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FC!#244 - Meditações para a Quaresma - Comemoração da Coroa de espinhos de Nosso Senhor Jesus Cristo - Santo Afonso Maria de Ligório
Et milites plectentes coronam de spinis, imposuerunt capiti eius – “E os soldados tecendo de espinhos uma coroa, lha puseram sobre a cabeça” (Jo 19, 2)
Os bárbaros algozes, não contentes com a horrível carnificina feita em Jesus com a flagelação, Lhe põem por escárnio uma coroa de espinhos na cabeça e apertam-na de modo que os espinhos penetraram até ao cérebro. Eis como o Senhor quis reparar a maldição fulminada contra a terra, isto é, contra Adão, em conseqüência da qual a natureza humana não pode produzir senão abrolhos e espinhos de culpas! Eis como Jesus quis expiar os nossos maus pensamentos! Os bárbaros algozes ainda não contentes com a horrenda carnificina feita no corpo sacrossanto de Jesus Cristo com a flagelação, instigados pelos demônios e pelos judeus, querendo tratá-Lo de rei de comédia, Lhe põem aos ombros um farrapo de um vestido vermelho, à guisa de manto real; uma cana verde na mão à guisa de cetro, e na cabeça um feixe de espinhos entrelaçados em forma de coroa. E para que esta coroa não só Lhe servisse de ludibrio, mas também Lhe causasse grande dor, foi feita, na opinião comum dos escritores, em forma de capacete ou chapéu, de sorte que cobria toda a cabeça do Senhor, descia até sobre a testa.
Além disso, colhe-se do Evangelho de São Mateus, que os algozes com a mesma cana batiam nos espinhos compridos, a fim de entrarem mais dentro na cabeça. Com efeito, no dizer de São Pedro Damião, chegaram a penetrar até ao cérebro: spinae cerebrum perforantes. Se um só espinho encravado no pé de um leão o faz ressoar toda a floresta com seus dolorosos gemidos, imagina quão acerba deve ter sido a dor de Jesus Cristo que teve toda a sagrada cabeça perfurada, a parte mais sensível do corpo humano, ao qual se reúnem todos os nervos e sensações.
Tão atroz tormento não foi para Jesus de curta duração; bem ao contrário, foi o mais longo da sua Paixão, porquanto durou até à sua morte. Visto que os espinhos ficavam encravados na cabeça, todas as vezes que lhe tocavam na coroa ou na cabeça, sempre se lhe renovavam as dores. E o Cordeiro manso deixou-se atormentar à vontade dos algozes, sem proferir uma só palavra. ― Era tão grande a abundância de sangue que corria das feridas, que Lhe cobria o rosto, ensopava os cabelos e a barba, e Lhe enchia os olhos. São Boaventura chega a dizer que não era já o belo rosto de Senhor que se via, mas o rosto de um homem esfolado. Eis aí, exclama o Bem-aventurado Dionísio Cartusiano, como quis ser tratado o Filho de Deus, para obter para nós a coroa de glória no céu.
I. Maledicta terra in opere tuo… spinas et tribulos germinabit tibi (1) ― “A terra será maldita na tua obra… ela te produzirá espinhos e abrolhos”. Esta maldição foi lançada por Deus contra Adão e toda a sua descendência; pois que pela terra, não se entende tão somente a terra material, senão também a natureza humana, que estando infectada pelo pecado de Adão, não produz senão espinhos de culpas. ― Para cura desta infecção, diz Tertuliano, foi mister que Jesus Cristo oferecesse a Deus o sacrifício do seu longo tormento da coroação de espinhos. Por isso Santo Agostinho não hesita em dizer que os espinhos não foram senão instrumentos inocentes; mas que os espinhos criminosos, que propriamente atormentaram a cabeça de Jesus Cristo, foram os nossos pecados, e em particular, os nossos maus pensamentos: Spinae quid nisi peccatores? É isso exatamente o que Jesus Cristo mesmo deu a entender, quando apareceu certa vez a Santa Teresa, coroado de espinhos. Quando a Santa Lhe testemunhava a sua compaixão, disse-lhe o Senhor:
Ó “Teresa, não te compadeças de mim pelas feridas que me abriram os espinhos dos judeus, mas antes pelas que me causam os pecados dos cristãos”
― Ó minha alma, tu também atormentaste então a cabeça de teu Redentor com o teu frequente consentimento no pecado. Por piedade! Abre ao menos agora os olhos, vê e chora amargamente o grande mal que fizeste.
Ah, meu Jesus, Vós não tínheis merecido ser tratado por mim como Vos tenho tratado. Reconheço a minha ingratidão; arrependo-me de todo o meu coração. Peço-Vos que não somente me perdoeis, mas que me deis tão grande dor, que durante a minha vida toda continue a chorar as injúrias que Vos fiz. Sim, Jesus meu, perdoai-me, visto que Vos quero amar sempre e sobre todas as coisas. “E Vós, ó Eterno Pai, concedei-me que, venerando na terra, em memória da Paixão de Jesus Cristo, a sua coroa de espinhos, mereça ser um dia por Ele coroado no céu com uma coroa de glória e honra”. Fazei-o pelo amor do mesmo Jesus Cristo e de Maria, sua Mãe.
FC!#243 - Meditações para a Quaresma - Amor de Jesus Cristo em dar-se a nós como Alimento - Santo Afonso Maria de Ligório
In funiculis Adam traham eas, in vinculis caritatis… et declinavi ad eum ut vescerentur – “Eu as atrairei com as cordas com que se atraem os homens, com as prisões da caridade… inclinei-me para ele, para que comesse” (Os 11, 4)
Quanto se julgaria distinguido o súdito a quem o príncipe mandasse algumas iguarias da sua mesa? Jesus Cristo, porém, na santa comunhão, nos dá para sustento, não só uma parte da sua mesa, mas o seu próprio corpo, a sua alma e a sua divindade. Será porventura uma pretensão exagerada da parte do Senhor, se, em compensação de tão grande dom, nos pede o nosso pobre coração todo inteiro? Todavia quantos cristãos não há que Lho recusam completamente ou Lho querem dar, mas dividido entre Ele e as criaturas?
I. Jesus Cristo não satisfez o seu amor, sacrificando a sua vida por nós num oceano de ignomínias e dores, a fim de patentear o amor que nos tinha. Além disso, e para nos obrigar mais fortemente a amá-Lo, quis, na véspera da sua morte, deixar-se todo a nós como nosso alimento na santíssima Eucaristia. ― Deus é todo-poderoso, mas depois de dar-se a uma alma neste Sacramento de amor, não lhe pode dar mais. Diz o Concílio de Trento que Jesus, dando-se aos homens na santa comunhão, derramou (por assim dizer) neste único dom todas as riquezas de seu amor infinito: Divitias sui erga homines amoris velut effudit.
Como não se julgaria honrado, escreve São Francisco de Sales, o vassalo a quem o príncipe enviasse algumas iguarias da sua mesa! E que seria se lhe desse para sustento alguma coisa da sua própria substância? Jesus Cristo, porém, na santa comunhão, nos dá para sustento, não só uma parte de sua mesa, não só uma parte da sua carne sacrossanta, mas o seu corpo inteiro: Accipite et comedite: hoc est corpus meum (1) ― “Tomai e comei, isto é o meu corpo”. E com o corpo nos dá também a alma e a divindade. Numa palavra, diz São João Crisóstomo, Jesus Cristo dando-se a si próprio no Santíssimo Sacramento, dá tudo o que tem e não Lhe resta mais nada para dar: Totum tibi dedit, nihil sibi reliquit.
É pois com razão que este dom é chamado por Santo Tomás: sacramento e penhor de amor, e por São Bernardo: amor dos amores: amor amorum, porque Jesus Cristo reúne e completa neste sacramento todas as outras finezas do seu amor para conosco. Pelo mesmo motivo Santa Maria Madalena de Pazzi chamava o dia em que Jesus instituiu este sacramento, o dia do amor. Ó maravilha e prodígio do amor divino!
Deus, o Senhor de todas as coisas, se faz todo nosso!
II. Praebe, fili mi, cor tuum mihi (2) ― “Meu filho, dá-me teu coração”. Eis o que Jesus Cristo nos diz lá de dentro do santo Tabernáculo: Meu filho, em compensação do amor que te mostrei, dando-te o dom inapreciável do Santíssimo Sacramento, dá-me o teu coração e ama-me de hoje em diante com todas as tuas forças, com toda a tua alma. ― Parece-te porventura, meu irmão, que o nosso Salvador é exigente demais, depois de se ter dado a si próprio sem reserva? Todavia, quantos cristãos não há
que recusam por completo seu coração a Jesus, ou querem dividi-lo entre Ele e as criaturas!
Ó meu caro Jesus, que mais podeis executar para nos atrair a vosso amor? Ah! Dai-nos a conhecer por que excesso de amor Vos reduzistes a estado de alimento, para Vos unir a pobres e vis pecadores como somos? Ó meu Redentor, vossa ternura para comigo tem sido tão grande, que não recusastes dar-Vos muitas vezes todo a mim na santa comunhão; e eu, quantas vezes tive a ingratidão de Vos expulsar da minha alma! Mas não é possível que desprezeis um coração contrito e humilhado. Por mim Vos fizestes homem, por mim morrestes e chegastes a Vos fazer meu alimento; após isto, que Vos fica ainda por fazer no intuito de conquistardes meu amor? Ah! Não poder eu morrer de dor, cada vez que me lembro de ter assim desprezado vossa graça! Ó meu Amor, arrependo- me de todo o meu coração de Vos ter ofendido. Amo-Vos, ó Bondade infinita; amo-Vos, ó Amor infinito. Nada mais desejo senão amar-Vos, e nada mais temo senão viver sem Vos amar.
Meu amado Jesus, não recuseis vir à minha alma. Vinde, porque estou resolvido a morrer antes mil vezes, que repelir-Vos de novo, e quero fazer tudo para Vos agradar. Vinde e abrasai-me todo no vosso amor. Fazei com que me esqueça de todas as coisas, para não mais pensar senão em Vós, e só a Vós buscar, meu único e soberano Bem. ― Ó Maria, minha Mãe, rogai por mim, e, por vossas orações, tornai-me reconhecido para com Jesus Cristo, que tanto amor me tem.
FC!#242 - Meditações para a Quaresma - A lembrança da morte e o jejum quaresmal - Santo Afonso Maria de Ligório
Memento homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris – “Lembra-te, ó homem, que és pó e em pó te hás de tornar” (Gn 3, 19)
Os insensatos que não creem na vida futura estimulam-se com o pensamento da morte a passarem bem a vida. De maneira bem diferente devemos nós proceder, os que sabemos pela fé que a alma sobrevive ao corpo. Nós, lembrando-nos de que em breve temos que morrer, devemos cuidar da nossa eternidade e por meio de oração e penitência aplacar a justiça divina. É com este intuito que a Igreja, depois de por as cinzas sobre a cabeça, nos ordena o jejum da Quaresma.
I. Para compreendermos em toda a sua extensão o sentido destas palavras, imaginemos ver uma pessoa que acaba de exalar o último suspiro. Ó Deus, a cada um que vê este corpo, inspira nojo e horror. Não passaram bem nem vinte e quatro horas depois que aquela pessoa morreu e já o mau cheiro se faz sentir. É preciso abrir as janelas e queimar bastante incenso, a fim de que o fedor não infeccione a casa toda. Os parentes com pressa mandam levar o defunto para fora da casa e entregar à terra.
Metido que foi o cadáver na sepultura, vai se tornando amarelo e depois preto. Em seguida, aparece em todos os membros uma lanugem branca e repelente, donde sai um pus infecto que corre pela terra e donde se gera uma multidão de vermes. Os ratos veem também procurar o pasto neste cadáver, roendo-o uns por fora, ao passo que outros entram na boca e nas entranhas. Despegam-se e caem as faces, os lábios, os cabelos; escarnam- se os braços e as pernas apodrecidas, e afinal os vermes, depois de consumidas todas as carnes, consomem-se a si próprios. E deste corpo só restará um esqueleto fétido, que com o tempo se divide, ficando reduzido a um punhado de pó.
Eis aí o que é o homem, considerado como criatura mortal. Eis aí o estado a que tu também, meu irmão, serás, talvez em breve, reduzido: um punhado de pó fedorento. Nada importa ser alguém moço ou velho, são ou enfermo: a todos caberá a mesma sorte, o que a Igreja recorda pondo as cinzas bentas indistintamente sobre a cabeça de todos: Memento homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris — “Lembra-te, ó homem, que és pó e em pó te hás de tornar”.
II. Os insensatos que não creem na vida futura e têm as verdades eternas por fábulas, estimulam-se, com a lembrança da morte, a levar vida folgada e a gozarem. Comedamus et bibamus; cras enim moriemur (1) — “Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos”. De maneira bem diferente, porém, diz Santo Agostinho, deve proceder o cristão, que pela fé sabe que a alma sobrevive ao corpo e que, depois da morte deste, terá de dar contas rigorosíssimas de tudo quanto tiver feito. — O cristão, que se lembra que em breve deverá deixar o mundo, cuidará da sua eternidade e procurará aplacar a justiça divina com penitências e orações. É por isso exatamente que a Igreja, depois de nos ter posto as cinzas sobre a cabeça, ordena a seus ministros que notifiquem aos fiéis o jejum quaresmal: Canite tuba in Sion: sanctificate ieiunium (2) — “Fazei soar a trombeta em Sião, santificai o jejum”. Conformemo-nos, portanto, com as intenções de nossa boa Mãe; e como ela mesma o ordena, sejamos no santo tempo da Quaresma “mais sóbrios em palavras, na comida, na bebida, no sono, nos divertimentos” (3); e, o que é mais necessário, afastemo-nos mais de toda a culpa por meio de uma vida recolhida e consagrada à oração, porquanto, no dizer de São Leão, “sem proveito se subtrai o alimento ao corpo, se o espírito não se afasta mais da iniquidade”.
Ó meu amabilíssimo Redentor, consenti que eu una a minha salutar abstinência com a que Vós com tanto rigor por mim quisestes observar no deserto. Consenti também que nesta união eu a ofereça a vosso Pai Divino, como protestação de minha obediência à Igreja, em desconto de meus pecados, pela conversão dos pecadores e em sufrágio das almas santas do purgatório. Tenho intenção de renovar esta oferta todos os dias da Quaresma. “Vós, porém, ó Senhor, concedei-me a graça de começar este solene jejum com devida piedade e de continuá-lo com devoção constante” (4), a fim de que, chegada a Páscoa, depois de ter ressurgido convosco para a vida da graça, seja digno se ressuscitar também para a vida da glória. Fazei-o pelo amor de Maria Santíssima.
FC!#175 - [meditação 5] A Prática
Cara(o) Amiga(o)
A essa altura, todos já conhecemos a disciplina:
Sente-se. Sente-se quieta(o) e com a coluna ereta. Feche suavemente seus olhos. Sente-se relaxada(o), mas alerta. Silenciosa e interiormente comece a repetir uma simples palavra. Nós recomendamos a palavra/oração, Maranatha. Ouça-a à medida que você a repete, suave e continuamente. Nada pense ou imagine, mesmo de natureza espiritual. Caso ocorram pensamentos ou imagens, serão apenas distrações no período da meditação, e a cada vez simplesmente volte a repetir sua palavra. Medite de vinte a trinta minutos, toda manhã e toda noite.
‘Sentar-se quieto e com a coluna ereta’, não é tão simples quanto parece. Nosso corpo adquiriu maus hábitos em relação às posturas. No entanto, é importante manter uma posição ereta, com as costas tão retas quanto nosso corpo permita, confortavelmente. Assegure-se que seus ombros estejam soltos e relaxados. Juntamente com as costas retas, isso garante que seu peito esteja bem aberto, permitindo que uma quantidade suficiente de oxigênio circule pelo seu corpo, o que nos ajuda a nos manter alertas. Na verdade, não importa se nos sentamos em uma cadeira ou em posição de lótus completo, desde que isso nos permita manter a posição confortável e estável durante todo o tempo da meditação. Os pés ou joelhos devem estar firmes no chão, de modo que nossa posição seja de enraizamento: “A postura é um sinal exterior de nosso comprometimento interno com a disciplina da meditação... Ao lançarmos raízes em nós mesmos, nos tornamos enraizados em nosso próprio lugar da criação.” (John Main)
John Main também recomendava sentar-se “com as palmas das mãos para cima ou voltadas para baixo com o polegar e o indicador unidos.” Na tradição oriental, considera-se que unir o polegar e o indicador é importante para a circulação da energia através do corpo. Mas é, também, um excelente meio para nos mantermos alertas: quando nossa atenção diminui, notamos que nossos dedos também já não se tocam mais.
Sentar-se quieto e permanecer imóvel é, na verdade, o primeiro obstáculo na disciplina da meditação. Estamos tão acostumados a nos manter constantemente em movimento, fazendo coisas e reagindo a estímulos externos, que sentar-se quieto e nada fazer poderá parecer uma tarefa assustadora e incomum.
A inquietude está em nossa genética: nossos ancestrais foram todos eles membros de tribos nômades. Um bebê é um belo exemplo disto: toda mãe, pai ou responsável sabe que um bebê agitado se aquietará com o movimento, seja o do balanço do berço, o de ser carregado no colo andando, ou mesmo o de ser levado a passear no carrinho. Ao tentarmos sentar quietos e permanecer imóveis, estamos indo contra essa natureza. Permitir que o nosso corpo se aquiete, dando-lhe permissão de nada fazer, é o primeiro passo para nos contrapormos a essa tendência à inquietude.
Só a perseverança nessa atitude reduz a necessidade que sentimos de nos mover e agir, e nos permite tomar consciência das vantagens da quietude e do silêncio. Os Padres e Madres do Deserto, em cujos ensinamentos a meditação cristã se baseia, ressaltavam a importância de permanecer em um lugar:
“Um irmão da colônia monástica de Cétia no Egito, foi pedir uma palavra ao Abba Moisés, e o velho homem disse-lhe, ‘Vá e sente-se em sua cela, e sua cela lhe ensinará tudo’.”
Quando a inquietude deixar nosso corpo, ela se transferirá para nossa mente, como veremos na próxima semana.
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Fonte: https://www.wccm.com.br/cartas/76-ano-1/867-carta-8
FC!#174 - [meditação 4] A Universalidade da Meditação
Cara(o) Amiga(o)
A meditação é uma disciplina espiritual, universal e central na maioria das Religiões e Tradições de Sabedoria do mundo. Há muitas formas diferentes de meditação nessas diversas tradições, todas igualmente válidas à sua própria maneira. Em todas, a ênfase está mais na prática e na experiência da meditação do que no seu conhecimento e teoria.
No cristianismo, ela é também uma disciplina autêntica, embora algumas vezes pareça que esse é o segredo mais bem guardado do mundo. Como Laurence Freeman sempre enfatiza, Jesus ensinava a contemplação e este é o motivo pelo qual ela floresceu no século IV, particularmente entre os Padres e Madres do Deserto no Egito e na Palestina, que baseavam suas vidas no exemplo de Jesus. João Cassiano compilou seus ensinamentos em seu livro “Conferências”. Foi nesses escritos que John Main OSB, um monge beneditino, redescobriu essa tradição para o nosso tempo, e a abriu para todas as pessoas, chamando-a de Meditação Cristã. Não é apenas o modo de orar dos Padres e Madres do Deserto, mas também o de outros incontáveis místicos cristãos através dos tempos, até nossos dias. É, também, uma maneira de orar estabelecida muito antes da Reforma, e antes mesmo da separação entre o Catolicismo Romano e o Cristianismo Ortodoxo Oriental. É, portanto, uma bonita e ecumênica forma de orar em conjunto.
Não devemos esquecer que todas as formas de oração são válidas. Nas palavras de Laurence Freeman: “A meditação é a dimensão que falta em grande parte da vida cristã de hoje. Ela não exclui os outros tipos de oração e, na verdade, aprofunda nossa reverência aos sacramentos e escrituras.” Ele explica a conexão entre todas as diferentes formas de oração pela imagem de uma
antiga roda de madeira:
“A finalidade de uma roda é mover um carro. A oração é a roda que move nossa vida espiritual em direção a Deus. Para girar, a roda deve estar em contato com o chão. Se a roda não toca o chão, ela não movimenta o carro, vai apenas girar em falso. Assim deve existir um tempo e lugar reais em nossa vida diária para dedicarmos à oração.
Os raios da roda são como as diferentes formas de orar. Todas elas são válidas e efetivas. Temos a Eucaristia, a oração de intercessão, os sacramentos, a leitura das Escrituras e as devoções pessoais. O que mantém os raios unidos e movimenta a roda é seu cubo. Os raios convergem ali. Podemos imaginar esse cubo como sendo a Oração de Cristo que habita nossos corações. No cubo da roda há quietude. Sem este ponto central imóvel, a roda não consegue girar.
Meditar é voltar à quietude do centro de nosso ser. Quando meditamos, entramos nessa quietude central que é a fonte de todas as nossas ações, nosso movimento em direção a Deus através do Cristo em nosso interior. O movimento da roda requer a quietude do centro. Esta é a relação entre a ação e a contemplação”.
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Fonte: https://www.wccm.com.br/cartas/76-ano-1/865-carta-7
FC!#167 - [meditação 3] Por que começamos a meditar?
Cara(o) Amiga(o)
O ímpeto para começar a meditar, frequentemente, é o momento em que somos confrontados com algo fora do comum, algo que nos sacode de nossa percepção cotidiana da realidade. Pode ser um momento de crise, ou um evento de grandes proporções em qualquer estágio de nossa vida, quando a realidade, aparentemente segura e imutável em que vivemos, é virada de cabeça para baixo: somos rejeitados por um indivíduo ou por um grupo; encontramos o fracasso, perda de autoestima; perdemos um emprego valorizado, ou nossa saúde de repente nos falta. O resultado pode ser uma recusa em aceitar a mudança, uma descida na negatividade, na desconfiança e no desespero. Ou, por outro lado, se confrontados com o fato de que nossa realidade não é tão imutável quanto a considerávamos, podemos encarar o desafio de mudar a nossa maneira de olhar para nós mesmos, nossa estrutura habitual, nossas opiniões e valores.
Às vezes, pode ser um momento de beleza única que nos faz compreender que existe mais do que aquilo que os olhos enxergam. Bede Griffiths, o sábio mestre beneditino, falava de como a sua consciência da verdadeira Realidade não surgiu de uma crise, mas da contemplação da Natureza. Em “The Golden String” ele relata como foi levado pela beleza de um canto de pássaro, e de um espinheiro-alvar em flor, a um profundo sentimento de assombro diante da visão do pôr do sol, enquanto uma cotovia “derramava sua canção”. Ele sentiu que “tomava consciência de um outro mundo de beleza e mistério” e, especialmente à noite, sentiu em muitas outras ocasiões, também a “presença de um insondável mistério”.
Nem sempre esse momento é tão dramático; a percepção varia enormemente de pessoa para pessoa, de momento para momento. Alguns de nós podem ter tido um momento de “transcendência”, a consciência de uma realidade diferente, uma libertação da prisão do “ego”, enquanto escutava música, poesia ou estava absorto numa obra de arte. Outros podem nunca ter estado conscientes de um real momento de epifania e, contudo, em algum nível, podem ter estado sempre cônscios da existência de uma realidade superior e estarem, sem sabê-lo, tornando-se gradualmente mais sintonizados com essa realidade. Bem no início da meditação, nós frequentemente tocamos a experiência de uma paz verdadeira e mesmo de uma alegria que fervilha. Momentos como esses, em que somos libertados da nossa auto preocupação, são dádivas Divinas.
Em todo caso, esse vislumbre não é o fim, mas o início: um ímpeto para crescer. O anseio para saber mais sobre essa realidade intuída torna-se mais forte, e nós procuramos pessoas que possam nos ajudar a abordá-la. Nesse ponto, frequentemente descobrimos a meditação, de uma forma ou de outra. É o início do trabalho de esclarecer e integrar a experiência, e assim permitir a escalada para uma consciência espiritual, autenticidade pessoal e uma Verdade transpessoal.
O fato de uma epifania, um vislumbre de uma outra realidade, ser sempre o início de nossa jornada em direção a uma oração mais profunda, também significa que não podemos trazer alguém para a meditação, que não tenha sentido essa necessidade desejosa de “algo mais” no seu próprio ser. Quando nos sentimos chamados a formar um grupo, tudo o que podemos fazer é anunciar isso na nossa vizinhança ou na nossa igreja, e convidar as pessoas, mas se elas irão adotar a meditação como uma disciplina de oração não está em nossas mãos, mas no dom do Divino. Não podemos “converter” os outros para a meditação; podemos acolhê-los e encorajá-los a experimentar, mas é da livre escolha deles aceitar ou não essa oferta.
Obs.: O livro de Laurence Freeman “Uma Pérola de Grande Valor” é muito útil ao se considerar criar um grupo (https://caeluminterram.wordpress.com/2012/12/15/uma-perola-de-grande-valor/).
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Fonte: https://www.wccm.com.br/cartas/76-ano-1/861-carta-5
FC!#160 - [meditação 2] O que é Oração?
Cara(o) Amiga(o)
Uma definição muito antiga de oração descreveu-a como “a elevação do coração e da mente para Deus”. O que é a “mente”? O que é o “coração”? A mente é aquilo que pensa – ela questiona, preocupa-se, fantasia. O coração é aquilo que conhece – ele ama. A mente é o órgão do conhecimento; o coração, o órgão do amor. A consciência mental precisa afinal ceder e abrir-se para o modo mais pleno de conhecer, que é a consciência do coração. Amor é conhecimento completo.
A maior parte do nosso treinamento em oração, contudo, limita-se à mente. Fomos ensinados desde crianças a recitar nossas orações, a pedir a Deus pelas necessidades dos outros ou nossas. Entretanto, isso é apenas metade do mistério da oração.
A outra metade é a oração do coração, em que nós não estamos pensando em Deus, ou falando com ele, ou pedindo algo. Simplesmente, estamos com Deus, que está em nós, no Espírito Santo que Jesus nos deu. O Espírito Santo é o amor, a relação de amor que flui entre o Pai e o Filho. Foi esse Espírito que Jesus insuflou em cada coração humano. A meditação, então, é a oração do coração, unindo-nos com a consciência humana de Jesus no Espírito. “Porque não sabemos o que devemos pedir, nem orar como convém, mas o Espírito mesmo intercede por nós com gemidos inefáveis”. (Rm 8, 26).
O Espírito Santo na Igreja moderna, especialmente desde o Concílio Vaticano II no início dos anos 1960, vem-nos ensinando a recuperar essa outra dimensão de nossa oração. Os documentos do Concílio relativos à Igreja e à liturgia enfatizaram a necessidade de desenvolver “uma orientação contemplativa” na vida espiritual dos cristãos hoje. Todos são chamados à plenitude da experiência de Cristo, independente do seu percurso de vida.
Isso significa que devemos ir além do nível da oração mental: conversar com Deus, pensar em Deus, pedir a Deus por nossas necessidades. Devemos ir até as profundezas, até onde o próprio espírito de Jesus está orando em nossos corações, no profundo silêncio de sua união com nosso Pai no Espírito Santo.
A oração contemplativa não é privilégio de monges e freiras ou de tipos místicos especiais. Ela é uma dimensão de oração para a qual nós todos somos chamados. Não se trata de experiências extraordinárias, nem de estados alterados de consciência. Trata-se daquilo que São Tomás de Aquino chamava de “simples desfrutar da verdade”. William Blake falava da necessidade de “limpar as portas da percepção”, de modo que possamos ver tudo como verdadeiramente é: infinito.
Isso tudo se refere à consciência contemplativa, tal como vivida na vida normal. A meditação leva-nos a isso, e é parte de todo o mistério da oração na vida de qualquer pessoa que esteja buscando a plenitude do ser.
Extraído de Prática Diária da Meditação Cristã, de Laurence Freeman.
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FC!#159 - [meditação] Como você se prepara para meditar?
Como você se prepara para meditar?
Cara(o) Amiga(o)
John Main redescobriu a meditação, a repetição fiel de uma frase-oração para conduzir-nos ao silêncio da oração “pura”. Para sua imensa alegria, ele a encontrou nos escritos de um monge cristão do século IV AD: João Cassiano, que se sentou aos pés de muitos cristãos eremitas que viviam no deserto do Egito daquele tempo, para aprender sobre a oração, e sobre como levar uma autêntica vida cristã. Cassiano ressaltava que esta prática conduz ao silêncio da oração “pura”, a oração contemplativa, sem palavras ou imagens.
“A mente, assim, expulsa e reprime o rico e amplo assunto de todos os pensamentos e, se restringe à pobreza da repetição de um simples verso”. Enfatizando a importância do mantra, ele continuava e, dizia: “Este mantra deve estar sempre em seu coração. Quando se preparar para dormir, faça-o repetindo este verso até que, tendo sido moldado por ele, você se habitua a repeti-lo até mesmo durante seu sono.”
A repetição fiel da frase-oração (ou da palavra-oração), apenas a repetição dessa nossa palavra, não é, contudo, tão fácil como parece. Necessitamos nos preparar para esse período; não podemos esperar tornar-nos plenamente focados em nossa oração, sem uma preparação. Quando perguntaram a John Main, como deveríamos nos preparar para a meditação, ele certa vez respondeu “realizando gestos de gentileza.” Precisamos estar em uma atitude mental correta; tentar meditar depois de uma calorosa discussão com alguém realmente não iria funcionar, não é mesmo? Nossa vida diária e nossa vida de oração não estão separadas: “Da mesma maneira como você vive, assim você ora”, esse era um ditado comum entre os cristãos primitivos.
No mundo em que vivemos, nossa vida tende a ser atarefada e desgastante. Se acharmos que estamos realmente cansados, poderá mesmo ser aconselhável tirarmos uma soneca antes de irmos para nosso grupo de meditação. Fazer algumas posturas de alongamento de Yoga, ou um ou dois movimentos de Tai Chi, também ajuda a fazer com que a energia flua. De outro modo, tudo o que poderemos fazer será uma “soneca sagrada”, que também não é errado, mas frequentemente se faz acompanhar por um doce ressonar! O ronco e outros ruídos que ocorrem durante a meditação, no entanto, podem representar uma excelente prática para nos desligarmos de assuntos alheios ao momento presente, e nos remetermos suavemente de volta a nossa palavra. Ruídos em geral, na verdade, não nos perturbam, desde que não nos irritemos com eles. Devemos simplesmente aceitar que é assim que as coisas são. Sem julgar, sem criticar.
A razão pela qual nos sentamos com nossas costas eretas, ombros para trás e relaxados, é que essa posição ajuda a nos mantermos despertos: o peito está livre e aberto, de modo a podermos respirar bem, e o oxigênio possa fluir livremente por todo nosso corpo, mantendo-nos alertas. Relaxar e dormir, por mais necessários que sejam, não são obviamente o objetivo da meditação; a atenção plena necessária para a meditação é de fato um caminho para nos mantermos alertas e energizados. Pode ajudar começarmos nosso período de meditação fazendo respirações abdominais profundas, que tanto servem para nos relaxar, quanto nos energizar.
A tarefa essencial na meditação é “repetir a sua palavra”. Este é o nosso foco. A palavra recomendada por John Main é “maranatha”, a mais antiga oração cristã em aramaico, a língua falada por Jesus. Repetimos essa palavra em quatro sílabas igualmente acentuadas – ma-ra-na-tha. Não importa se você a diz com o som ‘th’ da língua inglesa, ou simplesmente se o reverbera como ‘t’. A pronúncia não é importante. Você só precisa se lembrar de que orando a Jesus, pronunciamos Seu nome em todas as línguas do mundo, e isso não muda a eficácia da oração. Além do mais, em aramaico, seus amigos e sua família O chamavam Yeshua. O importante é você repeti-la com plena atenção, amorosa e fielmente. Sempre que seus pensamentos lhe distraírem, gentilmente traga sua mente de volta para sua palavra. Algumas pessoas acham mais fácil repetir a palavra em conexão com o movimento respiratório, mas se isso lhe causa distrações simplesmente preste atenção nela, no ritmo que melhor se adequa a você.
Como meditar:
Sente-se.
Confortável e com a coluna ereta.
Feche suavemente seus olhos.
Mantenha-se relaxada(o), mas alerta.
Silenciosa e interiormente comece a repetir uma simples palavra.
Recomendamos a palavra/oração, Maranatha.
Ouça-a à medida que a pronuncia, suave, mas continuamente.
Pensamentos e imagens provavelmente afluirão, mas deixe-os passar.
Mantenha-se fiel à repetição da sua palavra do início ao fim da sua meditação.
Medite de vinte a trinta minutos, toda manhã e toda noite.
Fonte:
"A profundidade do coração cresce com o silêncio"
Na próxima 6ª feira, 11 de março, vamos iniciar uma sequência de episódios semanais de meditação no podcast Fala, Chico!, que irão até o dia 15 de abril. Serão ao todo 6 episódios em que compartilharei algumas cartas da Comunidade Mundial para a Meditação Cristã (World Community for Christian Meditation - WCCM), que são publicados no site para dar apoio e nutrir os meditantes.
A meditação cristã, segundo o ensinamento de John Main, fundador da WCCM, é a fiel repetição de uma frase-oração, ou “mantra”, como John Main o chamava. Ele redescobriu esse modo de oração nos escritos dos primeiros cristãos, os Padres e Madres do Deserto, que no quarto século da nossa Era Comum retiraram-se principalmente para o deserto do Egito para viver uma vida cristã autêntica, baseada no ensinamento de Jesus.
A repetição fiel e amorosa dessa oração conduz-nos a uma quietude do corpo e da alma e ajuda-nos a entrar no silêncio que habita o centro do nosso ser. O famoso místico do século XIV, Mestre Eckhart, disse: “Nada descreve Deus tão bem quanto o silêncio”. Lá no verdadeiro centro do nosso ser habita Cristo, e lá nós entramos na oração de Jesus.
Enquanto preparo os episódios de meditação, preparo também uma série de catequeses que o Papa Francisco fez sobre São José, que teve início em novembro do ano passado e que foi concluída neste ano. Minha programação é de publicá-las todas no dia 19 de março, dia de São José. Deus me capacite a cumprir este propósito, pela intercessão de São José.
Na 4ª catequese sobre o esposo de Nossa Senhora, Papa Francisco medita a virtude do silêncio em São José, que na Bíblia não teve uma palavra sequer registrada, mas que fala alto aos nossos corações através das suas atitudes. Para nos prepararmos para o nosso primeiro episódio de meditação, compartilho parte desta catequese com vocês.
Como seria bom se cada um de nós, seguindo o exemplo de São José, conseguisse recuperar esta dimensão contemplativa da vida aberta precisamente pelo silêncio. Mas todos sabemos por experiência que não é fácil: o silêncio assusta-nos um pouco, porque nos pede para entrarmos em nós mesmos e encontrarmos a parte mais verdadeira de nós. Muita gente tem receio do silêncio, deve falar, falar, falar ou ouvir rádio, televisão…, mas não pode aceitar o silêncio porque tem medo. O filósofo Pascal observou que «toda a infelicidade dos homens provém de uma só coisa: não saber ficar tranquilo num quarto» (Pensamentos, 139).
Queridos irmãos e irmãs, aprendamos de São José a cultivar espaços de silêncio, nos quais possa surgir outra Palavra, isto é, Jesus, a Palavra: a do Espírito Santo que habita em nós e que traz Jesus. Não é fácil reconhecer esta Voz, que muitas vezes se confunde com os milhares de vozes de preocupações, tentações, desejos e esperanças que nos habitam; mas sem este treino que provém precisamente da prática do silêncio, até a nossa fala pode adoecer. Sem a prática do silêncio o nosso falar adoece. Ele, em vez de fazer resplandecer a verdade, pode tornar-se uma arma perigosa. De facto, as nossas palavras podem tornar-se adulação, jactância, mentira, maledicência, calúnia. É um dado da experiência que, como nos lembra o Eclesiástico, «a língua mata mais do que a espada» (28, 18). Jesus disse-o claramente: quem fala mal do irmão ou da irmã, quem calunia o próximo, é homicida (cf. Mt 5, 21-22). Mata com a língua. Não acreditamos nisto, mas é a verdade. Recordemos as vezes que matamos com a língua, envergonhar-nos-íamos! Contudo, far-nos-á muito bem, tanto bem.
A sabedoria bíblica afirma que «morte e vida estão no poder da língua: quem fizer bom uso dela comerá o seu fruto» (Pr 18, 21). E o apóstolo Tiago, na sua Carta, desenvolve este antigo tema do poder, positivo e negativo, da palavra com exemplos impressionantes, diz assim: «Se alguém não peca pela palavra, esse é um homem perfeito, capaz de dominar o seu corpo [...] a língua é um pequeno membro e gloria-se de grandes coisas [...] Com ela bendizemos a Deus Pai, e com ela amaldiçoamos os homens, feitos à semelhança de Deus. De uma mesma boca procedem a bênção e a maldição» (3, 2-10).
Por este motivo, devemos aprender de José a cultivar o silêncio: aquele espaço de interioridade nos nossos dias nos quais damos ao Espírito a oportunidade de nos regenerar, de nos consolar, de nos corrigir. Não estou a dizer que devemos cair num mutismo, não, mas devemos cultivar o silêncio. Cada um olhe para dentro de si mesmo: muitas vezes estamos a fazer um trabalho e quando terminamos procuramos imediatamente o telemóvel para fazer outra coisa, somos sempre assim. E isto não ajuda, faz-nos escorregar para a superficialidade. A profundidade do coração cresce com o silêncio, um silêncio que não é mutismo, como eu disse, mas que deixa espaço à sabedoria, à reflexão e ao Espírito Santo. Por vezes temos medo dos momentos de silêncio, mas não devemos recear! O silêncio far-nos-á muito bem. E o benefício para os nossos corações curará também a nossa língua, as nossas palavras e, sobretudo, as nossas escolhas. Com efeito, José uniu o silêncio à ação. Ele não falou, mas fez, e assim mostrou-nos o que Jesus disse outrora aos seus discípulos: «Nem todo o que me diz Senhor, Senhor, entrará no reino dos Céus, mas sim aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos Céus» (Mt 7, 21). Palavras fecundas quando falamos e temos a recordação daquela canção “Parole, parole, parole…” [“Palavras, palavras, palavras…”] e nenhuma substância. Silêncio, falar o suficiente, às vezes morder a língua um pouquinho, que faz bem, em vez de dizer parvoíces.
Espero por vocês em nosso primeiro episódio de meditação, na próxima 6ª feira.