste mundo para regressar ao Pai, no decorrer duma refeição, lavou-lhes os pés e deu-lhes o mandamento do amor (170). Para lhes deixar uma garantia deste amor, para jamais se afastar dos seus e para os tornar participantes da sua Páscoa, instituiu a Eucaristia como memorial da sua morte e da sua ressurreição, e ordenou aos seus Apóstolos que a celebrassem até ao seu regresso, «constituindo-os, então, sacerdotes do Novo Testamento» (171).

1338. Os três evangelhos sinópticos e São Paulo transmitiram-nos a narração da instituição da Eucaristia. Por seu lado, São João refere as palavras de Jesus na sinagoga de Cafarnaum, palavras que preparam a instituição da Eucaristia: Cristo designa-se a si próprio como o pão da vida, descido do céu (172).

1339. Jesus escolheu a altura da Páscoa para cumprir o que tinha anunciado em Cafarnaum: dar aos seus discípulos o seu corpo e o seu sangue:

«Veio o dia dos Ázimos, em que devia imolar-se a Páscoa. [Jesus] enviou então a Pedro e a João, dizendo: "Ide preparar-nos a Páscoa, para que a possamos comer" [...]. Partiram pois, [...] e prepararam a Páscoa. Ao chegar a hora, Jesus tomou lugar à mesa, e os Apóstolos com Ele. Disse-lhes então: "Tenho desejado ardentemente comer convosco esta Páscoa, antes de padecer. Pois vos digo que não voltarei a comê-la, até que ela se realize plenamente no Reino de Deus". [...] Depois, tomou o pão e, dando graças, partiu-o, deu-lho e disse-lhes: "Isto é o Meu corpo, que vai ser entregue por vós. Fazei isto em memória de Mim". No fim da ceia, fez o mesmo com o cálice e disse: "Este cálice é a Nova Aliança no meu sangue, que vai ser derramado por vós"» (Lc 22, 7-20) (173).

1340. Celebrando a última ceia com os seus Apóstolos, no decorrer do banquete pascal, Jesus deu o seu sentido definitivo à Páscoa judaica. Com efeito, a passagem de Jesus para o seu Pai, pela sua morte e ressurreição – a Páscoa nova – é antecipada na ceia e celebrada na Eucaristia, que dá cumprimento a Páscoa judaica e antecipa a Páscoa final da Igreja na glória do Reino.

«FAZEI ISTO EM MEMÓRIA DE MIM»

1341. Ao ordenar que repetissem os seus gestos e palavras, «até que Ele venha» (1 Cor 11, 26), Jesus não pede somente que se lembrem d'Ele e do que Ele fez. Tem em vista a celebração litúrgica, pelos apóstolos e seus sucessores, do memorial de Cristo, da sua vida, morte, ressurreição e da sua intercessão junto do Pai.

1342. Desde o princípio, a Igreja foi fiel à ordem do Senhor. Da Igreja de Jerusalém está escrito:

«Eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e às orações. [...] Todos os dias frequentavam o templo, como se tivessem uma só alma, e partiam o pão em suas casas; tomavam o alimento com alegria e simplicidade de coração» (Act 2, 42.46).

1343. Era sobretudo «no primeiro dia da semana», isto é, no dia de domingo, dia da ressurreição de Jesus, que os cristãos se reuniam «para partir o pão» (Act 20, 7). Desde esses tempos até aos nossos dias, a celebração da Eucaristia perpetuou-se, de maneira que hoje a encontramos em toda a parte na Igreja com a mesma estrutura fundamental. Ela continua a ser o centro da vida da Igreja.

1344. Assim, de celebração em celebração, anunciando o mistério pascal de Jesus «até que Ele venha» (1Cor 11, 26), o Povo de Deus em peregrinação «avança pela porta estreita da cruz» (174) para o banquete celeste, em que todos os eleitos se sentarão à mesa do Reino.

IV. A celebração litúrgica da Eucaristia

A MISSA DE TODOS OS SÉCULOS

1345. Desde o século II, temos o testemunho de São Justino, mártir, sobre as grandes linhas do desenrolar da celebração eucarística. Permaneceram as mesmas até aos nossos dias, em todas as grandes famílias litúrgicas. Eis o que ele escreve, cerca do ano 155, para explicar ao imperador pagão Antonino Pio (138-161) o que fazem os cristãos:

«No dia que chamam Dia do Sol, realiza-se a reunião num mesmo lugar de todos os que habitam a cidade ou o campo.
Lêem-se as memórias dos Apóstolos e os escritos dos Profetas, tanto quanto o tempo o permite.
Quando o leitor acabou, aquele que preside toma a palavra para incitar e exortar à imitação dessas belas coisas.
Em seguida, levantamo-nos todos juntamente e fazemos orações» (175) «por nós mesmos [...] e por todos os outros, [...] onde quer que estejam, para que sejamos encontrados justos por nossa vida e acções, e fiéis aos mandamentos, e assim obtenhamos a salvação eterna.
Terminadas as orações, damo-nos um ósculo uns aos outros.
Depois, apresenta-se àquele que preside aos irmãos pão e uma taça de água e vinho misturados.
Ele toma-os e faz subir louvor e glória ao Pai do universo, pelo nome do Filho e do Espírito Santo, e dá graças (em grego: eucharistian) longamente, por termos sido julgados dignos destes dons.
Quando ele termina as orações e acções de graças, todo o povo presente aclama: Ámen.
[...] Depois de aquele que preside ter feito a acção de graças e de o povo ter respondido, aqueles a que entre nós chamamos diáconos distribuem a todos os que estão presentes pão, vinho e água "eucaristizados" e também os levam aos ausentes» (176).

1346.  A liturgia eucarística processa-se em conformidade com uma estrutura fundamental, que se tem conservado através dos séculos até aos nossos dias. Desdobra-se em dois grandes momentos, que formam basicamente uma unidade:

– a reunião, a liturgia da Palavra, com as leituras, a homilia e a oração universal;
– a liturgia eucarística, com a apresentação do pão e do vinho, a acção de graças consecratória e a comunhão.

Liturgia da Palavra e liturgia eucarística constituem juntas "um  só e mesmo acto de culto" (177). Com efeito, a mesa posta para nós na Eucaristia é, ao mesmo tempo, a da Palavra de Deus e a do corpo do Senhor (178).

1347. Não é esse também o dinamismo da refeição pascal de Jesus Ressuscitado com os seus discípulos? Enquanto caminhavam, Ele explicava-lhes as Escrituras; depois, pondo-Se à mesa com eles, «tomou o pão, proferiu a bênção, partiu-o e deu-lho» (179).

A SEQUÊNCIA DA CELEBRAÇÃO

1348. Todos se reúnem. Os cristãos acorrem a um mesmo lugar para a assembleia eucarística. A sua cabeça está o próprio Cristo, que é o actor principal da Eucaristia. Ele é o Sumo-Sacerdote da Nova Aliança. É Ele próprio que preside invisivelmente a toda a celebração eucarística. E é em representação d'Ele (agindo «in persona Christi capitis  na pessoa de Cristo-Cabeça»), que o bispo ou o presbítero preside à assembleia, toma a palavra depois das leituras, recebe as oferendas e diz a oração eucarística. Todos têm a sua parte activa na celebração, cada qual a seu modo: os leitores, os que trazem as oferendas, os que distribuem a comunhão e todo o povo cujo Ámen manifesta a participação.

1349. A liturgia da Palavra comporta «os escritos dos Profetas», quer dizer, o Antigo Testamento, e «as Memórias dos Apóstolos» ou seja, as suas epístolas e os evangelhos. Depois da homilia, que é uma exortação a acolher esta Palavra como o que ela é na realidade, Palavra de Deus(180), e a pô-la em prática, vêm as intercessões por todos os homens, segundo a palavra do Apóstolo: «Recomendo, antes de tudo, que se façam preces, orações, súplicas e acções de graças, por todos os homens, pelos reis e por todos os que exercem autoridade» (1 Tm 2, 1-2).

1350. A apresentação das oferendas (ofertório): traz-se então para o altar, por vezes processionalmente, o pão e o vinho que vão ser oferecidos pelo sacerdote em nome de Cristo no sacrifício eucarístico, no qual se tornarão o seu corpo e o seu sangue. É precisamente o mesmo gesto que Cristo fez na última ceia, «tomando o pão e o cálice». «Só a Igreja oferece esta oblação pura ao Criador, oferecendo-Lhe em acção de graças o que provém da sua criação» (181). A apresentação das oferendas no altar assume o gesto de Melquisedec e põe os dons do Criador nas mãos de Cristo. É Ele que, no seu sacrifício, leva à perfeição todas as tentativas humanas de oferecer sacrifícios.

1351. Desde o princípio, com o pão e o vinho para a Eucaristia, os cristãos trazem as suas ofertas para a partilha com os necessitados. Este costume, sempre actual, da colecta (182) inspira-se no exemplo de Cristo, que Se fez pobre para nos enriquecer (183):

«Os que são ricos e querem, dão, cada um conforme o que a si mesmo se impôs; o que se recolhe é entregue àquele que preside e ele, por seu turno, presta assistência aos órfãos, às viúvas, àqueles que a doença ou qualquer outra causa priva de recursos, aos prisioneiros, aos imigrantes, numa palavra, a todos os que sofrem necessidade» (184).

1352. A anáfora: Com a oração eucarística, oração de acção de graças e de consagração, chegamos ao coração e cume da celebração:

no prefácio, a Igreja dá graças ao Pai, por Cristo, no Espírito Santo, por todas as suas obras: pela criação, redenção e santificação. Toda a comunidade une, então, as suas vozes àquele louvor incessante que a Igreja celeste – os anjos e todos os santos – cantam ao Deus três vezes Santo:

1353. na epiclese, pede ao Pai que envie o seu Espírito Santo (ou o poder da sua bênção)(185)sobre o pão e o vinho, para que se tornem, pelo seu poder, o corpo e o sangue de Jesus Cristo, e para que os que participam na Eucaristia sejam um só corpo e um só espírito. (Algumas tradições litúrgicas colocam a epiclese depois da anamnese);

na narração da instituição, a força das palavras e da acção de Cristo e o poder do Espírito Santo tomam sacramentalmente presentes, sob as espécies do pão e do vinho, o corpo e o sangue do mesmo Cristo, o seu sacrifício oferecido na cruz de uma vez por todas;

1354. na anamnese que se segue, a Igreja faz memória da paixão, ressurreição e regresso glorioso de Cristo Jesus: e apresenta ao Pai a oferenda do seu Filho, que nos reconcilia com Ele:

nas intercessões, a Igreja manifesta que a Eucaristia é celebrada em comunhão com toda a Igreja do céu e da terra, dos vivos e dos defuntos, e na comunhão com os pastores da Igreja: o Papa, o bispo da diocese, o seu presbitério e os seus diáconos, e todos os bispos do mundo inteiro com as suas Igrejas.

1355. Na comunhão, precedida da Oração do Senhor e da fracção do pão, os fiéis recebem «o pão do céu» e «o cálice da salvação», o corpo e o sangue de Cristo, que Se entregou «para a vida do mundo» (Jo 6, 51):

Porque este pão e este vinho foram, segundo a expressão antiga, «eucaristizados» (186), «chamamos a este alimento Eucaristia; e ninguém pode tomar parte nela se não acreditar na verdade do que entre nós se ensina, se não recebeu o banho para a remissão dos pecados e o novo nascimento e se não viver segundo os preceitos de Cristo» (187).

V. O sacrifício sacramental: acção de graças, memorial, presença

1356. Se os cristãos celebram a Eucaristia desde as origens e sob uma forma que, na sua substância não mudou através da grande diversidade dos tempos e das liturgias, é porque sabem que estão ligados pela ordem do Senhor, dada na véspera da sua paixão: «Fazei isto em memória de Mim» (1 Cor 11, 24-25).

1357. Esta ordem do Senhor, cumprimo-la celebrando o memorial do seu sacrifício. E fazendo-o, oferecemos ao Pai o que Ele próprio nos deu: os dons da sua criação, o pão e o vinho, transformados, pelo poder do Espírito Santo e pelas palavras de Cristo, no corpo e no sangue do mesmo Cristo: assim Cristo torna-se real e misteriosamente presente.

1358. Temos, pois, de considerar a Eucaristia

– como acção de graças e louvor ao Pai,
– como memorial sacrificial de Cristo e do Seu corpo,
– como presença de Cristo pelo poder da sua Palavra e do seu Espírito.

A ACÇÃO DE GRAÇAS E O LOUVOR AO PAI

1359. A Eucaristia, sacramento da nossa salvação realizada por Cristo na cruz, é também um sacrifício de louvor em acção de graças pela obra da criação. No sacrifício eucarístico, toda a criação, amada por Deus, é apresentada ao Pai, através da morte e ressurreição de Cristo. Por Cristo, a Igreja pode oferecer o sacrifício de louvor em acção de graças por tudo o que Deus fez de bom, belo e justo, na criação e na humanidade.

1360. A Eucaristia é um sacrifício de acção de graças ao Pai, uma bênção pela qual a Igreja exprime o seu reconhecimento a Deus por todos os seus benefícios, por tudo o que Ele fez mediante a criação, a redenção e a santificação. Eucaristia significa, antes de mais, «acção de graças».

1361. A Eucaristia é também o sacrifício de louvor, pelo qual a Igreja canta a glória de Deus em nome de toda a criação. Este sacrifício de louvor só é possível através de Cristo: Ele une os fiéis à sua pessoa, ao seu louvor e à sua intercessão, de maneira que o sacrifício de louvor ao Pai ë oferecido por Cristo e com Cristo, para ser aceite em Cristo.

O MEMORIAL SACRIFICIAL DE CRISTO E DO SEU CORPO, A IGREJA

1362. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, a actualização e a oferenda sacramental do seu único sacrifício, na liturgia da Igreja que é o seu corpo. Em todas as orações eucarísticas encontramos, depois das palavras da instituição, uma oração chamada anamnese ou memorial.

1363. No sentido que lhe dá a Sagrada Escritura, o memorial não é somente a lembrança dos acontecimentos do passado, mas a proclamação das maravilhas que Deus fez pelos homens (188). Na celebração litúrgica destes acontecimentos, eles tomam-se de certo modo presentes e actuais. É assim que Israel entende a sua libertação do Egipto: sempre que se celebrar a Páscoa, os acontecimentos do Êxodo tornam-se presentes à memória dos crentes, para que conformem com eles a sua vida.

1364. O memorial recebe um sentido novo no Novo Testamento. Quando a Igreja celebra a Eucaristia, faz memória da Páscoa de Cristo, e esta torna-se presente: o sacrifício que Cristo ofereceu na cruz uma vez por todas, continua sempre actual (189): «Todas as vezes que no altar se celebra o sacrifício da cruz, no qual "Cristo, nossa Páscoa, foi imolado", realiza-se a obra da nossa redenção» (190).

1365. Porque é o memorial da Páscoa de Cristo, a Eucaristia é também um sacrifício. O carácter sacrificial da Eucaristia manifesta-se nas próprias palavras da instituição: «Isto é o meu corpo, que vai ser entregue por vós» e «este cálice é a Nova Aliança no meu sangue, que vai ser derramado por vós» (Lc 22, 19-20). Na Eucaristia, Cristo dá aquele mesmo corpo que entregou por nós na cruz, aquele mesmo sangue que «derramou por muitos em remissão dos pecados» (Mt 26, 28).

1366. A Eucaristia é, pois, um sacrifício, porque representa (torna presente) o sacrifício da cruz, porque é dele o memorial e porque aplica o seu fruto:

Cristo «nosso Deus e Senhor [...], ofereceu-Se a Si mesmo a Deus Pai uma vez por todas, morrendo como intercessor sobre o altar da cruz, para realizar em favor deles [homens] uma redenção eterna. No entanto, porque após a sua morte não se devia extinguir o seu sacerdócio (Heb 724-27), na última ceia, "na noite em que foi entregue" (1 Cor 11, 13). [...] Ele [quis deixar] à Igreja, sua esposa bem-amada, um sacrifício visível (como o exige a natureza humana), em que fosse representado o sacrifício cruento que ia realizar uma vez por todas na cruz, perpetuando a sua memória até ao fim dos séculos e aplicando a sua eficácia salvífica à remissão dos pecados que nós cometemos cada dia» (191).

1367. O sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício: «É uma só e mesma vítima e Aquele que agora Se oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que outrora Se ofereceu a Si mesmo na cruz; só a maneira de oferecer é que é diferente» (192). E porque «neste divino sacrifício, que se realiza na missa, aquele mesmo Cristo, que a Si mesmo Se ofereceu outrora de modo cruento sobre o altar da cruz, agora está contido e é imolado de modo incruento [...], este sacrifício é verdadeiramente propiciatório» (193).

1368. A Eucaristia é igualmente o sacrifício da Igreja. A Igreja, que é o corpo de Cristo, participa na oblação da sua Cabeça. Com Ele, ela própria é oferecida integralmente. Ela une-se à sua intercessão junto do Pai em favor de todos os homens. Na Eucaristia, o sacrifício de Cristo torna-se também o sacrifício dos membros do seu corpo. A vida dos fiéis, o seu louvor, o seu sofrimento, a sua oração, o seu trabalho unem-se aos de Cristo e à sua oblação total, adquirindo assim um novo valor. O sacrifício de Cristo presente sobre o altar proporciona a todas as gerações de cristãos a possibilidade de se unirem à sua oblação.

Nas catacumbas, a Igreja é frequentemente representada como uma mulher em oração, de braços estendidos em atitude orante. Como Cristo, que estendeu os braços na cruz, assim, por Ele, com Ele e n'Ele, a Igreja oferece-se e intercede por todos os homens.

1369. Toda a Igreja está unida à oblação e intercessão de Cristo. Encarregado do ministério de Pedro na Igreja, o Papa está associado a toda e qualquer celebração da Eucaristia, na qual é nomeado como sinal e servidor da unidade da Igreja universal. O bispo do lugar é sempre responsável pela Eucaristia, mesmo quando presidida por um presbítero; o seu nome é citado nela para significar a sua presidência da Igreja particular, no meio do presbitério e com a assistência dos diáconos. A comunidade intercede também por todos os ministros que, por ela e com ela, oferecem o sacrifício eucarístico:

«Seja tida como legítima somente aquela Eucaristia que é presidida pelo bispo ou por quem ele encarregou» (194).

«É pelo ministério dos presbíteros que o sacrifício espiritual dos fiéis se consuma em união com o sacrifício de Cristo. Mediador único, que é oferecido na Eucaristia de modo incruento e sacramental, pelas mãos deles, em nome de toda a Igreja, até quando o mesmo Senhor voltar» (195).

1370. À oblação de Cristo unem-se não só os membros que estão ainda neste mundo, mas também os que já estão na glória do céu: é em comunhão com a santíssima Virgem Maria e fazendo memória d'Ela, assim como de todos os santos e de todas as santas, que a Igreja oferece o sacrifício eucarístico. Na Eucaristia, a Igreja, com Maria, está como que ao pé da cruz, unida à oblação e à intercessão de Cristo.

1371. O sacrifício eucarístico é também oferecido pelos fiéis defuntos, «que morreram em Cristo e não estão ainda de todo purificados» (196), para que possam entrar na luz e na paz de Cristo:

«Enterrai este corpo não importa onde! Não vos dê isso qualquer cuidado! Tudo o que vos peço é que vos lembreis de mim diante do altar do Senhor, onde quer que estejais» (197).

«Depois [na anáfora], nós rezamos pelos santos padres e bispos falecidos, e em geral por todos aqueles que morreram antes de nós, certos de que isso será de grande proveito para as almas em favor das quais tal súplica se faz, enquanto está presente a vítima santa e temível [...]. Apresentando a Deus as nossas súplicas pelos que morreram, tenham embora sido pecadores, nós [...] apresentamos Cristo imolado pelos nossos pecados, tornando assim propício, para eles e para nós, o Deus que é amigo dos homens» (198).

1372. Santo Agostinho resumiu admiravelmente esta doutrina que nos incita a uma participação cada vez mais perfeita no sacrifício do nosso Redentor que celebramos na Eucaristia:

«Toda esta cidade resgatada, ou seja, a assembleia e sociedade dos santos, é oferecida a Deus como um sacrifício universal pelo Sumo-Sacerdote que, sob a forma de servo, foi ao ponto de Se oferecer por nós na sua paixão, para fazer de nós corpo duma tal Cabeça [...] Tal é o sacrifício dos cristãos: "Nós que somos muitos, formamos em Cristo um só corpo" (Rm 12, 5). E este sacrifício, a Igreja não cessa de o renovar no sacramento do altar bem conhecido dos fiéis, em que lhe é mostrado que ela própria é oferecida naquilo que oferece» (199).

A PRESENÇA DE CRISTO PELO PODER DA SUA PALAVRA E DO ESPÍRITO SANTO

1373. «Jesus Cristo, que morreu, que ressuscitou, que está à direita de Deus, que intercede por nós» (Rm 8, 34), está presente na sua Igreja de múltiplos modos (200): na sua Palavra, na oração da sua Igreja, «onde dois ou três estão reunidos em Meu nome» (Mt 18, 20), nos pobres, nos doentes, nos prisioneiros (201), nos seus sacramentos, dos quais é o autor, no sacrifício da missa e na pessoa do ministro. Mas está presente «sobretudo sob as espécies eucarísticas» (202).

1374. O modo da presença de Cristo sob as espécies eucarísticas é único. Ele eleva a Eucaristia acima de todos os sacramentos e faz dela «como que a perfeição da vida espiritual e o fim para que tendem todos os sacramentos» (203). No santíssimo sacramento da Eucaristia estão «contidos, verdadeira, real e substancialmente, o corpo e o sangue, conjuntamente com a alma e a divindade de nosso Senhor Jesus Cristo e, por conseguinte, Cristo completo» (204). «Esta presença chama-se "real", não a título exclusivo como se as outras presenças não fossem "reais", mas por excelência, porque é substancial, e porque por ela se torna presente Cristo completo, Deus e homem» (205).

1375. É pela conversão do pão e do vinho no corpo e no sangue de Cristo que Ele Se torna presente neste sacramento. Os Padres da Igreja proclamaram com firmeza a fé da mesma Igreja na eficácia da Palavra de Cristo e da acção do Espírito Santo, para operar esta conversão. Assim, São João Crisóstomo declara:

«Não é o homem que faz com que as coisas oferecidas se tomem corpo e sangue de Cristo, mas o próprio Cristo, que foi crucificado por nós. O sacerdote, figura de Cristo, pronuncia estas palavras, mas a sua eficácia e a graça são de Deus. Isto é o Meu corpo, diz ele. Esta palavra transforma as coisas oferecidas» (206).

E Santo Ambrósio diz a respeito da mesma conversão:

Estejamos bem convencidos de que «isto não é o que a natureza formou, ruas o que a bênção consagrou, e de que a força da bênção ultrapassa a da natureza, porque pela bênção a própria natureza é mudada» (207). «A Palavra de Cristo, que pôde fazer do nada o que não existia, não havia de poder mudar coisas existentes no que elas ainda não eram? Porque não é menos dar às coisas a sua natureza original do que mudá-la» (208).

1376. O  Concílio de Trento resume a fé católica declarando: «Porque Cristo, nosso Redentor, disse que o que Ele oferecia sob a espécie do pão era verdadeiramente o seu corpo, sempre na Igreja se teve esta convicção que o sagrado Concílio de novo declara: pela consagração do pão e do vinho opera-se a conversão de toda a substância do pão na substância do corpo de Cristo nosso Senhor, e de toda a substância do vinho na substância do seu sangue; a esta mudança, a Igreja católica chama, de modo conveniente e apropriado, transubstanciação» (209).

1377. A presença eucarística de Cristo começa no momento da consagração e dura enquanto as espécies eucarísticas subsistirem. Cristo está presente todo em cada uma das espécies e todo em cada uma das suas partes, de maneira que a fracção do pão não divide Cristo (210).

1378. O culto da Eucaristia. Na liturgia da Missa, nós exprimimos a nossa fé na presença real de Cristo sob as espécies do pão e do vinho, entre outras maneiras, ajoelhando ou inclinando-nos profundamente em sinal de adoração do Senhor. «A Igreja Católica sempre prestou e continua a prestar este culto de adoração que é devido ao sacramento da Eucaristia, não só durante a missa, mas também fora da sua celebração: conservando com o maior cuidado as hóstias consagradas, apresentando-as aos fiéis para que solenemente as venerem, e levando-as em procissão» (211).

1379. A sagrada Reserva (sacrário) era, ao princípio, destinada a guardar, de maneira digna, a Eucaristia, para poder ser levada aos doentes e ausentes, fora da missa. Pelo aprofundamento da fé na presença real de Cristo na sua Eucaristia, a Igreja tomou consciência do sentido da adoração silenciosa do Senhor, presente sob as espécies eucarísticas, por isso que o sacrário deve ser colocado num lugar particularmente digno da igreja; deve ser construído de tal modo que sublinhe e manifeste a verdade da presença real de Cristo no Santíssimo Sacramento.

1380. É de suma conveniência que Cristo tenha querido ficar presente à sua Igreja deste modo único. Uma vez que estava para deixar os seus sob forma visível, Cristo quis dar-nos a sua presença sacramental; e visto que ia sofrer na cruz para nos salvar, quis que tivéssemos o memorial do amor com que nos amou «até ao fim» (Jo 13, 1), até ao dom da própria vida. Com efeito, na sua presença eucarística, Ele fica misteriosamente no meio de nós, como Aquele que nos amou e Se entregou por nós (212), e permanece sob os sinais que exprimem e comunicam este amor:

«A Igreja e o mundo têm grande necessidade do culto eucarístico. Jesus espera-nos neste sacramento do amor. Não regateemos o tempo para estar com Ele na adoração, na contemplação cheia de fé e disposta a reparar as faltas graves e os pecados do mundo. Que a nossa adoração não cesse jamais» (213).

1381. «A presença do verdadeiro corpo e do verdadeiro sangue de Cristo neste sacramento, "não a apreendemos pelos sentidos, diz São Tomás, mas só pela fé, que se apoia na autoridade de Deus". É por isso que, comentando o texto de São Lucas 22, 19 "Isto é o Meu corpo que será entregue por vós", São Cirilo de Alexandria declara: "Não vás agora perguntar-te se isso é verdade; mas acolhe com fé as palavras do Senhor, porque Ele, que é a verdade, não mente"» (214):

«Adoro te devote, latens Deitas,
Quae sub his figuris vere latitas:
Tibi se cor meum totem subjicit,
Quica, Te contemplans, totem deficit.

Adoro-te com devoção, ó Deus que te escondes,
Que sob estas figuras de verdade te ocultas:
A ti meu coração se submete inteiramente
Porque, ao contemplar-te, desfalece por completo.

Visus, tactus, gustus in Te fallitur
Sed auditu solo tutu creditur:
Credo quidquid dixit Dei Filius:
Nil hoc Veritatis verbo verius» 
(215).

Visão, tacto e paladar em ti falham,
Apenas ouvindo se crê com segurança:
Creio em tudo o que disse o Filho de Deus:
Nada mais verdadeiro que esta palavra da Verdade.

VI. O banquete pascal

1382. A Missa é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o memorial sacrificial em que se perpetua o sacrifício da cruz e o banquete sagrado da comunhão do corpo e sangue do Senhor. Mas a celebração do sacrifício eucarístico está toda orientada para a união íntima dos fiéis com Cristo pela comunhão. Comungar é receber o próprio Cristo, que Se ofereceu por nós.

1383. altar, à volta do qual a Igreja se reúne na celebração da Eucaristia, representa os dois aspectos dum mesmo mistério: o altar do sacrifício e a mesa do Senhor, e isto tanto mais que o altar cristão é o símbolo do próprio Cristo, presente no meio da assembleia dos seus fiéis, ao mesmo tempo como vítima oferecida para a nossa reconciliação e como alimento celeste que se nos dá. «Com efeito, o que é o altar de Cristo senão a imagem do corpo de Cristo?» – pergunta Santo Ambrósio (216); e noutro passo: «O altar representa o corpo [de Cristo], e o corpo de Cristo está sobre o altar» (217). A liturgia exprime esta unidade do sacrifício e da comunhão em numerosas orações. Assim, a Igreja de Roma reza na sua anáfora:

«Humildemente Vos suplicamos, Deus todo-poderoso, que esta nossa oferenda seja apresentada pelo vosso santo Anjo no altar celeste, diante da vossa divina majestade, para que todos nós, participando deste altar pela comunhão do santíssimo corpo e sangue do vosso Filho, alcancemos a plenitude das bênçãos e graças do céu»» (218)

«TOMAI TODOS E COMEI»: A COMUNHÃO

1384. O Senhor dirige-nos um convite insistente a que O recebamos no sacramento da Eucaristia: «Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós» (Jo 6, 53).

1385. Para responder a este convite, devemos preparar-nos para este momento tão grande e santo. São Paulo exorta a um exame de consciência: «Quem comer o pão ou beber do cálice do Senhor indignamente será réu do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, cada qual a si mesmo e então coma desse pão e beba deste cálice; pois quem come e bebe, sem discernir o corpo do Senhor, come e bebe a própria condenação» (1Cor 11, 27-29). Aquele que tiver consciência dum pecado grave deve receber o sacramento da Reconciliação antes de se aproximar da Comunhão.

1386. Perante a grandeza deste sacramento, o fiel só pode retomar humildemente e com ardente fé a palavra do centurião (219) : «Domine, non sum dignus, ut intres sub tectum meum, sed tantum dic verbum, et sanabitur anima mea – Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma [só] palavra e serei salvo» (220). E na divina liturgia de São João Crisóstomo, os fiéis oram no mesmo Espírito:

«Faz-me comungar hoje, ó Filho de Deus, na tua ceia mística. Porque eu não revelarei o segredo aos teus inimigos, nem te darei o beijo de Judas. Mas, como o ladrão, eu te suplico: Lembra-Te de mim, Senhor, no teu Reino» (221).

1387. Para se prepararem convenientemente para receber este sacramento, os fiéis devem observar o jejum prescrito na sua Igreja (222). A atitude corporal (gestos, traje) deve traduzir o respeito, a solenidade, a alegria deste momento em que Cristo Se torna nosso hóspede.

1388. É conforme ao próprio sentido da Eucaristia que os fiéis, se tiverem as disposições requeridas (223), recebam a Comunhão quando participam na missa (224): «Recomenda-se vivamente aquela mais perfeita participação na missa em que os fiéis, depois da comunhão do sacerdote, recebem, do mesmo sacrifício, o corpo do Senhor» (225).

1389. A Igreja impõe aos fiéis a obrigação de «participar na divina liturgia nos domingos e dias de festa» (226) e de receber a Eucaristia ao menos uma vez em cada ano, se possível no tempo pascal (227) preparados pelo sacramento da Reconciliação. Mas recomenda-lhes vivamente que recebam a santa Eucaristia aos domingos e dias de festa, ou ainda mais vezes, mesmo todos os dias.

1390. Graças à presença sacramental de Cristo sob cada uma das espécies, a comunhão apenas sob a espécie de pão permite receber todo o fruto de graça da Eucaristia. Por razões pastorais, esta maneira de comungar estabeleceu-se legitimamente como a mais habitual no rito latino. «A sagrada Comunhão tem uma forma mais plena, enquanto sinal, quando é feita sob as duas espécies. Com efeito, nesta forma manifesta-se mais perfeitamente o sinal do banquete eucarístico» (228). É a forma habitual de comungar, nos ritos orientais.

OS FRUTOS DA COMUNHÃO

1391. A Comunhão aumenta a nossa união com Cristo. Receber a Eucaristia na comunhão traz consigo, como fruto principal, a união íntima com Cristo Jesus. De facto, o Senhor diz: «Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em Mim e Eu nele» (Jo 6, 56). A vida em Cristo tem o seu fundamento no banquete eucarístico: «Assim como o Pai, que vive, Me enviou, e Eu vivo pelo Pai, também o que Me come viverá por Mim» (Jo 6, 57):

«Quando, nas festas do Senhor, os fiéis recebem o corpo do Filho, proclamam uns aos outros a boa-nova de que lhes foram dadas as arras da vida, como quando o anjo disse a Maria de Magdala: "Cristo ressuscitou!". Eis que também agora a vida e a ressurreição são conferidas àquele que recebe Cristo» (229).

1392. O que o alimento material produz na nossa vida corporal, realiza-o a Comunhão, de modo admirável, na nossa vida espiritual. A comunhão da carne de Cristo Ressuscitado, «vivificada pelo Espírito Santo e vivificante» (230), conserva, aumenta e renova a vida da graça recebida no Batismo. Este crescimento da vida cristã precisa de ser alimentado pela Comunhão eucarística, pão da nossa peregrinação, até à hora da morte, em que nos será dado como viático.

1393. A Comunhão afasta-nos do pecado. O corpo de Cristo que recebemos na Comunhão é «entregue por nós» e o sangue que nós bebemos é «derramado pela multidão, para remissão dos pecados». É por isso que a Eucaristia não pode unir-nos a Cristo sem nos purificar, ao mesmo tempo, dos pecados cometidos, e nos preservar dos pecados futuros:

«Sempre que O recebemos, anunciamos a morte do Senhor (231). Se nós anunciamos a morte do Senhor, anunciamos a remissão dos pecados. Se, de cada vez que o seu sangue é derramado, é derramado para remissão dos pecados, eu devo recebê-lo sempre, para que sempre Ele perdoe os meus pecados. Eu que peco sempre, devo ter sempre um remédio» (232).

1394. Tal como o alimento corporal serve para restaurar as forças perdidas, assim também a Eucaristia fortifica a caridade que, na vida quotidiana, tende a enfraquecer-se; e esta caridade vivificada apaga os pecados veniais (233). Dando-Se a nós, Cristo reaviva o nosso amor e torna-nos capazes de quebrar as ligações desordenadas às criaturas e de nos radicarmos n'Ele.

«Uma vez que Cristo morreu por nós por amor, quando nós fazemos memória da sua morte no momento do sacrifício, pedimos que esse amor nos seja dado pela vinda do Espírito Santo; suplicamos humildemente que, em virtude desse amor pelo qual Cristo quis morrer por nós, também nós, recebendo a graça do Espírito Santo, possamos considerar o mundo como crucificado para nós e sermos nós próprios crucificados para o mundo; [...] tendo recebido o dom do amor, morramos para o pecado e vivamos para Deus» (234).

1395. Pela mesma caridade que acende em nós, a Eucaristia preserva-nos dos pecados mortais futuros. Quanto mais participarmos na vida de Cristo e progredirmos na sua amizade, mais difícil nos será romper com Ele pelo pecado mortal. A Eucaristia não está ordenada ao perdão dos pecados mortais. Isso é próprio do sacramento da Reconciliação. O que é próprio da Eucaristia é ser o sacramento daqueles que estão na plena comunhão da Igreja.

1396. A unidade do corpo Místico: a Eucaristia faz a Igreja. Os que recebem a Eucaristia ficam mais estreitamente unidos a Cristo. Por isso mesmo, Cristo une todos os fiéis num só corpo: a Igreja. A Comunhão renova, fortalece e aprofunda esta incorporação na Igreja já realizada pelo Batismo. No Batismo fomos chamados a formar um só corpo (235). A Eucaristia realiza esta vocação: «O cálice da bênção que abençoamos, não é comunhão com o sangue de Cristo? O pão que partimos não é comunhão com o corpo de Cristo? Uma vez que há um único pão, nós, embora muitos, somos um só corpo, porque participamos desse único pão» (1 Cor 10, 16-17):

«Se sois o corpo de Cristo e seus membros, é o vosso sacramento que está colocado sobre a mesa do Senhor, é o vosso sacramento que recebeis. Vós respondeis «Ámen» [«Sim, é verdade!»] àquilo que recebeis e, ao responder, o subscreveis. Tu ouves esta palavra: «O corpo de Cristo»; e respondes: «Ámen», Então, sê um membro de Cristo, para que o teu «Ámen» seja verdadeiro» (326).

1397. A Eucaristia compromete-nos com os pobres: Para receber, na verdade, o corpo e o sangue de Cristo entregue por nós, temos de reconhecer Cristo nos mais pobres, seus irmãos (237):

«Saboreaste o sangue do Senhor e não reconheces sequer o teu irmão. Desonras esta mesa, se não julgas digno de partilhar o teu alimento aquele que foi julgado digno de tomar parte nesta mesa. Deus libertou-te de todos os teus pecados e chamou-te para ela; e tu nem então te tornaste mais misericordioso» (238).

1398. A Eucaristia e a unidade dos cristãos. Perante a grandeza deste mistério, Santo Agostinho exclama: «O sacramentum pietatis! O signum unitatis! O vinculum caritatis! – Ó sacramento da piedade, ó sinal da unidade, ó vínculo da caridade!» Quanto mais dolorosas se fazem sentir as divisões da Igreja que rompem a comum participação na mesa do Senhor, tanto mais prementes são as orações que fazemos ao Senhor para que voltem os dias da unidade completa de todos os que crêem n' Ele.

1399. As Igrejas orientais que não estão em comunhão plena com a Igreja Católica celebram a Eucaristia com um grande amor. «Essas Igrejas, embora separadas, têm verdadeiros sacramentos; e principalmente, em virtude da sucessão apostólica, o sacerdócio e a Eucaristia, por meio dos quais continuam unidos a nós por vínculos estreitíssimos» (240). Portanto, «uma certa comunhão in sacris é não só possível, mas até aconselhável em circunstâncias oportunas e com aprovação da autoridade eclesiástica» (241).

1400. As comunidades eclesiais saídas da Reforma, separadas da Igreja Católica, «não [conservaram] a genuína e íntegra substância do mistério eucarístico, sobretudo por causa da falta do sacramento da Ordem» (242). É por esse motivo que a intercomunhão eucarística com estas comunidades não é possível para a Igreja Católica. No entanto, estas comunidades eclesiais, «quando na santa ceia fazem memória da morte e ressurreição do Senhor, professam que a vida é significada na comunhão com Cristo e esperam a sua vinda gloriosa» (243).

1401. Se urgir uma grave necessidade, segundo o juízo do Ordinário os ministros católicos podem ministrar os sacramentos (Eucaristia, Penitência, Unção dos Enfermos) aos outros cristãos que não estão em plena comunhão com a Igreja Católica, mas que os pedem por sua livre vontade: requer-se, nesse caso, que manifestem a fé católica em relação a estes sacramentos e que se encontrem nas devidas disposições (244).

VII. A Eucaristia – «Penhor da futura glória»

1402. Numa antiga oração, a Igreja aclama assim o mistério da Eucaristia: «O sacrum convivium in quo Christus sumitur: recolitur memoria passionis eius; mens impletur gratia et futurae gloriae nobis pignus datur – Ó sagrado banquete, em que se recebe Cristo e se comemora a sua paixão, em que a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da futura glória» (245). Se a Eucaristia é o memorial da Páscoa da Senhor, se pela nossa comunhão no altar somos cumulados da «plenitude das bênçãos se graças do céu» (246), a Eucaristia é também a antecipação da glória celeste.

1403. Na última ceia, o próprio Senhor chamou a atenção dos seus discípulos para a consumação da Páscoa no Reino de Deus: «Eu vos digo que não voltarei a beber deste fruto da videira, até o dia em que beberei convosco o vinho novo no Reino do meu Pai» (Mt 26, 29) (247). Sempre que a Igreja celebra a Eucaristia, lembra-se desta promessa, e o seu olhar volta-se para «Aquele que vem» (Ap 1, 4). Na sua oração, ela clama pela sua vinda: «Marana tha» (1Cor 16, 22), «Vem, Senhor Jesus!» (Ap 22, 20), «que a Tua graça venha e que este mundo passe!» (248).

1404. A Igreja sabe que, desde já, o Senhor vem na sua Eucaristia e que está ali, no meio de nós. Mas esta presença é velada. E é por isso que nós celebramos a Eucaristia «expectantes beatam spem et adventum Salvatoris nostri Jesu Christi – enquanto aguardamos a feliz esperança e a vinda de Jesus Cristo nosso Salvador» (249), pedindo a graça de ser acolhidos «com bondade no vosso Reino, onde também nós esperamos ser ser recebidos, para vivermos [...] eternamente na vossa glória, quando enxugardes todas as lágrimas dos nossos olhos; e, vendo-Vos tal como sois, Senhor nosso Deus, seremos para sempre semelhantes a Vós e cantaremos sem fim os vossos louvores, por Jesus Cristo nosso Senhor» (250).

1405. Desta grande esperança – dos novos céus e da nova terra, onde habitará a justiça (251) – não temos garantia mais segura nem sinal mais manifesto do que a Eucaristia. Com efeito, cada vez que se celebra este mistério, «realiza-se a obra da nossa redenção» (252) e nós «partimos o mesmo pão, que é remédio de imortalidade, antídoto para não morrer, mas viver em Jesus Cristo para sempre» (253).

Resumindo:

1406. Jesus diz: «Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente [...] Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna [...], permanece em Mim, e Eu nele» (Jo 6, 51.54.56).

1407. A Eucaristia é o coração e o cume da vida da Igreja, porque nela Cristo associa a sua Igreja e todos os seus membros ao seu sacrifício de louvor e de acção de graças, oferecido ao Pai uma vez por todas na cruz; por este sacrifício, Ele derrama as graças da salvação sobre o seu corpo, que é a Igreja.

1408. A celebração eucarística inclui sempre: a proclamação da Palavra de Deus, a acção de graças a Deus Pai por todos os seus benefícios, sobretudo pelo dom do seu Filho, a consagração do pão e do vinho e a participação no banquete litúrgico pela recepção do corpo e do sangue do Senhor Estes elementos constituem um só e mesmo acto de culto.

1409. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo, isto é, da obra do salvação realizada pela vida, morte e ressurreição de Cristo, obra tornada presente pela acção litúrgica.

1410. É o próprio Cristo, sumo e eterno sacerdote da Nova Aliança, que, agindo pelo ministério dos sacerdotes, oferece o sacrifício eucarístico. E é ainda o mesmo Cristo, realmente presente sob as espécies do pão e do vinho, que é a oferenda do sacrifício eucarístico.

1411Só os sacerdotes validamente ordenados podem presidir à Eucaristia e consagrar o pão e o vinho, para que se tornem o corpo o sangue do Senhor:

1412. Os sinais essenciais do sacramento eucarístico são o pão de trigo o vinho da videira, sobre os quais é invocada a bênção do Espírito Santo, e o sacerdote pronuncia as palavras da consagração ditas por Jesus durante a última ceia: «Isto é o meu corpo, que será entregue por vós... Este é o cálice do meu sangue...».

1413. Pela consagração, opera-se a transubstanciação do pão e do vinho no corpo e no sangue de Cristo. Sob as espécies consagradas do pão e do vinho, o próprio Cristo, vivo e glorioso, está presente de modo verdadeiro, real e substancial, com o seu corpo e o seu sangue, com a sua alma e a sua divindade (254).

1414. Enquanto sacrifício, a Eucaristia é oferecida também em reparação dos pecados dos vivos e dos defuntos e para obter de Deus benefícios espirituais ou temporais.

1415. Aquele que quiser receber Cristo na Comunhão eucarística deve encontrar-se em estado de graça. Se alguém tiver consciência de ter pecado mortalmente, não deve aproximar-se da Eucaristia sem primeiro ter recebido a absolvição no sacramento da Penitência.

1416. A sagrada Comunhão do corpo e sangue de Cristo aumenta a união do comungante com o Senhor perdoa-lhe os pecados veniais preserva-o dos pecados graves. E uma vez que os laços da caridade entre o comungante e Cristo são reforçados, a recepção deste sacramento reforça a unidade da Igreja, corpo Místico de Cristo.

1417. A Igreja recomenda vivamente aos fiéis que recebam a sagrada Comunhão quando participam na celebração da Eucaristia; e impõe-lhes a obrigação de o fazerem ao menos uma vez por ano.

1418. Uma vez que Cristo em pessoa está presente no Sacramento do Altar; devemos honrá-Lo com culto de adoração. «A visita ao Santíssimo Sacramento é uma prova de gratidão, um sinal de amor e um dever de adoração para com Cristo nosso Senhor» (255).

1419. Tendo passado deste mundo para o Pai, Cristo deixou-nos na Eucaristia o penhor da glória junto d'Ele: a participação no santo sacrifício identifica-nos com o seu coração, sustenta as nossas forças ao longo da peregrinação desta vida, faz-nos desejar a vida eterna e desde já nos une à Igreja do céu, à Santíssima Virgem e a todos os santos.


Notas

1. São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 65, a. 1. c: Ed. Leon. 12, 56-57.

2. São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 65. a. 3. c: Ed. Leon. 12, 60.

3. Paulo VI, Const. Ap. Divinae consortium naturae: AAS 63 (1971) 657: cf. Ordo initiationis christianae adultorum, Praenotanda 1-2 (Typis Polyglottis Vaticanis 1972) p. 7 [Iniciação cristã dos adultos, Segunda Edição, Preliminares, 1-2 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1996) p. 9-10]

4. Cf. Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1314: CIC can 204, § 1. 849; CCEO can 675 § 1.

5. CatRom 2, 2, 5, p. 179.

6. Cf. Rm 6, 3-4; Cl 2, 12.

7. São Justino, Apologia 1, 61: CA 1, 168 (PG 6, 421).

8. Cf. Heb 10, 32.

9 Cf. Ts 5, 5.

10. São Gregório Nazianzo, Oratio 40, 3-4: SC 358, 202-204 (PG 36, 361-364).

11. Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 283 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 315].

12. Cf. Gn 1, 2.

13. Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970). p. 283 [A tradução oficial portuguesa desta oração não inclui a metáfora da «concepção»: «Logo no princípio do mundo, o vosso Espírito pairava sobre as águas, prefigurando o seu poder de santificar»: Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 315].

14. Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 283 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 3151.

15. Vigília Pascal, Bênção da água: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 283 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 315].

16. Cf. Mt 3, 13.

17. Cf. Mc 16, 15-16.

18. Cf. Mt 3, 15.

19. CL Fl 2, 7.

20. Cf. Mt 3, 16-17.

21. Cf. Mc 10, 38; Lc 12, 50.

22. Cf. Jo 19, 34.

23. Cf.. 1 Jo 5, 6-8.

24. Santo Ambrósio, De sacramentis 2, 2, 6: CSEL73, 27-28 (PL16, 425-426).

25. Cf. Act 2, 41: 8, 12-13; 10, 48; 16, 15.

26. Cf. Cl 2, 12.

27. Cf. Gl 3, 27.

28. Cf. 1 Cor 6, 11; 12, 13.

29. Cf. 1 Pe 23; Ef  5, 26.

30. Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus 80, 3: CCL 36, 529 (PL 35, 1840).

31. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 64: AAS 56 (1964) 117.

32. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 65: AAS 56 (1964) 117; cf. Ibid., 37-40: AAS 56 (1964) 110-111.

33. Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 14: AAS 58 (1966) 963: CIC can. 851.865 866.

34. Cf. CIC can. 851, 2. 868.

35. Cf. Rm 6, 17.

36. Cf. Ordo Baptismi parvulorum, 62 (Typis Polyglottis Vaticanis 1969) p. 32 [Celebração do Baptismo das crianças, 62, Segunda edição típica (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1994), p.61).

37. Cf. Gl 3, 27.

38. Cf. Fl 2, 15.

39. CIC can.864; cf. CCEO. can.679.

40. II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 14: AAS 58 (1966) 962-963; cf. Ordo initiationis christianae adultorum, Praenotanda 19 (Typis Polyglottis Vaticanis 1972) p. 11 Iniciação cristã dos adultos. Segunda Edição, Preliminares, 19 (Coimbra, Gráfica de Coimbra - Conferência Episcopal Portuguesa. 1996) p. 26-27); Ibid., De tempore catechumenatus eiusque ritibus 98, p. 36 [Ibid.. O tempo do catecumenado e os seus ritos 98. p. 66].

41. II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 14: AAS 58 (1966) 963.

42. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 14: AAS 57 (1965) 19: cf. CIC can. 206.788.

43. Cf. Concílio de Trento, Sess. 5ª, Decretum de peccato originali, can. 4: DS 1514.

44. Cf. Cl 1, 12-14.

45. Cf. CIC can. 867: CCEO can. 868. § 1.

46. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15-16; Ibid., 41: AAS 57 (1965) 47; Id., Const. past. Gaudium et spes, 48: AAS 58 (1966) 1067-1069; CIC can. 774. § 2. 1136.

47. Cf. Act 16, 15. 33; 18, 8; 1 Cor 1, 16.

48. Cf. Sagrada Congregação da Doutrina da Fé, Instr. Pastoralis actio, 4: AAS 72 (1980) 1139.

49. Cf. Mc 16, 16.

50. Cf. CIC can. 872-874.

51. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 67: AAS 56 (1964) 118.

52. Cf. CIC can. 861, § 1; CCEO can. 677, § 1.

53. Cf. CIC can. 861, § 2.

54. Cf. 1 Tm 2, 4.

55 Cf. Mc 16, 16.

56. Cf. Jo 3, 5.

57. Cf. Mt 28, 20. Cf. Concílio de Trento, Sess. 7°, Decretum de sacramentis, Canones de sacramento Baptismi, can. 5: DS 1618; II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 14: AAS 57 (1965) 18: ID., Decr. Ad gentes, 5: AAS 58 (1966) 951-952.

58. Cf. Mc 16, 16.

59. II Concílio do Vaticano, Const. past. Gaudium et spes. 22: AAS 58 (1966) 1043; cf. In.. Const. dogm. Lumen Gentium, 16: AAS 57 (1965) 20; In. Decr. Ad gentes, 7: AAS 58 (1966) 955.

60. Cf. Act 2, 38: Jo 3, 5.

61. Cf. Concílio de Florença, Decretum pro Armenis: DS 1316.

62. Concílio de Trento, Decretum de peccato originali, can. 5: DS 1515.

63. Cf. 2 Cor 5, 17.

64. Cf. Gl  4, 5-7.

65. Cf. 2 Pe 1, 4.

66. Cf. 1 Cor 6, 15; 12, 27.

67. Cf. Rm 8, 17.

68. Cf. 1 Cor 6, 19.

69. Cf. 1 Cor 6, 19.

70. Cf. 2 Cor 5, 15.

71. Cf. Ef 5, 21: 1 Cor 16, 15-16.

72. Cf. Jo 13, 12-15.

73. Cf. Heb 13, 17.

74. Cf. 1 Ts 5, 12-13.

75. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 37: AAS 57 (1965) 42-43; CIC can. 208-223: CCEO can 675, § 2.

76. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium. 11: AAS 57 (1965) 16.

77. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 17: AAS 57 (1965) 21; Id., Decr. Ad gentes. 7: AAS 58 (1966) 956; Ibid., 23: AAS 58 (1966) 974-975.

78. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 3: AAS 57 (1965) 93.

79. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 22: AAS 57 (1965)105.

80. Cf. Rm 8, 29.

81. Cf. Concílio de Trento, Sess. 7ª, Decretum de sacramentis, Canones de sacramentis in genere, can. 9: DS 1609: Ibid., Canones de sacramento Baptismi. can. 6: DS 1619.

82. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11:AAS 57 (1965) 16.

83. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 10: AAS 57 (1965) 15-16.

84. Cf. Santo Agostinho, Epistula 98, 5: CSEL 34, 527 (PL 33, 362).

85. Cf. Ef  1, 13-14; 2 Cor 1, 21-22.

86. Santo Ireneu de Lião, Demonstratio praedicationis apostolicae, 3: SC 62, 32.

87. Oração Eucarística I ou Cânone Romano: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 454 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 521].

88. Cf. Concílio de Trento, Sess. Decretum de sacramentis, Canones de sacramentis in genere, can. 9: DS 1609; Ibid., Canones de sacramento Baptismi. can.11: DS 1624.

89. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 16: AAS 57 (1965) 20.

90. Cf. Ordo Confirmationis, Praenotanda 1 (Typis Polyglottis Vaticanas 1973) p. 16 [Celebração da Confirmação, Preliminares 1 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1991) p. 21].

91. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15: cf. Ordo Confirmationis, Praenotanda 2 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 16 [Celebração da Confirmação, Preliminares 2 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa, 1991) p. 21].

92. Cf. Is 11. 2.

93. Cf. Lc 4, 16-22; Is 61, 1.

94. Cf. Mt 3, 13-17; Jo 1, 33-34.

95. Cf. Ez 36, 25-27; Jo 3, 1-2.

96. Cf. Lc 12, 12; Jo 3, 5-8: 7, 37-39; 16, 7-15; Act 1, 8.

97. Cf. Jo 20, 22.

98. Cf. Act 2, 1-4.

99. Cf. Act 2, 17-18.

100. Cf. Act 2, 38.

101. Cf. Act 8, 15-17; 19, 5-6.

102. Cf. Heb 6, 2.

103. Paulo VI. Const. ap. Divinae consortium naturae: AAS 63 (1971) 659.

104. Cf. São Cipriano de Cartago, Epistula 73, 21: CSEL 3/2, 795; (1996), CCL 3C. 556 (PL 3, 1169).

105. Cf. CCEO can. 695, § 1. 696. § 1.

106. Cf. Santo Hipólito de Roma, Traditio apostolica, 21: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 50 e 52.

107. Cf. Dt 11, 14; etc.

108. Cf. Sl 23, 5: 104, 15.

109. Cf. Is 1, 6: Lc 10, 34.

110. Cf. 2 Cor 2, 15.

111. Cf. Gn 38, 18; Cf . 8, 6.

112. Cf. Gn 41, 42.

113. Cf. Dt 32. 34.

114. Cf. 1 Rs 21, 8.

115. Cf. Jr 32, 10.

116. Cf. Is 29, 11.

117. Cf. Jo 6, 27.

118. Cf. Ef 1, 13; 4, 30.

119. Cf. Ap 7, 2-3; 9. 4; Ez 9, 4-6.

120. Pontificale iuxta ritum Syrorum Occidentalium id est Antiochiae, Pars I, Versio latina (Typis Polyglottis Vaticanis 1941) p. 36-37.

121. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 71: AAS 56 (1964) 118.

122. Cf. CIC can. 866.

123. Ordo Confirmationis, 25 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973). p. 26 [Celebração da Confirmação, 25 (Coimbra, Gráfica de Coimbra — Conferência Episcopal Portuguesa, 1991) p. 33].

124. Paulo VI. Const. Ap. Divinae consortium naturae: AAS 63 (1971) 657 [Celebração da Confïrmação, Const. ap. sobre o Sacramento da Confirmação (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) p. 19].

125. Rituale per le Chiese orientali di rito bizantino in lingua greca, Pars 1 (Libreria Editrice Vaticana 1954) p. 36.

126 Cf. Santo Hipólito, Traditio apostolica, 21: ed. B. Botte (Münster i.W. 1989) p. 54.

127. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15.

128. Cf. Concílio de Florença, Decretum por Armenis: DS 1319: II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15; Ibid., 12: AAS 57 (1965) 16.

129. Santo Ambrósio, De mysteriis, 7, 42: CSEL 73, 106 (PL 16, 402-403).

130. Cf. Concílio de Trento, Decretum de sacramentis. Canones de sacramentis in genere, can. 9: DS 1609.

131.Cf. Lc 24, 48-49.

132. São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 72, a. 5. ad 2: Ed. Leon. 12. 130.

133. Cf. CIC can. 889. § 1.

134. CIC can. 890.

135. Cf. CIC can. 891.883. 3.

136. São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 72. a. 8, ad 2: Ed. Leon. 12. 133.

137. Ordo Confirmationis, Praenotanda 3 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 16 [Celebração da Confirmação, Preliminares 3 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) p. 12].

138. Cf. Act 1, 14.

139. Cf. Ordo Confirmationis, Praenotanda 5 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 17 [Celebração da Confirmação, Preliminares 5 (Coimbra, Gráfica de Coimbra – Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) p. 22]: Ibid., 6: (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 17 [(Coimbra, Gráfica de Coimbra - Conferência Episcopal Portuguesa. 1991) 22]: CIC can 893, § 1-2.

140. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 26: AAS 57 (1465) 32.

141. Cf. CIC can. 883, § 2.

142. Cf. CIC can. 882.

143. Cf. CIC. can. 884, § 2.

144. Cf. CIC can 883, 3.

145. II Concílio do Vaticano, Sacrosactum concilium, 47: .AAS 56 (1964) 113.

146. Cf. II Concílio do VaticanoConst. dogm. Lumen Gentium, 11: AAS 57 (1965) 15.

147. II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966) 997.

148. Sagrada Congregação dos Ritos, Instr. Eucharisticum mysterium, 6: AAS 59 (1967) 545.

149. Santo Ireneu de Lião, Adversus haereses 4, 18, 5: SC 100, 610 (PG 7, 1028).

150. Cf. 1 Cor 11, 20.

151. Cf. Ap 19, 9.

152. Cf. Mt 14, 19; 15, 36; Mc 8, 6.19.

153. Cf. Mt 26, 26: 1 Cor 11, 24.

154. Cf. Lc 24, 13-35.

155. Cf. Act 2, 42.46: 20, 7.11.

156. Cf. 1 Cor 10, 16-17.

157. Cf. 1 Cor 11, 17-34.

158. Cf. Sl 116, 13.17.

159. Cf. 1 Pe 2, 5. '

160. Cf. Ml 1, 11.

161. Cf. 1 Cor 10, 16-17.

162. Cf. Constitutiones apostolicae 8, 13, 12: SC: 336, 208 (Funk, Didascalia et Constitutiones Apostolorum 1, 516); Didaké 9,5: SC 248, 178 (Funk, Patres apostolici 1, 22); Ibid. 10, 6: SC 248. 180 (Funk, Patres apostolici 1, 24).

163. Santo Inácio de Antioquia, Epistula ad Ephesios 20, 2: SC 10 bis, 76 (Funk 1, 230).

164. Cf. Sl 104, 13-15.

165. Cf. Oração Eucarística 1 ou Cânone Romano, 95: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970). p. 453 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 521].

166. Cf. Dt 8, 3.

167. Cf. Mt 14, 13-21; 15, 32-39.

168. Cf. Jo 2, 11.

169. Cf. Mc 14, 25.

170. Cf. Jo 13, 1-17.

171. Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 1: DS 1740.

172. Cf. Jo 6, 13

173. Cf. Mt 26, 17-29; Mc 14, 12-25; 1 Cor 11, 23-25.

174. II Concílio do Vaticano, Decr. Ad gentes, 1: AAS 58 (1966) 947.

175. São Justino, Apologia, 1. 67: CA 1. 184-186 (PG 6. 429).

176. São Justino, Apologia, 1. 65: CA 1, 176-180 (PG 6. 428)

177. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 56: AAS 56 (1964) 115.

178. Cf. III Concílio do Vaticano, Const. dogm. Dei Verbum, 21: AAS 58 (1966) 827.

179. Cf. Lc 24, 13-35.

180. Cf. 1 Ts 2, 13.

181. Santo Ireneu de Lião, Adversus haereses 4. 18, 4: SC 100, 606 (PG 7, 1027): cf. Mt 1. 11.

182. Cf. 1 Cor 16, 1.

183. Cf. 2 Cor 8, 9.

184. São Justino, Apologia, 1. 67, 6: CA 1, 186-188 (PG 6, 429).

185. Cf. Oração Eucarística 1 ou Cânone Romano, 90: Missale Romarum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970). p.451 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 518].

186 São Justino, Apologia, 1, 65: CA 1, 180 (PG 6, 428).

187. São Justino, Apologia, 1, 66, 1-2: CA 1. 180 (PG 6, 428).

188. Cf. Ex 13. 3.

189. Cf. Heb 7, 25-27.

190. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6.

191. Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 1: DS 1740.

192. Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 2: DS 1743.

193. Ibid.

194. Santo Inácio de Antioquia, Epistula Ad Smyrnaeos 8, 1: SC 10bis. 138 (Funk 1, 282).

195. II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 2: AAS 58 (1966) 993.

196. Concílio de Trento, Sess. 22ª, Doctrina de ss. Missae Sacrificio, c. 2: DS 1743.

197. Santo Agostinho, Confissões 9, II, 27: CCL 27, 149 (PL 32, 775): palavras de Santa Mónica, antes de morrer, a Santo Agostinho e ao seu irmão.

198. São Cirilo de Jerusalém, Catecheses mystagogicae 5, 9-10: SC 126, 158-160 (PG 30, 1116-1117).

199. Santo Agostinho, De Civitate Dei 10, 6: CSEL 40/1, 456 (PL 41, 284).

200. Cf. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 48: AAS 57 (1965) 53.

201. Cf. Mt 25, 31-46

202. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 7: AAS 56 (1964) 100-101.

203. São Tomás de Aquino, Summa theologiae 3, q. 73, a. 3, c: Ed. Leon. 12, 140.

204. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de s.s. Eucharistia, can. 1: Ds 1651.

205. Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 764.

206.  São João Crisóstomo, De proditione Iudae homilia 1, 6: PG 49, 380.

207. Santo Ambrósio, De mysteriis 9, 50: CSEL 73, 110 (PL 16, 405).

208. Ibid.. 9, 52: CSEL 73, 112 (PL 16, 407).

209. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharista, c. 4: DS 1642.

210. Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharista. c. 3: DS 1641.

211. Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 769.

212. Cf. Gl 2, 20.

213. João Paulo II, Ep. Dominicae Cenae, 3: AAS 72 (1980) 119; cf. Enchiridion Vaticanum 7, 177.

214. Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 757; cf. São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 3. q. 75, a. 1. c: Ed. Leon. 12, 156; São Cirilo de Alexandria, Commentarius in Lucam 22, 19: PG 72, 912.

215.  AHMA 50, 589.

216.  Santo Ambrósio, De Sacramentis, 5, 7: CSEL 73, 61 (PL 16, 447).

217 Santo Ambrósio, De Sacramentis, 4, 7: CSEL73. 49 (PL 16. 437).

218. Oração Eucarística I ou Cânone Romano, 96: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanas 1970). p.453 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992. 521].

219. Cf. Mt 8, 8.

220.  Rito da Comunhão. 133: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.474 [Missal Romano. Gráfica de Coimbra 1992, 546).

221. Liturgia Bizantina. Anáfora de São João Crisóstomo, Prece antes da Comunhão: F. E. Brightman, Liturgies Eastern and Western (Oxford 1896) p. 394 (PG 63, 920).

222. Cf. CIC can. 919.

223. Cf. CIC can. 916-917: AAS 75 (1983 II), pp. 165-166.

224. Os fiéis, no mesmo dia. só podem receber a ss. Eucaristia uma segunda vez. Comissão Pontifícia para a Interpretação Autêntica do Código de Direito Canónico, Responsa ad proposita dubia, 1: AAS 76 (1984) 746.

225. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 55: AAS 56 (1964) 115.

226. Cf. Decr. Ecclesiarum Orientalium, 15: AAS 57 (1965) 81.

227Cf. CIC can. 920.

228. Instrução geral do Missal Romano, 240: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.68 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 51].

229. Fanqîth. Breviarium iuxta ritum Ecclesiae Antiochenae Syrorum, v. 1 (Mossul 1886) p. 237 a-b.

230. Cf. II Concílio do Vaticano, Decr. Presbyterorum ordinis, 5: AAS 58 (1966)997.

231. Cf. I Cor 11, 26.

232. Santo Ambrósio, De Sacramentis, 4. 28: CSEL 73, 57-58 (PL 16, 446).

233. Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª. Decretum de ss. Eucharista, c. 2: DS 1638.

234. São Fulgêncio de Ruspas, Contra gesta Fabiani 28, 17: CCL 91A, 813-814 (PL 65, 789).

235. Cf. 1 Cor 12, 13.

236. Santo Agostinho, Sermão 272: PL 38, 1247.

237. Cf. Mt 25, 40.

238 São João Crisóstomo, In epistulam I ad Corinthios, homilia 27. 5: PG 61, 230.

239. Santo Agostinho, In Iohannis evangelium tractatus 26, 13: CCL 36. 266 (PL 35, 1613): cf. II Concílio do Vaticano, Const. Sacrosanctum Concilium, 47: AAS 56 (1964) 113.

240. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 15: AAS 57 (1965) 102.

241. II Concílio do Vaticano, Decr, Unitatis redintegratio, 15: AAS 57 (1965) 102: ef. CIC can.844, § 3.

242. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 22: AAS 57 (1965) 106.

243. II Concílio do Vaticano, Decr. Unitatis redintegratio, 22: AAS 57 (1965) 106.

244. Cf. CIC can. 844. § 4.

245. Na solenidade do santíssimo corpo e sangue de Cristo, Antífona do «Magnificat» das Vésperas II: Liturgia Horarum, editio typica, v. 3 (Typis Polyglottis Vaticanis 1973) p. 502 [Liturgia das Horas. v. 3 (Gráfica de Coimbra 1983) p. 621].

246. Oração Eucarística I ou Cânone Romano. 96: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.453 [Missal Romano. Gráfica de Coimbra 1992, 521].

247. Cf. Lc 2218: Mc 14. 25.

248. Didaké 10, 6: SC 248, 180 (Funk, Patres apostolici 1, 24).

249. Rito de Comunhão, 126 [Embolismo depois do Pai Nosso]: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p.472 [a tradução oficial portuguesa difere um pouco: «enquanto esperamos a vinda gloriosa de Jesus Cristo nosso Salvador»: Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 5451: cf. Tt 2, 13.

250. Oração Eucarística III, 116: Missale Romanum, editio typica (Typis Polyglottis Vaticanis 1970), p. 465 [Missal Romano, Gráfica de Coimbra 1992, 535].

251. Cf. 2 Pe 3, 13.

252. II Concílio do Vaticano, Const. dogm. Lumen Gentium, 3: AAS 57 (1965) 6.

253. Santo Inácio de Antiquia,  Epistula ad Ephesios, 20, 2: SC l0bis. 76 (Funk 1, 230).

254. Cf. Concílio de Trento, Sess. 13ª, Decretum de ss. Eucharistae. c. 3: DS 1640; Ibid., can. 1: DS 1651.

255. Paulo VI, Enc. Mysterium fidei: AAS 57 (1965) 771.

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Há certas coisas na vida que são demasiado belas para serem esquecidas como, por exemplo, o amor de mãe. O retrato daquela que nos deu o ser é para cada um de nós uma espécie de tesouro. O amor dos soldados que sacrificaram as suas vidas pelo seu país é também demasiadamente belo para que o deixemos cair no olvido e, por isso, prestamos homenagem à sua memória. A maior bênção, porém, de quantos vieram ao mundo, foi, certamente, a visita do Filho de Deus, sob a forma humana. À Sua vida, superior a todas as vidas, é demasiadamente bela para ser esquecida, e é por isso que exaltamos a divindade das Suas palavras na Sagrada Escritura, e a caridade dos Seus feitos nas nossas ações de cada dia.

Infelizmente, algumas almas limitam-se apenas a estas lembranças quando, na verdade, por muito importantes que sejam essas palavras e ações, não são a maior característica do Divino Salvador. O ato mais sublime da história de Cristo foi a Sua Morte. A morte é sempre importante porque sela um destino.

Qualquer homem moribundo representa um cenáculo, e este é sempre um lugar sagrado. A literatura do passado deu especial relevo às emoções que rodeiam a morte, e é essa a razão pela qual ela nunca passou de moda. De todas as mortes registradas no mundo dos homens, nenhuma, no entanto, foi tão importante como a morte de Cristo. Todo aquele que nasceu veio ao mundo para morrer.

A morte foi um triste ponto final para a vida de Sócrates, mas foi uma coroa para a vida de Cristo. Ele próprio nos disse que veio “para dar a Sua vida pela redenção de muitos”. Ninguém poderia tirar-Lha, mas Ele podia dá- la voluntariamente.

Se, portanto, a morte foi o principal momento para o qual Cristo viveu, ela foi também a única coisa pela qual Ele quis ser lembrado. Jesus não pediu aos homens que registrassem as Suas palavras numa Escritura, nem tão pouco que a Sua bondade para com os pobres ficasse gravada na história; mas pediu que os homens recordassem a Sua morte. Para que essa memória não fosse entregue ao acaso das narrativas humanas, Ele próprio instituiu a maneira como devia ser lembrada.

Essa memória foi instituída na noite anterior à Sua morte e, desde então, se chamou “A Última Ceia”. Tomando o pão nas Suas mãos, Jesus disse: “este é o Meu Corpo que se dá por vós; fazei isto em memória de Mim. Tomou também depois, da mesma maneira, o cálice, dizendo: “Este é o cálice do Novo Testamento em Meu Sangue que será derramado por vós (S. Lucas, 22,19-20).

E, assim, num símbolo incruento da separação do Sangue e do Corpo, pela consagração do Pão e do Vinho, Cristo oferece-Se à vista de Deus e dos homens, e representou a Sua morte que devia ocorrer às três horas da tarde do dia seguinte. Ele oferecia-Se para ser imolado como vítima, e para que os homens nunca esquecessem que jamais homem algum dera maior prova de amor do que Aquele que renunciava à vida, em favor dos Seus amigos, e deu à Igreja esta ordem divina: “Fazei isto em memória de Mim”.

No dia seguinte, Jesus realizou em toda a plenitude a cerimônia simbólica da véspera, pois foi crucificado entre dois ladrões; e o Seu sangue foi derramado pela redenção do mundo. A Igreja que Cristo fundou, não só preservou a palavra que Ele proferiu como ainda o ato que praticou, no qual nós recordamos a Sua morte na Cruz, e que é o Sacrifício da Missa – memória da Última Ceia e prefiguração da Paixão de Jesus.

Por esta razão, a Missa é, para nós, o ato culminante da amizade cristã. O púlpito, onde as palavras de Jesus são repetidas, não nos une a Ele; o coro, no qual os suaves sentimentos são cantados, não nos aproxima tanto da Sua Cruz. Um templo sem altar de sacrifício não existiu entre os próprios povos primitivos, e nada significa entre os cristãos. Na Igreja Católica é, pois, o altar, e não o púlpito, ou o coro, ou o órgão, que representa o centro de amizade, pois é ali que se renova a memória da Paixão. O valor do ato não depende daquele que o celebra, mas sim e apenas do Sumo Sacerdote e Vítima, Nosso Senhor Jesus Cristo.

Ali estamos unidos com Ele, a despeito da nossa insignificância; de certa maneira, perdemos a nossa individualidade, durante aquele espaço de tempo; unimos o nosso espírito, a nossa vontade, o nosso corpo, a nossa alma e o nosso coração tão intimamente com Jesus que o Pai Celeste não é a nossa imperfeição que vê, pois contempla-nos através de Aquele que é o Seu Filho Bem-Amado, no qual Ele pôs toda a Sua complacência.

A Missa é o maior acontecimento da história da humanidade: o único Ato sagrado que afasta a ira de Deus de um mundo pecador, porque eleva a Cruz entre a terra e o Céu, renovando assim aquele decisivo momento em que a nossa triste e trágica humanidade viu desenrolar-se na sua frente o caminho para a plenitude da vida sobrenatural.

O que é importante acentuar é a atitude mental que cada um de nós deve adotar perante a Missa, não encarando o Santo Sacrifício da Cruz como um acontecimento ocorrido há mil e novecentos anos, mas sim como um fato acontecido em todas e cada uma das ocasiões em que a ele assistimos.

Esse acontecimento não pertence ao passado, tal como a Declaração do Dia da Independência, pois é um drama permanente, sobre o qual o pano ainda não desceu. Não, não pensemos que o fato ocorreu há muito e não nos diz, portanto, mais respeito do que qualquer outro fato ocorrido no passado.

O CALVÁRIO PERTENCE A TODOS OS TEMPOS E A TODOS OS LUGARES

E foi por isso que Jesus, quando subiu ao alto do Calvário, estava praticamente despojado das Suas vestes. Ele poderia ter salvo o mundo sem ter revestido os atavios de um mundo transitório. A Sua túnica pertencia ao tempo, e localizava, fixava Jesus como um habitante da Galiléia. Agora, porém, despojado das Suas vestes e completamente desapossado das coisas terrenas, Ele não pertencia à Galiléia, nem a qualquer província romana, mas sim ao mundo. Jesus transformara-Se no pobre homem universal, que não pertencia a qualquer povo, mas sim a todos os povos.

Para exprimir com maior amplitude a universalidade da Redenção, a cruz foi erguida nas encruzilhadas da civilização, num ponto central, entre três grandes culturas – Jerusalém, Roma e Atenas, em nome das quais Ele fora crucificado. A cruz foi, assim, erguida perante os olhos dos homens para chamar a atenção do negligente, fazer apelo ao desleixado, e despertar as consciências adormecidas. Foi o único fato irrefutável ao quais as culturas e civilizações do Seu tempo não puderam resistir, e é também nos nossos tempos o único fato irrefutável que não podemos deixar de aceitar.

Os personagens que tomaram parte do drama da cruz foram os símbolos de todos aqueles que crucificaram. Nós estivemos lá, nas pessoas dos nossos representantes. Os que atualmente fazemos ao Cristo Místico fizeram-no eles ao Cristo histórico, em nosso nome. Se temos inveja dos bons, fomos representados pelos Escribas e Fariseus. Se hesitamos em abraçar a Verdade e o Amor divino, receando perder algumas vantagens temporais, estivemos lá, na pessoa de Pilatos. Se a nossa confiança é baseada na força material e procuramos conquistar o mundo por meio dela, em vez de o fazermos através da força espiritual, fomos representados por Herodes. E, assim, a história continua, e implica em si todos os pecados característicos do mundo, pecados que nos cegam para o fato de que Jesus é Deus. Havia, portanto, uma irrefutável certeza na crucifixão.

Os homens que tinham a liberdade para pecar, também a tinham para crucificar. Enquanto o pecado existir no mundo, a crucifixão é uma realidade. Assim o comentou o poeta: “Eu vi passar o Filho de Deus. Coroado de espinhos… E perguntei: Pois não está tudo consumado? Senhor, as amarguras não estão esgotadas? Jesus volveu para mim um olhar terrível E disse-me: Pois não compreendeste? Toda a minha alma é um calvário, Todo o pecado é uma cruz.”

Nós tivemos lá durante a crucifixão. O drama estava já completo, em tudo quanto dizia respeito a Cristo, mas não estava ainda patenteado, em relação a todos os homens, a todos os lugares e a todos os tempos. Se a bobina em volta da qual está enrolado o filme tivesse consciência própria, ela conheceria o argumento de um drama, do princípio até ao fim, ao passo que o espetáculo não poderia, de fato, conhecê-lo, senão depois de o ver completamente reproduzido na tela. Da mesma maneira, Nosso Senhor, pregado na Cruz, viu a Sua eterna vontade, todo o drama da história, a história de cada alma e a hora em que cada uma delas reagiria perante a Sua crucifixão; embora, porém, Ele visse tudo, nós não poderíamos saber como reagiríamos perante a Cruz, antes que as nossas vidas tivessem sido projetadas sobre a tela do tempo. Nós não tínhamos a consciência de havermos estado presentes no Calvário, naquele dia, mas Jesus tinha a consciência da nossa presença. Hoje, todavia, sabemos qual o papel que desempenhamos no cenário do Calvário, pela maneira como vivemos e agimos no cenário do Século Vinte.

E é nisto que reside a atualidade do Calvário, a razão pela qual a cruz é a crise, e o motivo pelo qual, de certa maneira, as chagas ainda estão abertas, a dor divinizada, e as gotas de sangue, à maneira de estrelas, caem ainda sobre as nossas almas.

Não é possível fugirmos à cruz, a não ser que façamos o que fizeram os Fariseus ou vendendo Cristo, como o fez Judas, ou crucificando-O, tal como fizeram os seus carrascos. Todos nós vemos a Cruz, quer para abraçá- la, para nos salvarmos, quer fugindo dela, para nos perdermos.

Como é, porém, que a cruz se torne visível? Como se perpetuou e renovou o cenário do Calvário? No Santo Sacrifício da Missa, porque, quer no Calvário, quer durante o Santo Sacrifício, o Sacerdote e a Vítima são os mesmos. As sete palavras derradeiras são idênticas às sete partes da Missa. Assim como as sete notas musicais comportam uma infinita variedade de harmonias e combinações, também na Cruz há sete notas divinas que o Cristo moribundo fez soar através dos séculos e que, no seu conjunto, constituem a sublime melodia da Redenção do mundo.

Cada palavra é uma parte da Missa. A primeira, “Perdoai-lhes”, representa o Confiteor; a segunda, “Hoje estarás comigo no paraíso”, é o Ofertório; a terceira, “Mulher, eis aqui o teu filho”, é o Sanctus; a quarta, “Por que me abandonaste?”, é a Consagração; a quinta. “Tenho Sede”, é a Santa Comunhão; a sexta, “Tudo está consumado”, é o “Ite missa est”; a sétima, “Pai, nas Vossas mãos entrego o Meu espírito”, é o Último Evangelho.

Representai, pois, na vossa idéia, o Sumo Sacerdote, Cristo, saindo da sacristia do Céu para o altar do Calvário. Ele já se revestiu da nossa natureza humana, colocou no braço o manípulo do nosso sofrimento, a estola do sacerdote, a casula da Cruz. O Calvário é a Sua Catedral; a rocha do Calvário é a pedra do altar; o rubor do sol poente a lâmpada do Santuário; Maria e João são as imagens vivas dos altares laterais; a Hóstia é o Corpo de Jesus; o vinho o Seu sangue. Ele está de pé, como sacerdote, e prostrado, como vítima.

A Sua Missa vai começar.

CONFISSÃO (1ª PARTE)

“Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem”. (Lc. 23,34)

A Missa principia com a confissão. A confissão é uma prece na qual confessamos os nossos pecados e pedimos à Nossa Mãe Santíssima e aos Santos para que intercedam junto de Deus pelo nosso perdão, pois apenas os limpos de coração poderão ver a Deus. Nosso Senhor inicia também a Sua Missa com a Confissão, embora ela seja diferente da nossa neste ponto: Ele é Deus e, portanto, sem pecado. “Qual de vós me argüirá de pecado?” A sua Confissão não pode, portanto, ser uma prece pelo perdão dos Seus pecados, mas sim uma oração pelo perdão dos nossos pecados.

Outros teriam gritado, amaldiçoado, ter-se-iam contorcido, quando os cravos atravessaram os Seus pés e as Suas mãos. Nem a revolta nem a vingança encontram, porém, lugar no peito do Salvador; os Seus lábios não proferem uma única exclamação de represália contra os Seus algozes, nem sequer murmuram uma prece para obter mais forças que Lhe ajudem a suportar as Suas dores.

O Amor Incarnado esquece a angústia e, naquele momento da agonia concentrada, revela algo na altura, da profundidade e inspiração do maravilhoso amor de Deus, quando Jesus pronuncia a sua Confissão: “Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem”. Ele não disse “Perdoa-Me”, mas sim “perdoai-lhes”. O momento da morte era, certamente, o mais adequado para provocar a confissão do pecado, porquanto a consciência, na solenidade das últimas horas, afirma a sua autoridade. Nem sequer esboço de contrição se escapou dos Seus lábios.

Jesus associou-Se aos pecadores, mas nunca Se associou ao pecado. Tanto na morte como na vida, Ele nunca teve a consciência de ter descurado um único dever para com Seu Pai Celestial. E por quê? Porque um homem imaculado, absolutamente isento de culpa, é algo mais que um homem – é Deus. E é nisso que reside à diferença.

Nós vamos buscar as nossas orações às profundidades da nossa consciência do pecado: a própria palavra “perdoa”, prova que Ele é o Filho de Deus. Repare-se nos termos em que Jesus pediu a Seu Pai que nos perdoasse – “Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem”. Quando alguém nos ofende ou censura sem razão, nós comentamos amargamente a falta de conhecimento de quem assim procede. Quando, porém, nós pecamos contra Deus, Ele encontra uma desculpa para perdoar – a nossa ignorância.

Não há redenção para os anjos caídos. As gotas de sangue que caem da Cruz, na Missa de Sexta-Feira Santa de Cristo, não tombam sobre as suas cabeças. E por quê? Porque eles sabiam o que faziam. Eles previam as conseqüências dos seus atos, tão claramente como nós vemos que dois mais dois são quatro, e que uma coisa não pode existir e deixar de existir, ao mesmo tempo.

Verdades desta natureza, uma vez compreendidas, não podem ser refutadas, pois são irrevogáveis e eternas. Foi essa razão pela qual, quando os anjos decidiram revoltar-se contra o Altíssimo, não puderam voltar atrás com a sua decisão. Eles sabiam o que estavam a fazer! Conosco, no entanto, é diferente. Nós não vemos as conseqüências dos nossos atos com a mesma clareza, porque somos mais ignorantes que os anjos. Se, contudo, soubéssemos que cada pecado de orgulho tece uma coroa de espinhos para a fronte de Jesus; se soubéssemos que cada transgressão dos Seus Divinos Mandamentos é a negação da própria Cruz; se soubéssemos que os atos da avareza e soberba correspondem aos cravos que trespassam as mãos e pés de Jesus; se, conhecendo a bondade de Deus, continuássemos a pecar, nunca teríamos sido salvos.

É apenas a nossa ignorância do infinito amor do Sagrado Coração que nos abrange na prece da Sua Confissão, pronunciada do alto da Cruz: “Pai, perdoai-lhes porque eles não sabem o que fazem.” Estas palavras devem ser gravadas no íntimo das nossas almas, e não constituírem desculpa para a nossa reincidência no pecado, mas serem, antes, um motivo de contrição e penitência. O perdão não é uma negação do pecado. Nosso Senhor não nega o horrível fato do pecado, e é precisamente neste ponto que o mundo erra, pois considera-o como que um retrocesso ao processo evolucionário, uma sobrevivência de influências do passado e identifica-o com a verbosidade psicológica. Numa palavra, o mundo moderno nega o pecado.

Nosso Senhor lembra-nos que ele é a mais terrível de todas as realidades. Sendo assim, porque, é, porém, que Ele deu uma cruz àqueles que não pecam? Porque é que deixou derramar sangue inocente? Porque é que estão ligados ao pecado, sentimentos horríveis, como a cegueira moral, a covardia, o ódio e a crueldade? Porque é que Ele saiu do reino do imaterial, revestiu a forma material, e permitiu que a Inocência fosse crucificada num madeiro? Jesus, que amou os homens até a ponto de morrer por eles, permitiu que o pecado exercesse a sua vingança sobre Ele, para mostrar todo o horror representado pela crucifixão de Aquele que mais amava. Aqui, não há, portanto, negação do pecado; a despeito de toda a monstruosidade que ele representa, a Vítima perdoa. A morte de Jesus revela a suprema depravação do pecado, mas tem também a marca de perdão divino. Sendo assim, não há homem que, olhando para um crucifixo, possa afirmar que o pecado não uma coisa grave, nem também possa asseverar que ele não tem perdão.

Pela maneira como sofreu, Jesus revelou a realidade do pecado. Pela maneira como suportou os seus tormentos, Ele revela a Sua compaixão pelo pecador. Ele é a Vítima que sofreu e perdoa. Assim na Vítima, tão humanamente bela, tão divinamente adorável, qualquer de nós pode recordar um Grande Crime e um Grande Perdão. Sob o escudo, que é o sangue de Cristo, podem abrigar-se os maiores pecadores, pois esse sangue tem o poder de sustar as marés da vingança que ameaçam submergir o mundo.

O mundo pode explicar o pecado à sua maneira e desculpá-lo; só, no Calvário, podemos encontrar o perfeito conhecimento da divina contradição do pecado perdoado. A renúncia voluntária e o divino amor transformam o pecado na ação mais nobre e na mais suave e piedosa súplica que o mundo jamais viu e ouviu – a Confissão de Cristo: “Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem”.

Aquela palavra “perdoai”, que soou do alto da Cruz naquele dia em que o pecado se ergueu a toda a altura e com toda a sua força, para ser vencido pelo Amor, produziu um eco que ainda não se extinguiu.

Pouco antes da Sua Morte, o Divino Salvador instituía os meios para prolongar o perdão, através do espaço e do tempo, até ao fim do mundo. Reunindo à Sua volta os membros da Sua Igreja, Ele disse aos Seus Apóstolos: “Aquele a quem perdoardes os pecados serão perdoados”. Em qualquer ponto do mundo dos nossos dias, desde então, os sucessores dos Apóstolos têm o poder de perdoar. Não nos cabe perguntar: Mas, como pode um homem absolver os pecados, se, realmente, um homem não tem esse poder? É Deus quem perdoa, por intermédio do homem. Pois não foi essa a maneira como Ele perdoou àqueles que o pregaram na Cruz, visto que estava revestido da natureza humana? Não será, pois, razoável esperar que Ele nos perdoe os pecados por intermédio de outras naturezas humanas, às quais Ele conferiu esse poder? E onde encontraremos essas naturezas humanas?

Lembro, a propósito, a história daquela caixa, cujo conteúdo fora durante muito tempo ignorado e até ridicularizado pela sua provável insignificância, até ao dia em que foi aberta e se descobriu que encerrava o coração de um gigante. Esse caixa existe em todas as igrejas católicas, e damos-lhe o nome de confessionário. Alguns ignoram-na, ou escarnecem-na; mas a verdade é que nela se contém o Sagrado Coração de Jesus que perdoa aos pecadores, por meio da mão do sacerdote que se ergue, tal como Ele perdoou, quando as Suas mãos se ergueram e foram pregadas nos braços da Cruz. Na realidade, existe apenas o perdão de Deus.

A exclamação “Perdoai-lhes”, foi proferida uma vez – num ato divino e eterno, com o qual a humanidade entrou em contacto através dos tempos.

Assim como não podemos ouvir as melodias e palavras que pairam no ar, a não ser que liguemos os rádioreceptores, também as nossas almas só podem sentir a alegria eterna da divina exclamação “Perdoai-lhes”, acorrendo ao confessionário, onde nos será dado ouvir a divina palavra soltada do alto da Cruz. Deus deseja que, em vez de negar a culpa, o espírito dos nossos dias a admita, olhe para a Cruz, em busca do perdão; Deus quer que as consciências desassossegadas, que não podem encarar a luz e receiam as trevas, procurem alívio, não no domínio da medicina, mas sim na Divina Justiça.

Aqueles cujos espíritos estão imersos nas sombras, devem recorrer à confissão, único meio de expurgar as suas culpas. Em vez de enxugar as suas lágrimas em silêncio, os pobres mortais devem procurar a mão que lhes enxugue o pranto e os absolva. A maior tragédia da vida humana não é, precisamente, aquilo que às almas acontece, mas sim aquilo que lhes falta. E haverá maior tragédia do que a falta de paz, provocada pelo estado de pecado, cuja absolvição se não procura?

A confissão, proferida aos pés do altar, é uma declaração da nossa ausência de merecimento: o “Confiteor” da Cruz é a nossa esperança de perdão e absolvição. As feridas do Salvador foram terríveis; a pior de todas, porém, será aquela que for infligida pelas nossas culpas. O “Confiteor” pode salvar-nos, pois, quando o pronunciamos, admitimos que carecemos de perdão, e muito mais do que podemos supor. Conta-se que certa religiosa, estando um dia a limpar do pó uma pequena imagem do Salvador, a deixou cair. Apanhou-a, intacta, beijou-a e colocou-a no seu lugar, dizendo: “Se não tivésseis caído, não teríeis recebido este ósculo”.

Penso, a propósito, se Deus Nosso Senhor seria para nós o que é, se jamais tivéssemos pecado, pois, se assim fosse, não poderíamos chamar-Lhe “Salvador”.

O OFERTÓRIO – 2ª PARTE

“Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso”. (Lc. 23,43)

Chegamos agora ao Ofertório da Missa, pois Nosso Senhor oferece-Se ao Seu Pai Celestial. Para nos lembrar, porém, que não Se oferece sozinho, mas sim em união conosco, Ele junta à Sua oferta a alma do ladrão crucificado à Sua direita. Para que a Sua ignomínia fosse mais completa, num golpe de maldade suprema, crucificaram-nO entre dois ladrões.

Durante a Sua vida, Jesus andara entre os pecadores; foi, pois, entre eles que Lhe ergueram a Sua cruz. O Salvador modificou o quadro, e fez dos dois ladrões dois símbolos – a ovelha e o bode – representando assim aqueles que estarão à Sua direita e à Sua esquerda, quando Ele descer, por entre as nuvens do Céu, com a Sua Cruz triunfante, a julgar os vivos e os mortos.

Ambos os ladrões, a princípio, revoltaram-se e blasfemaram; mas um deles, aquele a quem a tradição chamou Dimas, voltou a sua cabeça para ler na face do Salvador crucificado a resignação e a dignidade.

Tal como um pedaço de carvão arremessado ao fogo se transforma numa brasa resplandecente, luminosa, também a alma escura daquele ladrão, arremessada às chamas da crucificação, se abrasou no amor do Coração Divino. Enquanto o ladrão da esquerda dizia: “Se és o Cristo, salvaTe e salva-nos”, o ladrão arrependido censurava-o; “Não temes a Deus, visto que sofreste a mesma condenação. Nós padecemos justamente, ao passo que este homem nenhum mal praticou”. Este mesmo ladrão proferiu então uma prece, não para solicitar um lugar nos céus, mas sim e apenas para não ser esquecido. “Lembra-Te de mim, quando estiveres no Teu reino”.

Tal tristeza e fé não podiam ficar sem recompensa. Naquela ocasião, em que o poderio de Roma não conseguiu que Jesus falasse, quando os Seus amigos julgavam que tudo estava perdido, e em que os Seus inimigos se julgavam vencedores, o Salvador quebrou o silêncio. Ele, o Crucificado, transformouSe em Juiz; Ele, o Crucificado, transformou-Se no Divino Protetor de almas: “Eu te digo, hoje estarás comigo no Paraíso”.

Por meio dessas palavras, Nosso Senhor, que estava a oferecer-Se a Seu Pai, como grande holocausto, juntava à Sua oferta, na patena da Cruz, a primeira hóstia humilde, jamais oferecida na Missa – a hóstia do ladrão arrependido; uma brasa tirada da fogueira; um feixe desprezado, esquecido pelos ceifeiros da terra; o grão moído da crucificação e transformado em pão pela Eucaristia. O Salvador não sofre sozinho na Cruz, pois sofre conosco. E foi essa a razão pela qual Ele uniu o sacrifício do ladrão ao Seu próprio sacrifício. É o que significam as palavras de São Paulo quando diz que devemos sofrer aquelas penas que são necessárias aos sofrimentos de Cristo. Isto não significa que Nosso Senhor não sofresse na Cruz tudo quanto pode sofrer, mas sim que o físico, o Cristo histórico padeceu tanto quanto cabia na Sua natureza humana, nem que o Cristo Místico, que é o Cristo e nós, não tenha sofrido pela nossa plenitude.

Nem todos os ladrões que existem na história do mundo reconheceram as suas culpas, nem tampouco pediram para ser lembrados. Nosso Senhor está agora no Céu e já não pode, portanto, sofrer na Sua natureza humana, mas pode padecer ainda mais nas nossas naturezas humanas e pede-nos que, à semelhança do bom ladrão, nos unamos a Ele na Cruz, para que, participando da Sua Crucificação, possamos participar da Sua Ressurreição e da Sua glória celestial.

Assim como, naquele dia, Deus Nosso Senhor escolheu o ladrão para representar a pequena hóstia do sacrifício, escolhe-nos hoje a nós que, assim, representamos outras tantas pequenas hóstias, unidas a Ele, na patena do Altar.

Recordemos a Missa, tal como era celebrada nos primeiros séculos da Igreja, antes que as civilizações tivessem modificado o mundo, sob os pontos de vista econômico e financeiro. Nesses tempos remotos cada qual levava para o Santo Sacrifício, em cada manhã, algum pão ázimo e algum vinho, dos quais o sacerdote tomava uma pequena parte. O restante era posto de lado, abençoado e destruído aos pobres. Nos nossos tempos não trazemos o pão nem vinho, mas trazemos o equivalente, isto é, com que os comprar- as moedas coletadas entre os fiéis durante o ofertório.

Qual a razão desta oferta?

É que o pão e o vinho são, entre as coisas de natureza, aquelas que melhor simbolizam a substância da vida. O trigo é a própria medula, a essência da terra, e o vinho das cepas é o seu próprio sangue. Ambos eles sustentam o nosso corpo e o nosso sangue.

A oferta destas duas substâncias que alimentam a nossa vida, simbolizam a oferta de nós mesmos no Sacrifício da Missa. A nossa presença está, sob as aparências de pão e de vinho – os símbolos do nosso corpo e do nosso sangue. Nós não somos apenas simples espectadores passivos, assistindo a um espetáculo teatral, pois também fazemos a nossa oferta, em união com Cristo. Poder-se-ia representar o nosso papel neste drama, por meio da seguinte imagem: Uma grande cruz, na qual Jesus está pregado e, em torno do Calvário, uma multidão de pequenas cruzes, outras tantas hóstias, por meio das quais nos oferecemos em união com Ele, numa pura oblação ao Pai Celestial. Naquele momento cumprimos literalmente a ordem do Salvador: “Tomai a tua cruz diariamente e segue-Me”.

Ao pronunciar estas palavras, Ele não nos pedia algo que Ele próprio já não tivesse feito. Não há, portanto, desculpa para dizer-mos: “Eu sou uma hóstia, um holocausto pobre, insignificante”, pois também o ladrão o era. Repare-se que houve duas atitudes na alma daquele ladrão, e que ambas foram aceitas por Nosso Senhor. A primeira foi o reconhecimento do fato de que ele mereceu o que estava sofrendo, e que Jesus, que não tinha pecados, não merecera a Sua Cruz. A segunda foi a fé n’Aquele que os homens rejeitaram e que o ladrão reconheceu como sendo o Rei dos reis.

Quais as condições que nos transformam em pequeno holocausto no Sacrifício da Missa? Como pode o nosso sacrifício unir-se ao de Cristo e ser aceito, como sucedeu com o ladrão?

Apenas reproduzindo nas nossas almas as duas atitudes que a alma do bom ladrão manifestou; penitência e fé. Antes de mais, façamos penitência, dizendo: “Eu mereço castigo pelos meus pecados. Preciso fazer penitência”. Quantos ignoram até que ponto tem sido cruéis e ingratos para com Deus! E, se assim é, não deveríamos queixar-nos das mágoas e reveses da vida. Nestas circunstâncias, as nossas consciências assemelham-se a quartos escuros, de onde a luz foi há muito tempo expulsa. Se corrermos as cortinas, verificaremos que tudo quanto julgávamos limpo está coberto de pó.

Algumas consciências estão de tal maneira integradas no hábito da desculpa, que dizem, orando, como o Fariseu: “Agradeço-Te, ó Deus, não ser como resto dos homens”. Outros, blasfemam contra Deus e contra o Céu, à conta dos seus sofrimentos e pecados, mas não se arrependem.

A Guerra Mundial, por exemplo, representou uma expiação do mal e serviu para nos ensinar que não podemos viver no afastamento de Deus; mas o mundo não aprendeu a lição. Tal como o ladrão da esquerda, recusa-se à penitência, nega-se a ver qualquer relação de justiça entre o pecado e o sacrifício, entre a rebelião e a Cruz.

Quantos mais contritos formos, tanto menos esforços faremos para fugir à nossa cruz. Quanto mais reconhecermos o que somos, mais convictos diremos, como o bom ladrão: “Eu mereci esta cruz”.

Ele não pediu para ser desculpado, nem para lhe serem atenuadas as culpas, nem tampouco para ser libertado ou despregado do madeiro de suplício. Ele pediu apenas para ser perdoado. Ele fez penitência porque aceitou o seu holocausto, a sua cruz. Nós não temos também outra maneira de nos transformarmos em pequenas hóstias, senão unindo-nos a Cristo na Santa Missa.

Se os nossos corações não estiverem despedaçados pela tristeza, se não reconhecermos que estamos realmente feridos, como poderemos sentir necessidade de ser consolados e curados? Se não tomarmos a nossa parte de dor na Crucificação, como poderemos pedir que os nosso pecados nos sejam perdoados?

A segunda condição que nos permite ser uma hóstia no ofertório da Missa, é a fé. O ladrão, olhando por sobre a cabeça de Jesus, leu a palavra rei. Estranho Rei aquele, que estava coroado de espinhos, e cuja púrpura real era o próprio sangue, tinha por trono uma cruz, por cortesãos os seus carrascos, e fora coroado na crucificação! A despeito de todos aqueles horrores, o ladrão viu o “ouro” e ergueu a sua voz, a sua prece, acima de todas as blasfêmias. A sua fé era tão forte que ele aceitava, contente, a sua cruz. O ladrão crucificado à esquerda pedia para ser despregado; mas não o da direita, porque ele sabia que há males maiores do que a crucificação, e outra vida para além da cruz. Ele tinha fé no Homem da Cruz central, pois sabia que ele poderia, se quisesse, transformar os espinhos em grinaldas e os pregos em flores. Ele acreditava no Reino que fica para além da Cruz, e sabia que os sofrimentos deste mundo são insignificantes, comparados com as alegrias futuras.

Ele disse como o salmista: “Embora eu siga por entre as sombras da morte, não receio o mal, porque o Senhor está comigo”. Tal fé assemelhava-se à dos três jovens na fornalha ardente, à qual o rei Nabucodonosor os condenara, por se terem recusado a adorar a estátua de ouro. A resposta dos mancebos foi esta: “Deves saber, ó rei, que o Deus a quem adoramos pode tirar-nos da fornalha de fogo ardente e livrar-nos das tuas mãos. E, se Ele o não fizer, fica tu sabendo, ó rei, que nós não honramos os teus deuses, nem adoramos a estátua de ouro que erigiste”.

E, depois de dizerem isto, eles entregaram-se nas mãos de Deus e confiaram n’Ele como Jó. Também o bom ladrão sabia que Nosso Senhor podia libertálo, mas não Lhe pediu que o retirasse da cruz, pois também Jesus não Se retirava a Si próprio, embora os Seus carrascos escarninhos O desafiassem a isso.

Isto não queria dizer que o bom ladrão não amasse a vida, porque ele amavaa como todos nós a amamos. Ele desejava a vida, mais a vida eterna que, finalmente, obteve. Também é dado a cada um de nós descobrir essa Vida, mas só entraremos nela por meio da penitência e da fé que nos une à Grande Hóstia – ao Sacerdote e Vítima que é Cristo. Desta maneira nos transformaremos em ladrões espirituais, para, mais uma vez, nos apoderarmos do Céu.

SANCTUS- 3ª PARTE

Mulher, eis aqui o teu filho… Eis aqui a tua mãe. (João 19,26-27)

Cinco dias antes, Jesus fizera a Sua entrada triunfal em Jerusalém. Aos Seus ouvidos soavam gritos de triunfo; o chão que os Seus pés pisaram foi juncado de folhas de palmeira, e nos ares ecoaram aclamações ao filho de David, e louvores ao Sagrado Filho de Israel. Àqueles que se mantiveram silenciosos durante as demonstrações feitas em Sua honra, Nosso Senhor lembrou que se as suas vozes não se faziam ouvir, as próprias pedras falariam por eles. Esse foi o dia de nascimento das catedrais góticas.

Eles não conheciam a verdadeira razão pela qual Lhe chamavam Sagrado, nem tampouco compreendiam o motivo que levava Jesus a aceitar o tributo dos seus louvores. Eles pensavam que aclamavam uma espécie de rei da terra. Jesus aceitou essas demonstrações porque ia ser o Rei de um império espiritual. Ele aceitou os seus tributos, as suas aclamações e exclamações de louvor porque caminhava, como uma vítima, ao encontro da Sua Cruz.

Toda a vítima deve ser sagrada – Sanctus, Sanctus, Sanctus.

Cinco dias depois, verificou-se o “Sanctus” da Missa do Calvário; mas naquele “Sanctus” da Sua Missa, Jesus dirigiu-Se àqueles que já eram santos – a Sua querida Mãe e ao Seu bem-amado discípulo João. Palavras tocantes foram essas: “Mulher eis aqui o teu filho… Eis aqui a tua Mãe!”.

Falando agora aqueles que já eram santos, Jesus não carecia da divina intercessão, pois Ele era o Filho de Deus. Nós, todavia, precisamos de santidade, pois cada vítima da Missa deve ser santificada, impoluta.

Como podemos, porém, ser os santos participantes do Sacrifício da Missa? Segundo a própria resposta de Jesus, consegui-lo-emos colocando-nos sob a proteção da Sua Mãe Santíssima. Ele dirige-Se à Igreja e a todos os seus membros, representados na pessoa de João, e diz a cada um de nós: “Eis a tua mãe”.

Por que foi, porém, que Jesus se dirigiu a Maria, chamando-lhe Mulher, em vez de Mãe? É que ela era agora a Mãe de todos os cristãos, e a Sua missão era universal – Mãe do Corpo Místico da Igreja, Mãe de todos nós. Há um tremendo mistério oculto naquela palavra “Mulher”. Essa foi, realmente, a última lição de renúncia que Jesus deu a Maria, e a primeira lição de um novo laço. Nosso Senhor alienara gradualmente a Sua afeição por Sua Mãe, não porque a amasse menos, mas sim e apenas porque ela tinha agora mais a quem amar.

Maria desprendia-se da maternidade da carne, para se prender mais à grande maternidade do espírito. Daí, o emprego da palavra “Mulher”. Ela havia de fazer de nós outros tantos Cristos, porque fora ela quem criara o Filho de Deus. Só Maria podia transformar-nos em criaturas santificadas, dignas de pronunciar o Sanctus, Sanctus, Sanctus da Missa do Calvário.

A história de preparação para o papel de Mãe do Corpo Místico de Cristo, está representada nas três cenas da vida do Seu Divino Filho, as três lições reveladas no drama do Calvário, principalmente aquela em que Maria foi chamada a ser, não apenas a Mãe de Deus, mas também a mãe dos homens, não apenas a mãe daqueles que já eram santos, mas também daqueles que pediam para ser santificados.

A primeira teve lugar no Templo, onde Maria e José encontraram Jesus, depois de O terem procurado durante três dias. Sua amada Mãe disse-Lhe que os Seus corações tinham sofrido deveras durante aquela angustiosa procura, ao que Jesus respondeu: “Não sabes que devo ocupar-Me das coisas de Meu Pai?”

Nestas palavras, Jesus queria significar:

“Tenho outra missão, além do trabalho da oficina de carpinteiro. Meu Pai mandou-Me a este mundo para a suprema tarefa da Redenção, por meio da qual todos os filhos dos homens serão filhos adotivos do Meu Pai celestial, tornando-se, assim, membros da grande irmandade de Cristo, o Seu Filho”. Quem poderá dizer quanta luz estas palavras derramaram sobre Maria? Também não sabemos se Ela compreendeu então que a Paternidade de Deus havia de confiar-Lhe o título de mãe dos homens. Dezoito anos depois, na festa das bodas de Cana, Maria teve, porém, pleno conhecimento de tal missão.

Como é consolador pensarmos que Jesus, pregando a penitência, e insistindo para que tomássemos a nossa cruz diariamente e O seguíssemos, iniciasse a Sua vida pública, assistindo a uma boda!

Que maravilha compreensão dos corações humanos!

Quando, no decorrer do banquete, o vinho se acabou, Maria, sempre solicita para com aquele que A rodeavam, foi a primeira a reparar e a procurar o remédio para aquela falta. Ela limitou a dizer a Nosso Senhor:

“Não tem vinho”;

e Ele respondeu:

“Mulher, e o que importa isso, a mim ou a ti?”

Jesus não A tratou por Mãe, mas sim por Mulher, o mesmo título que Lhe dera três anos antes. Jesus queria dizer-Lhe: “Queres que faça algo que Me pertence, como Filho de Deus; pedes-Me que faça um milagre que só Deus pode fazer; pede-Me que exerça a minha divindade que se relaciona com a espécie humana, principalmente como seu redentor. Quanto a divindade operar pela salvação do mundo, Vós serás não apenas minha mãe, mas também a mãe da humanidade redimida. A Vossa maternidade física exercer-se-á no mundo mais vasto da maternidade espiritual, e é essa a razão pela qual Vos chamo mulher”.

Depois, para provar o poder da intercessão de Maria no Seu papel de mãe universal, Ele ordenou que enchessem as brilhas de água e operou-se o primeiro milagre: “As águas, conscientes, viram o seu Deus e coraram”. A terceira cena ocorreu dois anos depois. Um dia, enquanto Jesus pregava, alguém O interrompeu, para dizer: “Vossa mãe não cessa de procurar-Vos”, ao que Jesus respondeu: “Quem é minha mãe?” E, estendendo as mãos para os Seus discípulos, disse: “Contemplai minha mãe e meus irmãos, pois todo aquele que fizer a vontade de Meu Pai que está no céu, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.

O significado destas palavras é irrefutável. Há uma maternidade espiritual e parentescos que não são carnais, nem laços de sangue, mas sim ligações do espírito que nos unem ao Reino Supremo, à Irmandade de Cristo.

Estas três cenas tiveram o seu clima junto à Cruz onde Maria recebeu o título de “Mulher”. Foi essa a segunda Anunciação.

O anjo dissera-Lhe primeiro:

“Ave Maria”.

Seu Filho falou-Lhe em segundo lugar, tratando-A por “Mulher”, o que não significa que Ela deixava se ser Sua mãe, porque havia de ser sempre a Mãe de Deus. A Sua maternidade havia, porém, de expandir-se, espiritualizar-se, tornar-se universal, pois, naquele momento, Maria ficou sendo Nossa Mãe. Nosso Senhor criou o laço onde, por natureza, ele não existia, e que só Ele podia criar. E como foi que Maria Se tornou Mãe dos homens?

Tornando-se, não somente mãe, mas também esposa de Cristo. Ele era o novo Adão e Ela a nova Eva. E, tal como Adão e Eva, tiveram a sua progênie natural, que somos nós.

Também Cristo e Sua Mãe deram origem, na Cruz, à Sua descendência espiritual, que somos nós – os filhos de Maria, ou membros do Corpo Místico de Cristo.

Maria teve o Seu primogênito em Belém. Note-se que São Lucas chama a Nosso Senhor primogênito, não porque Maria tivesse outros filhos, segundo a carne, pois a Sua segunda maternidade seria de caráter espiritual. No momento em que Nosso Senhor Lhe disse “Mulher”, Ela tornou-se, de certa maneira, esposa de Cristo e concebeu em dor o Seu primeiro filho espiritual, cujo nome foi João.

O Seu segundo filho não sabemos quem foi. É possível que fosse Pedro, ou André. De qualquer maneira, todos nós representamos os milionésimos dos milionésimos descendentes daquela Mulher que permaneceu aos pés da Cruz. A troca foi realmente desvantajosa para Aquela que recebeu o filho de Zebedeu, em vez do Filho de Deus.

A nossa vantagem foi, porém, maior, pois, ao passo que Maria não adquiria mais do que filhos insubmissos e tantas vezes rebeldes, nós obtínhamos a mais adorável das mães que existem no mundo – A Mãe de Jesus.

Nós somos filhos de Maria. – literalmente, filhos. Ela é nossa mãe, não por título de ficção, nem de cortesia; ela é nossa mãe porque sofreu naquele momento memorável, e por todos nós, as dores da maternidade. E porque é que Deus quis que ela fosse nossa mãe? Porque Ele sabia que, sem a sua proteção e auxílio, jamais seríamos santificados. Jesus veio até nós por intermédio da pureza de Maria, e só através da pureza de Maria conseguiremos chegar até junto d’Ele.

Cada vítima que sobe ao altar, sob as espécies de pão e de vinho, deve ter proferido o Confiteor e transformar- se em vítima santificada. Sem Maria, não há, porém, santificação.

Note-se que quando tal palavra foi dirigida a Maria, estava prostrada junto à Cruz, uma outra mulher. Já repararam que, praticamente, todas as imagens tradicionais da Crucifixão representam sempre Madalena ajoelhada aos pés da Cruz?

Nunca vimos, no entanto, uma imagem de Maria prostrada. João estava presente e refere no seu Evangelho que ela estava de pé. E porque? Porque era a posição que lhe competia no papel que ali desempenhava, em relação a nós. Maria, a nossa Mãe.

Se Maria estivesse prostrada por terra, naquela hora, tal como Madalena, se ela tivesse sequer chorado, a sua mágoa teria tido um lenitivo. As dores que não desatam, esmagam o coração. Essa dor foi parte do nosso preço de compra, pago pela nossa co-Redentora, Maria, a Mãe de Deus!

Nosso Senhor deixou-a ficar sobre a terra quando Ele subiu aos céus, para que ela fosse a mãe da Igreja, a nossa mãe. A Igreja, infante ainda, carecia do amparo materno, tal como Jesus quando era menino. E foi assim que Maria permaneceu sobre a terra, até que os seus filhos, a sua família se criassem e desenvolvessem. E foi essa a razão porque a encontramos orando com os Apóstolos, enquanto aguardavam a vinda do Espírito Santo.

Mais tarde, foi para o céu, coroada de Rainha dos Anjos e dos Santos, para assistir a outra boda de Caná e interceder por nós, junto ao Salvador, pois nós éramos seus filhos, irmãos de Cristo, e filhos do Pai Celestial.

Virgem Mãe! Que formosa conjugação de virgindade e maternidade, em que a segunda supre a deficiência da primeira.

À virgindade falta qualquer coisa, pois há nela algo de incompleto, que necessita de ser preenchido, uma faculdade invulgar.

A maternidade, isolada, perde qualquer coisa: ela representa uma rendição, uma florescência incompleta, uma frutescência inacabada.

Oh! Foi um milagre divino, essa conjunção, na qual à virgindade nada faltava e a maternidade nada perdeu!

Encontramos ambas as coisas em Maria – Virgindade e Maternidade- a Virgem que recebeu o Espírito Santo, em Belém e no Pentecostes; mãe, por intermédio dos Seus milhões de descendentes, desde Jesus até nós.

A adoração que prestamos a Maria e aquela que prestamos a Nosso Senhor são distintas, pois veneramos nossa mãe e adoramos o Salvador. A Jesus pedimos aquelas graças que só Deus pode conceder: mercê, graça, perdão. A Maria, suplicamos que interceda por nós, junto d’Ele, especialmente na hora da nossa morte. Sabemos que Nosso Senhor escuta e atende os apelos de Sua Mãe Santíssima.

A nenhum outro santo podemos falar como uma criancinha fala a sua mãe, pois nenhuma outra virgem, ou mãe, ou mártir, ou confessor jamais sofreu tanto por nós como ela sofreu. Ninguém jamais firmou tão solidamente os nossos direitos à proteção e ao amor.

Maria é a medianeira de todas as graças que Jesus pode dispensar-nos, pois foi por intermédio de Maria que Jesus veio até nós. Desejamos ser santificados, mas sabemos que tal só é possível por meio de Maria, pois ela foi a dádiva que Jesus nos ofereceu no Sanctus da Sua Cruz.

Não há mulher que possa esquecer o filho das suas entranhas. Maria não pode, pois, certamente, esquecer- nos. É precisamente isso que nós sentimos no íntimo dos nossos corações. Em todas as circunstâncias da nossa vida, nossa Mãe Santíssima vela por nós, pois ela vê em cada um dos seus filhos a criança inocente da Primeira Comunhão, o pecador penitente, encaminhandose para a Cruz, o coração despedaçado, suplicando que a água da vida dissipada se transforme no vinho do amor de Deus.

Em todas essas circunstâncias ressoam aos ouvidos de Maria as palavras pronunciadas do alto da Cruz, sobre o Calvário: “Mulher, eis o Vosso filho!”

A CONSAGRAÇÃO – 4ª PARTE

“Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” (São Mateus 27,46)

Eis a quarta palavra da Consagração da Missa do Calvário. As três primeiras palavras foram dirigidas aos homens. A quarta, porém, foi dirigida a Deus.

Estamos agora na última fase do drama da Paixão. Na quarta Palavra, e em todo o Universo, só existem apenas Deus e Jesus. Esta é a hora das trevas.

Subitamente, o silêncio dessa escuridão é quebrado por um grito – tão terrível e tão inesquecível que até aqueles que não compreenderam a língua em que foi expresso hão de recordar-se sempre do tom estranho em que foi proferido: “Eli, Eli, lamma Sabcthany”.

Sim, embora alguns não pudessem compreender essas palavras da língua hebraica, o tom em que foram ditas não mais lhes esqueceu em toda a sua vida.

As trevas que cobriam a terra naquele momento representam apenas o símbolo exterior da noite escura da alma. O sol pode esconder a sua face perante o terrível crime dos deicidas, mas a verdadeira razão da noite que se estendeu sobre a terra foi a sombra da Cruz que se erguia no Calvário. Toda a criação ficou imersa nas trevas da dor.

Qual foi, todavia, a razão do grito que partiu da escuridão? “Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonastes?”

Esse foi o grito de espanto para o pecado, em que o homem abandonou Deus, em que a criatura esquece o Criador, em que a flor despreza o sol que lhe deu força e beleza. O pecado é uma separação, um divórcio da união com Deus, e do qual derivam todos os divórcios. Desde que Jesus veio a terra para remir os homens dos seus pecados, é certo que Ele sabia que havia de sentir esse abandono, esse apartamento, esse divórcio.

Ele sentiu-o, antes de mais, no íntimo da Sua alma, tal como a base da montanha, se fosse consciente, sentiria o abandono do sol quando uma nuvem descesse sobre ela, embora os seus cumes se conservassem radiosos, banhados de luz.

Não havia sombra de pecado na alma de Jesus, embora Ele quisesse sentir os efeitos do pecado, e a terrível sensação de isolamento e solidão – a solidão do afastamento de Deus.

Renunciando à divina consolação que poderia pertencer-Lhe, Ele quis mergulhar na tremenda solidão da alma que se extraviou de Deus pelo pecado, para expiar a solidão do ateu que nega a existência de Deus e deposita a sua fé nas coisas terrenas, a dor do coração despedaçado de todos os pecadores que sentem a amargura da ausência do seu Criador.

Jesus foi até ao ponto de remir todos aqueles que não crêem e que, na tristeza e na miséria, exclamam, blasfemando: “Por que é que a morte levou tal pessoa?”, “Por que é que perdi aos meus bens?”; “Porque é que hei de sofrer”.

O “Por que” que Jesus dirigiu a Seu Pai é uma expiação que abrange os “porquês” soltados por aqueles que blasfemam.

Para melhor revelar a sensação de tal abandono, Jesus exteriorizou-o. Porque o homem se apartara de Deus, Ele permitiu que o Seu sangue se separasse do Seu Corpo. O pecado entrara no sangue do homem e, como se os pecados do mundo recaíssem sobre Ele, Jesus deixou derramar o Seu precioso sangue, do cálice do Seu Corpo. Quase que podemos ouvi-Lo dizer:

“Pai, este é o Meu Corpo, este é o Meu Sangue. Eles estão separados um do outro, tal como a humanidade se separou de Ti. Esta é a Consagração da Minha Cruz”.

O que aconteceu então no Calvário acontece agora na Missa. Com uma diferença: Na Cruz, o Salvador estava só e, na Missa, está conosco. Nosso Senhor, agora, está no céu, à mão direita de Seu Pai, intercedendo por nós. Já não pode, portanto, sofrer na Sua natureza humana.

Como pode, pois, a Missa ser a renovação do drama da Cruz? Como é que Cristo pode renovar o drama da Cruz?

Ele não pode, realmente, voltar a padecer na Sua natureza, porque está no céu, gozando a divina bem- aventurança, mas pode ainda sofrer nas nossas naturezas humanas.

Ele não pode, de fato, reviver o Calvário no Seu Corpo físico, mas pode renovar os Seus sofrimentos no Seu Corpo Místico que é a Igreja.

O sacrifício da Cruz pode ser renovado, contanto que nós Lhe façamos a oferta do nosso corpo e do nosso sangue, em toda a plenitude. Jesus pode também oferecer-Se novamente a Seu Pai Celestial, pela redenção do Seu Corpo Místico – a Igreja.

Cristo anda no mundo juntando as almas que desejam ser outras tantos Cristos. Para que nos nossos sacrifícios, as nossas tristezas, os nossos calvários, as nossas crucificações, não fiquem isoladas, desunidas, a Igreja reúne-os, junta-os, e o agrupamento, a massa de todos esses sacrifícios humanos reúne-se ao grande sacrifício de Cristo na Cruz, durante a Missa. Quando assistimos ao Santo Sacrifício da Missa, não somos precisamente apenas criaturas terrenas, nem indivíduos solitários, mas sim parcelas vivas de uma grande ordem espiritual, na qual o Infinito penetra e envolve o finito, e o Eterno penetra no ser temporário e passageiro, e o Espiritual reveste a materialidade.

À face de Deus nada existe sobre a terra de mais solene e que mais respeito infunda do que o momento da Consagração, pois a Missa não é uma oração, nem um hino. – é um Ato Divino com o qual entramos em contato num dado momento do tempo.

A rádio pode oferecer-nos uma ilustração imperfeita, um esboço vago do que acabamos de exprimir. A Missa é um Ato único, divino, singular, com o qual entramos em contato todas as vezes que ela se celebra.

Quando a face da medalha ou da moeda são gravadas, ou cunhadas, qualquer desses objetos é a representação visível de uma idéia espiritual que existiu no espírito do artista. Do original podem fazer-se reproduções inúmeras, desde que em cada peça de metal se grave ou reproduza o original.

Na missa dá-se um fato semelhante. O modelo ou padrão é o Sacrifício de Cristo no Calvário, renovado nas almas que entraram em contato com Ele, no momento da Consagração. A respeito, porém, da multiplicidade da Missa, o Sacrifício é apenas um, e sempre o mesmo. A Missa é a comunicação do Sacrifício do Calvário, sob as espécies de pão e de vinho.

Também nós estamos no altar sob essas aparências, pois ambas representam o alimento da vida. Oferecendo, pois, aquilo que nos dá vida, oferecemo-nos, simbolicamente a nós próprios. Além disso, para se transformar em pão, o grão tem de ser moído, e as uvas têm de ser esmagadas, para se transformarem em vinho e, assim, representam os Cristãos, que são chamados a sofrer com Cristo, para que um dia possam também alcançar o Reino dos céus.

O momento da consagração da Missa que nos aproxima de Nosso Senhor equivale às palavras que Jesus pronunciou: “Tu Maria, vós, João, Pedro e André, dai-Me o vosso corpo, dai-Me o vosso sangue, dai-Me todo o vosso ser. Eu não posso sofrer mais. Passei por todos os padecimentos da Cruz, esgotei todos os sofrimentos que o Meu Corpo físico podia suportar, mas não preenchi a medida dos tormentos necessários ao Meu Corpo Místico, do qual vós fazeis parte. A Missa é o momento em que cada um de vós pode escutar literalmente a minha exortação: ‘Toma a tua cruz e segue-Me’”.

Do alto da Cruz, Nosso Senhor já olhava para todos aqueles que haviam de vir, para todos nós, esperando que algum dia nos entregássemos a Ele no momento da consagração. Assistindo à Santa Missa, realizamos, portanto, a esperança que antecipadamente Jesus pôs em nós.

Quando chega o momento da consagração, em obediência às palavras de Deus Nosso Senhor, “Fazei isto em memória de Mim”, o sacerdote toma o pão e diz: “Este é o Meu corpo”; depois, sobre o cálice que contém o vinho, acrescenta: “Este é o Meu sangue do novo e eterno Testamento”. A consagração do pão e do vinho é feita separadamente, como representação da separação do corpo e do sangue; tal como sucedeu na crucificação, o drama do Calvário repete-se sobre o altar.

Cristo não está, porém, sozinho no nosso altar, pois nós estamos com Ele. Daí o duplo sentido da palavra da consagração que, em primeiro lugar, significam: “Este é o Corpo de Cristo; este é o Sangue de Cristo”. O segundo significado é: “Este é o meu corpo, este é o meu sangue”.

E é esta a finalidade da vida! Reunirmo-nos em união com Cristo, aplicar os Seus méritos às nossas almas, imitando-O em todas as coisas, e até na Sua própria morte sobre a Cruz.

A consagração que Jesus fez no Calvário é repetida por cada um de nós quando assistimos à Santa Missa.

Não existe algo de mais trágico no mundo do que a dor sofrida em vão. Quanto sofrimento existe nos hospitais, entre os pobres e os abandonados, e quantos desses sofrimentos são perdidos! E por quê?

Porque muitas almas, abandonadas, crucificadas, não dizem, unidas a Nosso Senhor, no momento da consagração: “Este é o meu corpo. Tomai-O”.

Nenhum padecimento seria desperdiçado, vão, se todos aqueles que sofrem, dissessem nesses momentos:

“Meu Deus, entrego-me nas Vossas mãos. Toma o meu corpo, o meu sangue, a minha alma, a minha vontade, a minha energia, a minha força, os meus bens, a minha saúde. Toma tudo o que eu sou e possuo, pois eu me consagro inteiramente a Vós e em união conVosco, para que o Pai Celestial veja nessa dádiva o Vosso bem- amado Filho.

Àquele em quem Ele pôs todas as Suas complacências. Transmuda o pobre pão da minha vida na Vossa vida divina; transforma o vinho da minha vida desperdiçada no Vosso divino espírito; une o meu coração despedaçado ao Vosso coração; transforma a minha cruz num crucifixo.

Não deixes que a minha dor e o meu abandono se percam, junta os seus fragmentos e, tal como a gota de água é incorporada no vinho, durante o ofertório da missa, deixa que a minha vida se incorpore na Vossa.

Deixa que a minha pequena cruz se reúna à Vossa grande Cruz, para que eu possa obter as alegrias da felicidade eterna, em união conVosco! Consagra as provações da minha existência, pois elas não serão compensadas, senão por meio da minha união conVosco. Transubstancia-me, tal como o pão que é agora o Vosso corpo, e o vinho que é agora o Vosso sangue, e eu serei inteiramente Vosso.

Não me importa que as aparências permaneçam, tal como sucede ao pão e ao vinho, e que aos olhos da terra eu pareça o mesmo que era antes. A minha permanência no mundo, os meus deveres habituais, o meu trabalho, a minha família – tudo isso representa as espécies da minha vida que continuam inalteradas.

A substância da minha vida, porém, a sua essência, – a minha alma, a minha vontade, o meu espírito, o meu coração – transubstancia-os, transforma-os inteiramente no Vosso serviço, para que todo o meu ser possa saber e sentir toda a doçura do amor de Cristo”. Amém.

A COMUNHÃO – 5ª PARTE

“Tenho Sede”. (S. João 19, 28)

O Nosso bem-amado Salvador, chega à comunhão da Sua Missa quando, no íntimo do Sagrado Coração, parte este grito: “Tenho sede”.

Não se trata, certamente, de sede de água, pois a Terra, e tudo quanto ela encerra, Lhe pertenciam, e Ele acalmou as ondas quando as águas enfurecidas pareciam querer ultrapassar os seus limites.

Quando Lhe ofereceram de beber, Ele não aceitou. Era outra, era diferente a sede que atormentava Jesus – era a sede das almas e dos corações humanos. Esse grito foi uma apelo à comunhão – o último da longa série de apelos que o Pastor que é Jesus, dirigiu aos homens.

O próprio fato de ter sido traduzido pelo mais pungente de todos os sofrimentos humanos, que é a sede, dá a medida da sua profundidade e da sua força. A humanidade pode sentir-se faminta de Deus, mas Deus sente-Se sequioso da humanidade.

Ele sentiu essa sede na Criação, quando a fez participante da divindade no jardim do paraíso, e ainda na Revelação, quando tentou chamar a Si o coração afastado do homem, contando-lhe os segredos do Seu amor. Essa sede renovou-se na Incarnação, quando Jesus Se tornou semelhante àquele que amava, revestindo a forma e as aparências humanas. Na Cruz, o Salvador manifestou a mesma sede na Redenção pelo maior amor que jamais existiu, pois que ofereceu a própria vida por aqueles a quem amava. Esse foi o apelo final para a comunhão, antes de se correr a cortina sobre o Grande Drama da vida de Jesus sobre a terra.

Todo o amor dos pais pelos filhos e dos esposo pela esposa, reunidos num amor imenso, representariam apenas uma insignificante parcela, a mais ínfima fração do amor de Deus pelo homem, revelado naquele grito de sede. Ele significou, simultaneamente, não apenas a sede que sentiu por todos os humildes, pelos corações famintos, pelas almas vazias, mas a infinita intensidade do Seu desejo em satisfazer os nossos anseios.

A nossa sede de Deus não encerra algo de misterioso, porque a boca sequiosa suspira pela fonte, a planta volta-se para o sol e os rios correm na direção do mar. Dada, porém, a nossa insignificância e a mesquinhez do nosso amor para com Deus, o amor que Ele nos dedica é, realmente, um mistério. Esse é o significado da sede divina pela Comunhão conosco.

O Salvador já expressara isso mesmo, na parábola da ovelha tresmalhada, ao dizer que O não satisfazia a presença das noventa e nove ovelhas que O seguiam, pois só a recuperação de uma ovelha perdida poderia dar-Lhe alegria completa.

Esta verdade foi novamente expressa na Cruz. Nada podia satisfazer devidamente a Sua sede, senão o coração de cada homem, mulher ou criança, que, uma vez nascidos para Ele, só n’Ele poderiam encontrar a paz e a felicidade.

Esta prece pela comunhão baseia-se no amor, pois este, pela sua própria natureza, é propenso à união. É o amor de cada um de nós pelo próximo que se firma a unidade de um estado. É do amor do homem e da mulher que resulta a união de dois seres numa só carne.

O amor de Deus pelo homem apela, portanto, para a unidade baseada na Incarnação – unidade de todos os homens no Corpo e no Sangue de Cristo. Foi para selar esse amor por nós que Ele Se deu na Sagrada Comunhão, para que, assim como Ele e a Sua natureza humana, nascendo das entranhas da Sua Mãe Santíssima, formaram um só na unidade na Sua Pessoa, também Ele e nós, nascidos das entranhas da humanidade, pudéssemos ser um só na unidade do Corpo Místico de Cristo.

E é por essa razão que empregamos a palavra “receber”, quando falamos da Comunhão com Nosso Senhor na Eucaristia, pois, literalmente, “recebemos” a Vida Divina, exatamente como a criancinha recebe a vida através de sua mãe. Cada vida é sustentada pela comunhão com uma Vida mais elevada. Se as plantas falassem, elas diriam ao orvalho e ao sol: “Só entrando em comunhão comigo, participareis das minhas leis e poderes, e revelareis a vida que em vós existe”.

Se os animais pudessem falar, eles diriam às plantas: “Só participareis da minha vida, entrando em comunhão comigo”.

Todos nós também, os seres humanos, dizemos aos seres inferiores da Criação: “A não ser que entreis em comunhão comigo, não participareis da minha vida humana”. Porque é, pois, que Nosso Senhor não havia de dizernos também: “A não ser que entreis em comunhão comigo, a Vida não entrará em Vós”.

O inferior é transformado em superior: as plantas em animais, os animais no homem, e este, por caminho mais elevado, é “divinizado”, se corresponder àquele apelo, isto é, por intermédio da Vida de Cristo.

A comunhão é, pois, a primeira maneira de recebermos a Vida Divina, à qual não temos mais direito do que a pedra-mármore tem de vir algum dia a dar flor. É apenas uma pura dádiva do Todo-Poderoso que nos amou ao ponto de querer unir-Se a nós, não por meio dos laços da carne, mas sim pelos sagrados laços do Espírito, cujo amor não está sujeito à saciedade, pois é feito de êxtase e alegria.

Quão depressa nos teríamos esquecido de guardar nas nossas almas as dádivas e a imagem de Jesus de Belém e de Nazaré! Deus Nosso Senhor bem sabia que seria assim, mas sabia também quanto precisávamos d’Ele e daí, a dádiva de Si próprio na comunhão, na qual existe um outro aspecto em que raras vezes pensamos.

A comunhão implica não somente a recepção da Vida Divina mas também a oferta, pois todo o amor é recíproco. Não há amor unilateral, pois, por sua natureza, o amor exige reciprocidade. Deus tem sede de nós, mas isso quer dizer que o homem também tem sede de Deus.

Quando vamos receber a Sagrada Comunhão, não devemos nunca esquecer que não vamos apenas “receber” Deus Nosso Senhor, mas sim retribuir também a Sua dádiva, oferecendo-nos a nós próprios na reciprocidade do amor.

Existe ainda um outro aspecto da Comunhão, além da recepção da Vida Divina. São João refere-se a esse aspecto e São Paulo dá-nos essa verdade completamente na sua Epístola aos Coríntios.

A Comunhão não é apenas uma incorporação na Vida de Cristo, mas também uma incorporação na Sua Morte.

“Todas as vezes que comerdes este pão e beberdes deste cálice comemorais a morte do Senhor, até que Ele venha”.

A vida natural tem duas faces: a anabólica e a catabólica. A vida sobrenatural tem também duas faces: a reconstrução, segundo o modelo que é Cristo, e a destruição do velho Adão. A Comunhão implica, portanto, não apenas receber, mas também dar. Não pode haver ascensão a uma vida superior, se não se extinguir a vida inferior. O Domingo de Páscoa pressupõe uma Sexta-Feira Santa. O amor implica uma dádiva mútua que termina na própria recuperação. Assim, a Mesa da Eucaristia é um lugar de troca, e não um lugar de exclusiva recepção.

Acaso poderíamos receber toda a Vida de Cristo, sem Lhe darmos nada em troca? Acaso poderíamos esgotar o cálice, sem contribuir com algo para enchê-lo? Devemos receber o pão, se oferecer o grão que deve ser moído; receber o vinho, sem dar as uvas que devem ser esmagadas? Se durante a nossa vida fôssemos sempre à Comunhão para receber a Vida Divina, e A levássemos conosco, sem deixar nada em troca, seríamos parasitas do Corpo Místico de Cristo.

Devemos, pois, levar conosco, para a Mesa da Eucaristia, o espírito de sacrifício, a mortificação da inferioridade do nosso ser, as cruzes suportadas com paciência, a crucificação do nosso egoísmo, a morte da nossa concupiscência, e, inclusivamente, a nossa falta de merecimentos para receber a Comunhão.

Só nestas circunstâncias a Comunhão será o que realmente sempre deve ser, isto é, uma troca, um comércio entre Cristo e a alma, na qual Ele dá a sua Morte, em troca das nossas vidas, e a Sua Vida pelos Seus filhos adotivos. Nós damos-Lhe o nosso tempo, Ele dá-nos a Sua Eternidade; nós damos-Lhe a nossa humanidade; Ele dá-nos a Sua Divindade; nós damos-Lhe a nossa insignificância, Ele dá-Nos a Sua plenitude, toda a Sua grandeza.

Compreenderemos, realmente, toda a grandeza do amor? Não teremos dito já, em momentos de afetuosa expansão por uma criancinha, numa linguagem que pode variar, mas cujo sentido é o mesmo: “Amo-a tanto, como se ela fizesse parte do meu ser”?

E por quê? Precisamente porque todo o amor anseia pela unidade. Pela ordem natural, Deus dispensou prazeres à união dos laços da carne, mas esses não podem comparar-se ao prazer da união espiritual, nos quais a divindade se sobrepõe à humanidade esta se reveste de aspecto divino, pois toda a nossa aspiração vai para Deus, e Deus vem até nós, e cessamos de ser simples seres humanos para começarmos a ser filhos de Deus.

Se alguma vez na nossa vida tivestes um momento em que uma nobre afeição vos elevou… Se alguma vez amastes alguém de todo o vosso coração, é caso para perguntar o que sentiríeis unindo-vos completamente ao grande Coração do Amor.

Se o coração humano pode dar e sentir tão nobres e elevadas alegrias, o que poderá dar-nos o grande Coração de Cristo?

Oh! Se a simples centelha, já de si, é brilhante, como será a própria chama! Teremos nós a plena consciência da íntima ligação que existe entre a Comunhão e o Sacrifício, por parte de Nosso Senhor e por parte das Suas humildes criaturas, que somos nós?

A Missa torna-nos inseparáveis, pois não há Comunhão sem uma Consagração. Não há recepção do pão e do vinho que oferecemos, a não ser que tenham sido transubstanciados no Corpo e no Sangue de Cristo. A Comunhão é a conseqüência do Calvário.

Toda a natureza testemunha esta verdade; a nossa vida, alimenta-se sacrificando os animais dos campos e as plantas da terra. É da crucificação que nós recebemos a vida. Matamo-los, não para destruir, mas sim para realizar.

E, agora, por um belo paradoxo do Divino Amor, Deus faz da Sua Cruz o meio da nossa salvação. Os homens mataram Jesus, crucificaram-nO na Cruz, mas o Amor do Seu coração eterno não foi extinto nem vencido. Ele quis darnos a própria vida que Lhe tiramos, o próprio alimento que destruímos, alimentar-nos com o pão e o vinho que sepultamos.

Ele transformou o nosso próprio crime numa culpa abençoada, transformando a Crucificação em Redenção, a Consagração em Comunhão, a morte na vida eterna.

O homem é, precisamente, o mais misterioso de todos os seres. Compreendese que o homem seja amado, mas o que não se compreende é que não retribua o amor que recebe. Qual a razão que há para se fazer de Deus Nosso Senhor, o Grande Desamado? Que razão existe para não se amar o próprio Amor? Por que Lhe damos fel e vinagre, quando Ele exclama: “Tenho Sede”…?

ITE, MISSA EST- 6ª PARTE

“Tudo está consumado” (São João 19,30)

Deus Nosso Senhor chega agora ao Ite, missa est da Sua Missa, no momento em que solta o grito de triunfo: “Tudo está consumado!”.

A obra de salvação está concluída; mas quando ela foi iniciada?

Essa obra começou, de fato, no tempo infinito da eternidade, quando Deus quis fazer-Se homem. Antes do princípio do próprio mundo, já a Divina Impaciência existia, para restituir o homem aos braços de Deus. O Verbo existia no céu, impaciente por ser o “Cordeiro sacrificado, desde o princípio do mundo”. Ele manifestou a Sua impaciência sob a aparência de símbolos e imagens proféticas, como se a Sua face moribunda se refletisse em milhares de espelhos, ao longo de toda a história do Velho Testamento. Ele estava impaciente por ser o verdadeiro Isaac, que transportava por suas próprias mãos a lenha para o sacrifício, em obediência ás ordens de Seu Pai celestial Abraão.

Ele estava impaciente por realizar o místico símbolo do Cordeiro da Páscoa Judaica, que foi imolado, sem que um único osso do Seu Corpo fosse quebrado. Ele estava impaciente por ser o novo Abel, morto pelos seus invejosos irmãos da raça de Caim, para que o Seu sangue pudesse erguer aos céus o grito do perdão.

Ele estava impaciente no seio de Sua Mãe, quando saudou João, o Seu precursor.

Ele estava impaciente na Circuncisão, quando antecipou o derramamento do Seu Sangue e recebeu o nome de Salvador.

Ele estava impaciente, quando, na idade de doze anos, recordou a Sua Mãe que devia ocupar-se das coisas de Seu Pai.

Ele estava impaciente na Sua vida pública, quando dizia que tinha ainda um batismo a receber, e estava ansioso por que ele se cumprisse.

Ele estava impaciente no Jardim das Oliveiras, voltando às costas às doze legiões de anjos consoladores.

Ele estava impaciente na Última Ceia, quando antecipou a separação do Seu Corpo e do Seu Sangue, sob as aparências de pão e de vinho.

Finalmente, a impaciência atingiu o seu termo, quando a hora da escuridão se aproximou, no final da Última Ceia. Ele, então, cantou, pela primeira e única vez, precisamente no momento em que caminhava para a morte.

Não teria importância para o mundo o fato de que as estrelas brilhassem com mais intensidade, ou que as montanhas se erguessem, como símbolos de perplexidade, ou que as colinas prestassem o seu tributo aos vales que lhes deram o ser. O que importava apenas era que cada uma das simples palavras que Ele dissera se cumprira exatamente. O céu e a terra não passariam antes que as Suas palavras fossem cumpridas.

Restava apenas o cumprimento de uma palavra de David sobre a realização de cada profecia. Agora, porém, que tudo o mais se cumprira. Ele, o verdadeiro David, pronunciava, por último, as palavras do profeta: “Tudo está consumado”.

O que é que estava consumado? Era a redenção do homem, porque o Amor completara a sua missão, o Amor fizera tudo o que pudera.

Há duas coisas que o amor pode fazer. Por sua própria natureza, o Amor pende para a Encarnação, e toda Encarnação pende para a Crucifixão. Pois não é verdade que, na ordem do amor humano, do afeto do marido pela esposa, e da encarnação, da confluência do amor mútuo, nascem novos seres, que são os filhos?

E quem poderá jamais esquecer os filhos das suas entranhas, cujo amor vai até ao ponto de fazer por eles os maiores sacrifícios, inclusivamente o da própria vida?

E é assim, porque todo o amor, quando verdadeiro, pende para a crucificação. Isto é, porém, uma pálida comparação com a ordem divina, segundo a qual o amor de Deus pela Sua criatura é tão profundo e intenso que terminou numa Encarnação.

O Amor divino, todavia, não se limitou a revestir a forma humana, pois Nosso Senhor veio ao mundo para remi- lo. A morte era, pois, o alvo supremo, que Ele procurava.

A morte, que interrompe e corta as carreiras dos grandes homens, não interrompe, porém, a Sua, pois Ele foi coroado de glória, e este era o único objetivo que Ele procurava. Assim, a Sua Encarnação pendia para a Crucificação, para o maior amor que jamais alguém sentiu, e que sacrificou a própria vida por aqueles a quem amava.

Consumada a obra da Redenção, o Divino Amor podia dizer: “Dei tudo quanto podia dar, em benefício da minha vinha”. O amor não pode, realmente, dar mais do que a vida por aqueles a quem ama: “Ite, Missa est”. – “Ide, a missa está dita”.

A Sua obra estava, pois, consumada. E a nossa?

Quando o Salvador disse “Tudo está consumado”, Ele não quis dizer que as oportunidades da sua Vida se tinham esgotado, mas sim que a Sua obra estava tão perfeitamente terminada que nada havia a acrescentar- lhe, por muito perfeito que fosse.

Quanto a nós, no entanto, quão longe isto está da verdade! Quantos de nós acabam as suas vidas, sem as terem realmente cumprido! Uma vida de pecado pode chegar ao seu fim, mas nunca poderá dizer-se que foi uma existência concluída, perfeita.

Se a nossa vida se limitou a “acabar”, os nossos amigos perguntarão: “quanto tempo viveu?” Se, porém, a nossa vida foi uma existência que atingiu a sua finalidade, que cumpriu, enfim, a pergunta será esta: “quantos merecimentos de boas obras leva ele consigo?”

Uma vida realmente preenchida não se conta pelo número de anos, mas sim pelas suas obras. Não conta o tempo que se gastou na vinha, mas sim o trabalho que ali ficou feito.

Num curto espaço de tempo pode realizar-se tarefa equivalente a muitos anos, pois os próprios que chegam à décima primeira hora podem viver uma vida completa. Os outros, e até aqueles que vieram até Deus, como o bom ladrão, apenas na hora do seu último suspiro, podem acabar a sua existência no Reinado de Deus. A nenhum deles se aplica a triste exclamação de pesar: “Demasiado tarde Te amei, ó Beleza Eterna”!

Nosso Senhor consumou a Sua obra, mas nós não consumamos a nossa. Ele aponta-nos o caminho que devemos seguir. No final, Ele depôs a Sua Cruz, e nós devemos tomá-la sobre os nossos ombros. Ele consumou a Redenção no Seu Corpo físico, mas cabe-nos a nós consumá-la no Seu Corpo Místico. Ele consumou a Salvação, mas nós ainda a não aplicamos ás nossas amas.

Ele terminou a construção do Templo, mas nós devemos habitá-lo. Ele realizou o modelo ao qual devemos adaptar as nossas cruzes. Ele lançou a semente, mas cabe-nos a nós ceifar a seara. Ele encheu o cálice, mas nós ainda não esgotamos o seu conteúdo que refrigera. Ele semeou o campo de trigo, mas nós devemos recolher o grão no nosso celeiro.

Ele consumou o Sacrifício do Calvário; cabe-nos, porém, consumá-lo também, na Santa Missa.

A crucificação, não representa um drama inspirador, mas sim um ato, um modelo ao qual devemos adaptar as nossas vidas. Não devemos limitar-nos a permanecer na contemplação da cruz, considerando-a como uma obra consumada e terminada, como a vida de Sócrates. Não! O que se passou no Calvário aproveita-nos apenas na medida em que o repetirmos nas nossas próprias vidas.

A Missa permite essa relação, pois, por intermédio da renovação do Calvário nos nossos altares, não seremos apenas espectadores, mas sim participantes da Redenção, e é aí que reside a consumação, o cumprimento da nossa tarefa. Jesus disse-nos: “E se Eu me elevar acima da terra, arrastarei comigo todas as coisas”.

Jesus consumou a Sua obra quando foi erguido sobre uma cruz; nós consumaremos a nossa quando Lhe permitirmos que nos atraia, nos arrebate para Si, no Sacrifício da Missa.

A Missa é o ato que torna a Cruz visível aos nossos olhos; é ela que se patenteia, que se ergue em todas as encruzilhadas da civilização, e nos aproxima tanto do Calvário que até os pés fatigados podem fazer a jornada que conduz ao seu doce abraço.

Todas as mãos podem, assim, tocar o Sagrado Fardo, e todos os ouvidos podem ouvir o suave apelo, pois a Missa e a Cruz são uma e a mesma coisa. Em ambos existe a renúncia perfeita da vontade ao Filho bem- amado, o mesmo corpo dilacerado, o mesmo derramamento do precioso sangue, o mesmo perdão divino.

Tudo quanto foi dito e feito durante a Santa Missa, deve acompanhar-nos, para vivermos o sagrado ato, para a praticarmos e o aplicarmos em todas as circunstâncias da nossa vida diária.

O Sacrifício de Jesus transforma-se no nosso próprio sacrifício, por meio da oblação de nós próprios, em união com Ele; a Sua vida, oferecida por nós, transforma-se na própria vida que Lhe oferecemos.

Que, ao voltar da Santa Missa, tenhamos feito a nossa escolha, voltando costas ao mundo, para fazermos parte da geração daqueles que vivem à semelhança de Cristo, e são assim testemunhas vivas do Amor d’Aquele que morreu por nós, para que pudéssemos viver com amor.

O mundo dos nossos dias está repleto de catedrais incompletas, de vidas incompletas, de almas meio crucificadas. Algumas levam a cruz até ao Calvário e, depois, abandonam-na; outros, deixaram-se pregar, mas despregaram-se, antes que a sua cruz, fosse erguida ao alto; outros estão crucificados: mas, se o mundo os desafia, dizendo “Desce da cruz”, eles descem, decorrida uma hora… Duas horas… Ou duas horas e cinqüenta e cinco minutos…

Verdadeiros cristãos são aqueles que perseveram até ao fim. Nosso Senhor também ficou, até que a Sua obra estivesse consumada.

Da mesma maneira, o sacerdote não abandona o altar, sem que a Missa esteja terminada. Também nós devemos permanecer na cruz, até que as nossas vidas se tenham cumprido. Cristo crucificado é o perdão, o modelo de uma vida preenchida.

A nossa natureza humana é o material bruto, a nossa vontade é o cinzel; a graça de Deus é a energia e a inspiração.

Sob a ação do cinzel, desbastam-se os blocos grosseiros da nossa natureza imperfeita. Os primeiros pedaços que caem representam o nosso egoísmo. Depois, por meio de uma cinzelagem mais delicada, mais leve, desbastamos excrescências que representam o orgulhoso exagero da personalidade, o egocentrismo.

Finalmente, com uma escovadela da própria mão, faremos surgir à luz do dia a obra-prima completa – o ser perfeito, à imagem e semelhança do modelo patenteado na Cruz. Nós estamos no altar sob as aparências de pão e de vinho; nós oferecemo-nos a Nosso Senhor, e Ele consagrou-nos.

Não devemos, portanto, bater em retirada, mas sim permanecer até o final, orando sem cessar, para que um dia, ao olharmos para o passado, possamos dizer que vivemos na intimidade d’Aquele que morreu por nós, na Cruz, e tal como Ele, possamos pronunciar a Sexta Palavra: “Tudo está consumado”. Assim, as suaves palavras do “Ite, Missa est” ressoarão ao longo dos corredores do Tempo, transpondo os umbrais da Eternidade. E os coros dos anjos e o exército branco da Igreja Triunfante responderão: “Deo Gratias”

O ÚLTIMO EVANGELHO – FINAL

“Pai, nas vossas mãos entrego o meu espírito”. (São Lucas 23,16)

O último Evangelho da Missa é um formoso paradoxo que nos faz regressar ao princípio, pois abre com as palavras “no princípio”…

Também na vida humana o fim é o princípio de outra vida. A última palavra de Nosso Senhor foi realmente, o Seu último evangelho: “Pai nas vossas mãos entrego o meu espírito”.

Tal como no evangelho da Missa, também Ele regressa ao Pai de onde veio. Jesus completara a Sua obra. A Sua missa começara com a palavra Pai, e foi com essa mesma palavra que Ele terminou.

“Todas as coisas perfeitas, diziam os Gregos, movem-se em sentido circular”. Tal como os grandes planetas, que só após um longo espaço de tempo completam as suas órbitas e regressam novamente ao seu ponto de partida, como que para saudarem Aquele que os colocou no seu caminho, também o Verbo Incarnado, que veio ao mundo para dizer a Sua Missa, ao completar a Sua Missa na Terra regressou para junto de Seu Pai Celestial que O enviara para a jornada da Redenção do mundo.

O Filho Pródigo está prestes a regressar à casa de Seu Pai, pois Jesus é também o Filho Pródigo que durante tinta e três anos deixou a casa de Seu Pai e a bem-aventurança do Céu e veio ao país estrangeiro que é a Terra- pois é estrangeiro todo o país distante da casa paterna. Ele despendeu a substância da Sua Verdade na infabilidade da Sua Igreja, e a substância do Seu Poder na autoridade que deu aos Seus Apóstolos e aos Seus sucessores.

Ele despendeu a substância da Sua Vida na Redenção e no Sacramento. Quando esgotou tudo até a última gota, Ele volveu o olhar para a casa de Seu Pai e, num grito ressonante, lançou o Seu Espírito para os braços de Seu Pai, não como alguém que mergulha na escuridão, mas sim como quem sabe que caminha para onde será bem-vindo.

Naquela última palavra e naquele último evangelho que O fez regressar ao Princípio de todos os princípios, e principalmente a Seu Pai, revelam-se a história e o ritmo da vida. O fim de todas as coisas regressa, de qualquer maneira, ao seu princípio.

Tal como a Filho regressa à casa de Seu Pai, e como o corpo regressa ao pó de onde nasceu, também a alma do homem, que veio de Deus, deve algum dia voltar para junto de Deus.

A morte não é o fim de todas as coisas. A lousa fria que cai sobre a sepultura não marca o fim da história de um homem. A maneira como ele viveu a sua vida determina as condições da sua vida futura. Se ele procura Deus durante a existência, a morte será como que a abertura de uma gaiola. Ele poderá então, servindo-se das suas asas, voar para os braços do Bem-Amado.

Se ele, durante a vida, se afastou de Deus, a morte ser-lhe-á como que o início de um eterno afastamento da verdadeira Vida, da Verdade e do Amor – será o inferno.

Junto ao trono de Deus, de onde viemos para o nosso noviciado da Terra. Deveremos regressar algum dia para prestar contas do uso que fizemos da nossa existência. Não haverá um único ser humano que, ao chegar à última folha do livro da sua existência, não encontre ali traçado o seu destino, segundo aceitou ou rejeitou a divina dádiva da Redenção.

Aceitando-a, ou rejeitando-a, o homem terá assinado, por sua própria mão, a sentença do seu eterno destino. Tal como na caixa registradora ficam apontadas as importâncias para serem conferidas no final do nosso dia de negócio, também os nossos pensamentos e obras são registrados para o Julgamento Final.

Se, porém, vivemos sempre à sombra da Cruz, a morte não será o fim, mas sim o princípio da vida eterna. Em vez de uma separação, aguardar-nos-á uma reunião; em vez de uma partida, será uma chegada; em vez de encontrarmos um fim, esperar-nos-á um último evangelho – um regresso ao princípio.

Tal como a voz do destino murmura, “Deves abandonar a Terra”, a voz do Pai diz: “Meu Filho, vem para Mim”!

Fomos enviados a este mundo como filhos de Deus, para assistirmos ao Santo Sacrifício da Missa. Compete- nos permanecer aos pés da Cruz e, como àqueles que ali permaneceram desde o primeiro dia, ser-nos-á pedida a declaração da nossa lealdade.

Deus deu-nos o grão e a cepa da vida e, à semelhança do homem que, segundo o Evangelho, recebeu talentos, também nós devemos apresentar a retribuição das graças divinas que tivermos recebido.

A vida que Deus nos concedeu representa o grão e as cepas, e é nosso dever consagrá-los, restituí-los a Deus, sob as formas de pão e de vinho, transubstanciados. As nossas mãos devem apresentar o fruto das colheitas, quando chegar o fim da nossa peregrinação na terra.

É essa a razão pela qual o Calvário se ergue no meio de todos nós, e nos encontramos sobre a sua montanha sagrada. Não nascemos para ser simples espectadores, ou para lançarmos os dados, como fizeram os algozes de outrora, mas sim para sermos participantes do mistério da Cruz.

A maneira de reproduzir o quadro do Último Julgamento, durante a Santa Missa, será a evocação da forma como o Pai recebeu e saudou o Seu Filho, olhando para as Suas mãos. Nelas se evidenciavam os vestígios do trabalho, as calosidades da Redenção e as cicatrizes da Salvação.

Também nós, terminada a nossa peregrinação na Terra e no regresso ao princípio, veremos que Deus olha as nossas mãos. Se durante a nossa vida tivermos tocado as mãos do Seu Divino Filho, as nossas mãos apresentarão as marcas dos pregos; se tivermos percorrido a senda que conduz à eterna glória, através das veredas tortuosas e difíceis do Calvário, também os nossos pés apresentarão os mesmos ferimentos; se os nossos corações bateram em uníssono com o de Jesus, também eles ostentarão a chaga do lado, aberta pela lança que trespassou o Coração do Salvador.

Abençoados são, pois todos aqueles que levam nas suas mãos, marcadas pelos cravos da Cruz, o pão e o vinho das suas vidas consagradas, marcadas pelo signo e pelo selo do Amor redentor.

Mal, porém, daqueles que se afastaram do Calvário e que apresentarão as mãos brancas e sem cicatrizes! Quando a vida se acaba, e a Terra se desvanece como um sonho, quando a luz da eternidade entra a jorros nas almas, com todo o seu esplendor, os justos podem com uma fé humilde, mas triunfante, repetir, como num eco, a última palavra de Cristo: “Pai, nas Vossas mãos entrego o meu espírito”!

E, assim, termina a Missa de Cristo. O Confiteor foi a Sua oração ao Pai, para que nos perdoasse aos nossos pecados; o Ofertório foi a apresentação das pequenas hóstias, sobre a patena da Cruz; o Sanctus foi a encomendação das nossas almas a Maria, a Rainha de todos os Santos; a Consagração representou a separação do corpo do Salvador e a aparente separação de divindade e humanidade; a Comunhão foi a Sua sede pelas nossas almas; o Ite Missa est foi o remate da obra da salvação; o último evangelho foi o regresso de Jesus a Seu Pai.

E, agora que a Missa está dita, que Jesus encomendou o Seu espírito ao Pai Celestial, Ele prepara-Se para restituir o Seu corpo a Sua Mãe Santíssima, aos pés da Cruz. Também esta última fase será um regresso ao princípio da Sua vida terrestre – a Belém, ao tempo em que Se aconchegava no regaço de Sua Mãe, retomando novamente o Seu lugar.

A Terra tinha sido cruel para Ele; os Seus pés vaguearam pelos caminhos da ovelha tresmalhada, e nós trespassamo-los com os cravos de ferro; as Suas mãos ofereceram-nos o pão da Vida Eterna, e nós pregamo- las nos braços da Cruz; os Seus lábios ensinaram-nos a Verdade, e nós oferecemos à Sua sede o fel e o vinagre. Ele veio para nos dar a Vida, e nós demo-Lhes a morte; mas esse foi o nosso erro fatal, pois não Lhe roubamos realmente a vida, e apenas tentamos fazê-lo. Ele deixou-Se vencer por Sua própria vontade.

Nenhum dos Evangelhos diz, de fato, que, Ele morreu, mas sim, “Ele rendeu o espírito”. Foi, pois, um ato voluntário, uma renúncia espontânea da própria vida. Não foi a morte que se aproximou d’Ele. Foi Ele quem Se aproximou da morte. E foi por essa razão que o Salvador, à aproximação do fim, ordenou que os portais da morte se Lhe abrissem, na presença de Seu Pai.

O cálice vai-se gradualmente enchendo com o vinho rubro e precioso da salvação. As rochas da terra abrem as suas bocas sequiosas, para bebê-lo, como se ela própria estivesse mais necessitada da torrente da salvação do que os ressequidos corações dos homens.

A Terra estremeceu de horror porque os homens tinham erigido sobre seu seio a Cruz de Deus. Madalena, arrependida, lá estava, abraçada aos pés da Cruz; João, o sacerdote, cujo rosto é a imagem fiel do próprio amor, escuta as pulsações do coração, cujos segredos aprendera a amar.

Maria, absorta, pensa quanto o Calvário é diferente de Belém. Trinta e três anos antes, Maria baixava o seu doce olhar para a sagrada face de Jesus Menino. Em Belém o Céu contemplava a face da Terra; agora, os papéis invertiam-se. É a Terra que ergue os olhos para a face do Céu – um Céu marcado pelas cicatrizes da Terra.

Ele amava Maria, acima de todas as criaturas da Terra, porque Ela era a Sua Mãe e a Mãe de todos nós. Ele viu-A, logo que chegou a Terra, e viu-A ainda no momento derradeiro, antes de A deixar. Os Seus olhos encontraram-se, resplandecentes de vida, trocando, entre si, uma linguagem que só Eles entendiam.

No meio de um rapto de amor, uma cabeça inclinou-se, um coração parou, outro coração despedaçou-se. Jesus entrega o Seu espírito puro, sem mácula, nas mãos de Deus, por entre o ressoar das trombetas da vitória eterna. E Maria, a Mãe que acaba de perder o Seu Filho, permanece aos pés da Cruz. Jesus está morto.

Maria ergue o Seu olhar para os olhos de Jesus, vivos e claros ainda no Seu rosto imobilizado pela morte.

Sumo Sacerdote do Céu e da Terra, a Vossa Missa está terminada! Deixa o altar da Cruz e encaminha-Vos para a Vossa sacristia. Como Sumo Sacerdote, Vós vieste da sacristia do Céu, paramentado com as vestes da humanidade, e o Vosso corpo e o Vosso sangue eram o pão e o vinho. Agora, o Sacrifício está consumado. Fez-se ouvir o toque da campainha da Consagração, e resta apenas o cálice esgotado e enxuto. Entra na Vossa sacristia, despe as vestes da mortalidade, e enverga a túnica branca da imortalidade.

Mostra as Vossas mãos, os Vossos pés e o Vosso lado a Vosso Pai Celestial e diz: “Assim fui ferido na casa daqueles que Me amaram”.

Entra, Sumo Sacerdote, na Vossa sacristia celestial e, quando os Vossos representantes na Terra erguerem a hóstia e o cálice, mostrai-Vos ainda a Vosso Divino Pai, e intercede amorosamente por nós, até a consumação dos séculos.

A Terra foi cruel para conVosco, mas Vós serás extremamente misericordioso para com ela. A Terra Ergueu- Vos na Cruz, mas agora Vós elevarás a terra por meio por meio da Cruz. Abre as portas da celestial sacristia, ó Sumo Sacerdote! Vê que estamos agora à Vossa porta e não cessamos de bater!

E o que Vos diremos nós a Vós, Maria? A Vos que és a sacristia do Sumo Sacerdote, como já o foste em Belém, quando Ele veio até junto de Vós, para trazer ao mundo o grão e a cepa? E foste-o também na Cruz, onde Jesus Se transformou no Pão da Vida e no Vinho, por meio da Crucificação.

Vós és também o Seu sacristão, agora que Ele vem do altar da Cruz, trazendo apenas o Cálice enxuto do Seu sagrado corpo. Quando esse cálice repousa no Vosso regaço é como se voltasses aos tempos de Belém, porque Ele é Vosso, mais uma vez, O cálice só é, porém, o mesmo, na aparência, pois o de Belém sofrera apenas a prova do fogo que o moldara, ao passo que o da Paixão passara pelo duplo fogo do Gólgota e do Calvário.

Em Belém, Ele era branco, tal como viera das mãos de Deus, Seu Pai: agora é da cor de sangue, tal como vem até nós.

Vós sois, porém, ainda a Mãe Imaculada daqueles que ajoelham junto ao altar; fazei com que nos apresentemos ali na maior pureza e assim nos conservemos, até ao dia em que entremos na Sacristia Celestial do Reino dos Céus, onde Vós sereis a nossa eterna sacristia e Jesus o nosso eterno Sacerdote.

E vós, amigos do Crucificado, o vosso Sumo Sacerdote abandonou a Cruz, mas deixou-nos o altar. Na Cruz, Ele estava só, mas na Missa está conosco. Na Cruz, Ele sofreu no Seu corpo físico. No altar, Ele sofre no Seu Corpo Místico, que somos nós.

Na Cruz, Ele era a única Hóstia; na Missa, nós representamos pequenas hóstias, e Ele a Hóstia imensa, recebendo o Seu Calvário por nosso intermédio.

Na Cruz, Ele era o Vinho; na Missa nós somos a gota de água, unida com o vinho e consagrada com Ele.

Sob esse aspecto, Ele está ainda na Cruz, rezando a Confissão conosco, perdoando-nos ainda, encomendando-nos ainda a Maria, sequioso ainda por nós, encaminhando-nos ainda para junto de Seu Pai, pois, enquanto o pecado existir na terra, a Cruz permanecerá!

“De dia ou de noite,
Onde quer que o silêncio me rodeie, Sou surpreendido por um grito
Que vem do alto da Cruz.
A vez primeira que o ouvi,
Parti à procura…
E encontrei um homem nas agonias da crucificação.
E disse-Lhe:
“Vou despregar-Vos da Cruz!”
E tentei arrancar os cravos dos Seus pés, Mas Ele disse:
“Deixa-os estar, porque eu não posso ser retirado,
Enquanto cada homem, cada mulher e cada criança
Não vierem, juntos, retirar-me daqui”.
E eu volvi: “mas eu não posso ouvir Vosso grito.
O que devo fazer?”
E Ele replicou:
“Vai, mundo fora, e diz, a todo aquele que encontrares
Que está um Homem pregado na Cruz!”

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